Líder metalúrgico nas históricas greves do ABC paulista no final dos anos 70 e considerado ‘pelego’ pelos que viam em Lula o ‘radical fashion’, Ari Campista dizia:
– A maior arma dos trabalhadores é a greve, que só vale como ameaça. Depois de deflagrada, traz prejuízo para todos.
Greve exige provas diárias de mobilização. Nos três primeiros dias de teste, o sindicato dos professores de Gravataí passou com estrelinhas pela paralisação que começou segunda-feira contra a extinção do Ipag Saúde, o plano de saúde que cobre cerca de 10 mil pessoas entre servidores ativos, inativos, pensionistas e familiares.
O SPMG conseguiu parar escolas, conversou com alunos e famílias nos bairros, lotou a Câmara de Vereadores, levou a versão da categoria para a Comissão de Educação da Assembleia Legislativa na manhã desta quinta e, pela tarde, fez caminhada de quilômetro, com carro de som, a partir da parada 72 da avenida Dorival de Oliveira.
Sobre o número de professores parados, Prefeitura e SPMG divergem. No balanço do governo feito hoje, 33 pararam totalmente, 22 parcialmente e outras 20 funcionaram normalmente. A última estimativa informada pelo sindicato apontava 80% da categoria parada. A estrutura do Seguinte: ainda não nos permite verificar escola a escola, trabalhador a trabalhador, para apresentar um dado exclusivo.
Ensina a história que primeira semana mostra a força dos líderes grevistas para manter uma categoria mobilizada, já que o prefeito Marco Alba não dá sinais de que vá retirar o PL 19 e nem a base do governo parece estar disposta a aprovar o projeto alternativo apresentado pelo vereador Dimas Costa, que retira a contribuição da Prefeitura, mas mantém vivo o Ipag Saúde – como quer o SPMG, certamente com a esperança de negociar com o próximo governo um retorno da contribuição a partir de 2021.
Talvez pela credibilidade do Seguinte:, pelo fardo do tempo, ou principalmente pela transpiração de buscar ouvir as diferentes narrativas, sei que virei um dos vilões do funcionalismo desde que antecipei a extinção do Ipag Saúde. Mas, como já respondi a mensagens que cobravam ‘lado’ nessa polêmica, não sou sindicalista, nem político: sou jornalista. E faço jornalismo editorial. Opino. Mas uso os fatos, o que, invariavelmente, em algum momento desagrada algum dos ‘lados’ ou todos ao mesmo tempo. Porém, o leitor pode não concordar com as análises, mas fique tranqüilo: jamais inventarei meus próprios fatos.
Assim, arrisco que está se aproximando o episódio final dos Jogos Vorazes, que contrapõe governo e sindicato. Como dizia Ari Campista, que referi na abertura do artigo, uma greve depois de deflagrada traz prejuízo para todos. Inegável que não será fácil para o SPMG manter a mobilização caso a votação do projeto ocorra apenas ao final dos 45 dias de prazo – ou seja, daqui a um mês.
Por isso parece-me camicase à categoria seguir na estratégia (que pelo que apurei não é combinada, trata-se mais de voluntarismo dos vereadores) de a cada sessão aplaudir emendas que atrasam a votação do PL enviado pelo prefeito, que tramita em regime de urgência.
Como previ em artigos anteriores – e observei que não o fazia por torcida ou secação –, na Gravataí que nas últimas eleições deu sete a cada dez votos para o ‘mito’ Jair Bolsonaro, a greve pode começar com aprovação popular por, de certa forma, ser ‘contra tudo que está aí’, mas na medida com que as horas tornam-se dias, os alunos começam a pensar na recuperação das aulas no calorão e os pais se irritam por não ter onde deixar os filhos, tende a se tornar apenas um substantivo que tem cor: e é vermelha, se é que me entendem.
Ah, mas em Cachoeirinha a paralisação do funcionalismo durou 60 dias em 2017! Ok, só que a greve unia todos os setores da Prefeitura e, nem tanto, mas pelo menos um pouco, criou caos nos serviços públicos. Em Gravataí, por enquanto, apenas trabalhadores em educação pararam, pois são os maiores beneficiários do plano de saúde.
Onde quero chegar? Ninguém gosta de greve, nem o prefeito é louco para comemorar algo assim. Mas, observando o aspecto da pressão política, a votação acontecer daqui a 30 dias, com uma greve esvaziada, por óbvio ajuda o governo a tranqüilizar sua base na Câmara – alguns hoje sensibilizados com histórias de servidores e familiares que ficarão sem plano de saúde, outros assustados com possíveis reflexos na eleição de 2020.
Para Marco Alba, independe. Ele tem agido corretamente do ponto de vista das relações políticas. Diferentemente de Bolsonaro, que parecer não querer a reforma da previdência para não perder popularidade, o prefeito não é um sádico que quer cortar o benefício dos professores e familiares por esporte, mas não briga com os números que mostram a insolvência do Ipag Saúde. E, na ‘ideologia dos números’ e na ‘ideologia da política’, considera que a extinção é mais justa do que fazer a população bancar, para além de 40% do plano de metade dos servidores e familiares, mais os prejuízos acumulados a cada ano.
Ao contrário do presidente, o prefeito foi para rádio estadual e botou a cara em defesa da extinção. Em nenhum momento, ainda, fez cobranças públicas aos seus vereadores. Está assimilando os golpes e aguardando aquele que, em seus dois governos, será o dia do maior teste de coesão de sua base parlamentar.
Como principal argumento dos servidores ainda me parece restar o fato de que a garantia do plano de saúde é um beneficio para uma categoria que merecia melhores salários, não só em Gravataí, mas no Brasil.
Ao fim, como é da minha lide opinar, considero que seria melhor para todos votar logo o PL 19: se os vereadores forem suscetíveis a pressão, será por obra de uma greve a pleno, e a extinção restará sepultada. Se já estiver formada a convicção dos 12 votos que tem a base formal de Marco, o Ipag Saúde será extinto e inicia-se a transição de 90 dias na qual o governo já acerta o parcelamento da dívida de R$ 6,4 milhões da assistência em saúde.
Enquanto isso, as aulas de 30 mil alunos serão retomadas e o SPMG pode negociar melhores condições para – com os 5,5% que são descontados hoje nos contracheques dos servidores, algo como R$ 15 milhões por ano – a categoria aderir em conjunto a um plano de saúde privado que garanta atendimentos que o Ipag, falido, não suporta mais.
E, quem sabe, reivindicar que parte dos 4,5% que a Prefeitura hoje repassa para o Ipag Saúde seja transformada em uma reposição salarial.
Novamente, não é torcida ou secação, são os fatos, aqueles chatos que atrapalham argumentos. O que, acredito, todo mundo quer, é que as coisas sejam resolvidas, mesmo que, paralelamente, se reprovem os vilões, e se aprovem os heróis da vez – o que é natural no currículo e no plano de carreira da política.
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