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GM confirma bilhão em Gravataí a Marco Alba e Eduardo Leite; montadora vai conseguir o que quer

Prefeito, governador e executivos da GM em visita à fábrica de Gravataí | Fotos ITAMAR AGUIAR

Vamos à notícia, depois comento.

Em tour pela montadora nesta sexta o prefeito Marco Alba e o governador Eduardo Leite ouviram mais uma vez do presidente da General Motors no Mercosul, Carlos Zarlenga, do vice-presidente, Marcos Munhoz e do diretor de produção da unidade gaúcha, Luis Mesa, a confirmação de que serão mantidos os investimentos de R$ 1,4 bilhão na fábrica de Gravataí, que começaram no ano passado e estão programados até 2020.

Convidados pelos executivos, prefeito e governador acompanharam parte da linha da montagem, desde a colocação do motor até os pneus, onde são fabricados o Onix, carro mais vendido no Brasil, com 190 mil unidades comercializadas em 2018, e o Prisma, líder de mercado em seu segmento.

Nos 18 anos em solo gravataiense, a GM já montou mais de 3,5 milhões de veículos. Com capacidade de produção de 66 carros por hora – esse número era de 30 em 2000 – o complexo responde por mais de oito mil empregos diretos e indiretos, 3 mil deles na fábrica. Os outros estão distribuídos entre os 16 sistemistas fornecedores da GM. Nove em cada dez empregados são gaúchos. Presente em cinco continentes, a marca mundial contabiliza cerca de 180 mil funcionários.

– É uma alegria estar aqui e ver a produção a pleno e com a montadora sinalizando positivamente quanto ao plano de investimento na fábrica de Gravataí – comemorou Marco Alba, que levou em sua comitiva o vice Áureo Tedesco, o secretário de Saúde e procurador-geral Jean Torman, o diretor-presidente da Fundação Municipal de Meio Ambiente Luiz Zaffalon e o presidente da Câmara de Vereadores, Clebes Mendes.

O prefeito lembrou que a GM é responsável por 10% do PIB e representa 45% da arrecadação de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) do município.

– Estamos observando tudo o que está ao alcance do Estado, especialmente na Secretaria da Fazenda, para dar condições de manutenção e de ampliação da empresa do Rio Grande do Sul – disse o governador, sobre a matriz da GM em Detroit, sob a justificativa de prejuízos nos últimos cinco anos, ter comunicado que está repensando a atuação no Brasil.

– Embora não dependa do governo, é de nosso interesse que a GM permaneça em Gravataí – garantiu.

O secretário da Fazenda Marco Aurélio Cardoso, que integrava a comitiva do governador ao lado de Dirceu Franciscon (Desenvolvimento Econômico e Turismo) e Paulo Morales (chefe de Gabinete), disse que “em busca por maior eficiência dos seus negócios no país, a GM abriu uma frente de discussão com o governo, visando a avaliação de alguns itens pontuais na área tributária e não tributária, que envolve também secretarias da área do desenvolvimento econômico”.

– Essas questões pontuais estão sendo encaminhadas para avaliação com as áreas relacionadas aos temas propostos.

Os executivos da GM não deram entrevista.

 

Comento.

A GM está conseguindo o que quer.

O governador não confirma e ninguém no Palácio Piratini se manifesta ainda. Mas, além da isenção no ICMS do frete interestadual e medidas que reduzam o custo de exportação a partir do Porto de Rio Grande, novos incentivos fiscais devem entrar no pacote para que a GM invista no Rio Grande do Sul parte dos R$ 13 bilhões que projeta para fábricas brasileiras entre 2020 e 2024.

Goste-se ou não, seja uma boa política de desenvolvimento ou um freio a outras cadeias produtivas, indústria automotiva sem subsídios é impensável no Brasil onde o imposto na nota é de 45%.

Para Gravataí, vilã dos demais municípios por ficar com a maior parte de um bolo que já tem a fatia a menos da renúncia fiscal até 2032, é indiscutível que é um ‘negócio da China’ – literalmente, porque, até a crise de 2014, o município registrava um crescimento chinês de 10%.

Já de São Paulo deve vir um ‘socorro’ imediato do governo João Dória, com a antecipação de créditos do ICMS, permitindo à montadora abatê-los em condições mais vantajosas.

Mas a principal negociação ainda diz respeito aos trabalhadores. A saída que a GM projeta para a crise é se adequar à reforma trabalhista reduzindo ‘benefícios’ dos funcionários, facilitando contratações com salários mais baixos e reduzindo o ‘custo-processo’.

E é preciso alertar que ‘ligou o pisca’ para Gravataí.

Se após a ameaça de greve na fábrica local a GM recuou na negociação das 21 propostas de cortes, condicionando a um novo acordo coletivo a destinação de parte dos R$ 13 bilhões que projeta investir no Brasil entre 2020 e 2024, os trabalhadores da fábrica da GM de São José dos Campos (SP) já cederam e, nesta sexta, aceitaram a proposta feita pela empresa para reduzir custos trabalhistas.

