Como num episódio dos Simpsons, que 16 anos antes previu a eleição de Donald Trump à Presidência dos Estados Unidos, a política de Gravataí parece um ‘experimento’ de ficção científica.
Causa aqui,causa no Brasil.
Rita Sanco, primeira mulher a chegar ao poder na aldeia foi impichada pela renegociação de uma dívida, num tipo de ‘pedalada’ que, quatro anos depois, afastou do cargo a presidente Dilma Rousseff.
Pedindo música no Fantástico em impugnações – 2008, 2012 e 2016 – Daniel Bordignon confirmou a popularidade nas urnas, mas a eleição foi anulada. O mesmo que deve acontecer com Lula, se puder concorrer. Ou mesmo se puder ir até a justiça eleitoral registrar a candidatura, já que pode estar cumprindo pena em Curitiba antes do 15 de agosto do calendário eleitoral.
Por justiça, abstraindo qualquer análise política, das trajetórias de amor e ódio, ou a medida de afetos e desafetos pela fila de aliados ou pelos que sobraram, é preciso lembrar que, nos casos de Bordignon e Lula há uma diferença do tamanho do roubo nos mensalões, trensalões, petrolões, ou quadrilhões. Bordignon respondeu uma ação civil, onde além da suspensão dos direitos políticos – o que já aconteceu, por cinco anos – pode no máximo ter que pagar uma multa de meio milhão, da qual recorre. Jamais correu o risco de ir para a cadeia. Já Lula foi processado em uma ação criminal sob suspeita de corrupção, cuja condenação em segunda instância indica que o cumprimento de pena é uma questão de meses.
Mas eleitoralmente, o tamanho do tapetão desenrolado para os dois é bastante parecido. Bordignon, como foi condenado por 2 a 1 no Tribunal de Justiça, no caso das mil contratações julgadas irregulares a partir da justiça de Gravataí, teve um espaço um pouco maior para recursos – coisa que, no juridiquês dos embargos infringentes ou de divergência, ou então nos recursos especiais, fica chato explicar aqui e uma googleada nas fontes certas resolve. Já Lula, por ter sido condenado por unanimidade no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, tem um futuro reduzido de recursos.
Em poucas palavras, Lula pode levar os recursos até a eleição e concorrer, como fez Bordignon, na disputa pela Prefeitura em 2016. Mas suas apelações talvez não tenham fôlego suficiente. Nem mesmo para mantê-lo solto.
Os chamados embargos declaratórios, com possibilidade de efeitos infringentes (traduzindo: força de mudar a sentença e a pena), que os advogados do ex-presidente ingressarão após a publicação do acórdão, na semana que vem, caso não sejam aceitos, devolvem o processo para o juiz Sérgio Moro determinar onde e como será o cumprimento da pena de 12 anos e um mês de prisão.
De olho tanto nas eleições, como em um habeas corpus para seguir livre, os tapetes mais altos seriam recursos especiais ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao Superior Tribunal Federal (STF), tentando efeito suspensivo da condenação, até julgamento das apelações, o que permitiria o registro da candidatura em agosto.
Voltando ao nosso episódio dos Simpsons, Lula concorreria como Bordignon concorreu aqui – com tintas de ficção.
Numa noite de sexta-feira, o ministro Napoleão Filho, do STJ, reconheceu que a condenação do ex-prefeito não tinha transitado em julgado, por todos os recursos não terem à época sido apreciados, a foto de Bordignon apareceu na urna e ele foi eleito para o terceiro mandato. Pouco mais de um mês depois, em análise no Tribunal Superior Eleitoral, o próprio Napoleão, e outros quatro ministros, validaram a chapa Bordignon-Cláudio Ávila, que tinha sido impugnada pelo Tribunal Regional Eleitoral gaúcho. Napoleão atravessou a rua, foi ao STJ, sete horas depois reviu sua decisão e decretou o processo encerrado, fixando a pena do ex-prefeito em cinco anos de suspensão dos direitos políticos. Instado por um recurso do Ministério Público Federal, o TSE anulou o pleito de 2016 e uma eleição suplementar foi realizada em março, com a reeleição do prefeito Marco Alba.
É o mesmo que pode acontecer com Lula na eleição presidencial.
Bordignon não chegou a ser diplomado. Foi declarado inelegível antes. Mas mesmo que tomasse posse, no momento da condenação final a perda do mandato seria automática.
Enfim, aconteceu em Gravataí, acontece no Brasil. E é a vida real, não um episódio do Simpsons.
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