Conforme informou o sindicato após seis rodadas de negociação e uma votação que reuniu 4 mil pessoas, a montadora se comprometeu a investir mais R$ 5 bilhões na unidade – que era a que apresentava mais prejuízos. A expectativa da GM agora é fechar acordo com sindicalistas de São Caetano do Sul e Gravataí.

A proposta da montadora para São José inclui reajuste zero nos salários em 2019. Para 2020, a GM propôs reposição de 60% da inflação em 12 meses medida pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) – em ambos os casos, portanto, os trabalhadores teriam perda real no rendimento. A reposição da inflação total só voltaria em 2021.

Para amenizar a falta de reajuste em 2019, os trabalhadores terão abono salarial de R$ 2,5 mil. Para 2020, já com a reposição parcial da inflação, o abono cairá para R$ 1,5 mil. Em 2021, com a reposição total, deixa de haver abono.

Em São Paulo, a GM começou as conversas com 28 reivindicações. Após as rodadas de negociações, a pauta caiu para 10 pontos. Em um deles, que toca no piso salarial de novos contratados, houve recuo da montadora. No início, a empresa queria reduzir o piso de R$ 2,3 mil para R$ 1,6 mil, uma queda de 30%. Depois, propôs redução para R$ 1,7 mil nesse momento, com aumento para R$ 1,8 mil em setembro. Segundo o sindicato, a empresa também desistiu de aumentar a jornada de 40 para 44 horas semanais e adotar a terceirização irrestrita na fábrica.

Para relembrar, siga as 21 propostas para Gravataí e depois concluo:

1. Formação de acordo coletivo de longa duração (dois anos), renováveis por mais dois anos. 

2. Negociação de valor fixo e substituição do aumento salarial para empregado horista; e congelamento ou redução da meritocracia para mensalistas.

3. Negociação de participação nos resultados com revisão de regras de aplicação, prevalência da proporcionalidade, transição para aplicação da equivalência salarial e inclusão de produtividade.

4. Participação dos resultados por três anos. Zero no primeiro ano, 50% no segundo e 100% no terceiro ano.

5. Suspensão da contribuição da GM por 12 meses para a previdência.

6. Alteração do plano médico.

7. Implementação do trabalho intermitente por acordo individual e coletivo. 

8. Terceirização de atividades meio e fim.

9. Jornada de trabalho de 44 anos horas semanais para novas contratações.

10. Piso salarial de R$ 1,3 mil.

11. Redução do período de complementação do auxílio previdenciário para 60 dias.

12. Renovação dos acordos de flexibilidade.

13. Rescisão no curso do afastamento para empregados com tempo para aposentadoria. 

14. Desconsideração de horas extraordinárias. 

15. Trabalho em regime de tempo parcial.

16. Jornada especial de trabalho de 12 por 36.

17. Ajuste na cláusula de férias com parcelamento previsto em lei.

18. Regramento do contrato de trabalho intermitente. 

19. Inaplicabilidade de isonomia salarial acima dos 48 meses para uma nova grade.

20. Cláusula regrando a adoção de termo de quitação anual de obrigações trabalhistas. 

21. Congelamento da política de progressão salarial horista por 12 meses. 

Sobre essa adaptação às novas regras trabalhistas, que chama de ‘revogação da Lei Áurea’, o diretor do Sindicato dos Metalúrgicos de Gravataí (Simgra), Valcir Ascari se mantém na ‘peleia’:

– Nós temos um contrato em vigor, então é importante que a gente pare, sente o pé e resista. O nosso sindicato não aceita redução de direitos.

Onde isso vai parar?

Se agradou o mercado, e divide o país, já que conforme pesquisa Ipsos seis a cada 10 brasileiros não aprova a reforma trabalhista, fato é que as novas regras estão aí. Resta aos trabalhadores aceitarem o acordo coletivo ou a GM não vai investir em Gravataí e, com os R$ 5 bilhões anunciados para São Paulo, a fábrica gaúcha que hoje é a mais rentável do país perderá em competitividade, principalmente porque o maior mercado de veículos é o paulista.

O leitor mais sensível deve estar pensando:

– Bah, sempre estoura no mais fraco.

Sim. Think out of the box é expressão que os executivos adoram até chegar a hora de prestar contas ao CEO ou aos fundos de investimento. Aí, os cortes nos salários e benefícios são sempre a ortodoxa solução buscada dentro da caixinha.

Ao fim, não é uma ameaça, porque a GM não precisa ameaçar; não pede: manda. E também não é uma garantia de empregos por longo prazo, porque se for aprovada a terceirização, funcionários podem ser demitidos para outros serem contratados por pouco mais da metade dos salários.

Dura a vida dos funcionários da GM, cujo emprego na montadora sempre foi sonho de tantos, principalmente do jovens da periferia de Gravataí.

Infelizmente, There’s no free lunch, there´s no free marmita, como tratei no Seguinte: no artigo Trump, Gravataí, almoço e marmita de graça; o futuro da GM.

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