Pois é, outro dia uma amiga me perguntou com um quê de incredulidade no tom de sua voz: “Tu não leste mesmo o último livro do Fulano?”, e eu respondi: “Agora vais pensar mal de mim, mas não li e não vou ler”. O jornalista Paulo Francis teria dito: “Não li e não gostei.”
Ocorre que não leio um livro se, ao dar uma espiada na primeira página, não me fisga. Desisto ali mesmo e parto em busca de algo mais instigante. Houve, sim, um livro que tentei ler várias vezes, apesar de sua linguagem intrincada, dos jogos de palavras, trocadilhos e neologismos que, para mim, tornavam a leitura difícil e irritante: o Ulisses, de James Joyce.
Mas o Ulisses é tão incensado, entre os cânones da Literatura, que foi instituído, na Irlanda, país natal do autor — e, ao longo dos anos, em vários outros lugares do mundo —, um dia especial para homenagear Leopold Bloom, seu protagonista. O Bloomsday, comemorado em 16 de junho, é o único dia dedicado ao personagem de um livro.
Então, eu ia deixando a leitura do Ulisses eternamente para mais adiante. Afinal, eu não tinha curtido, anos ou décadas depois, ao relê-los, um monte de clássicos “terríveis” que haviam me enfiado pela goela na época do colégio?
Mas, tempos atrás, soube que pesquisas realizadas no Brasil e no exterior colocaram a obra-prima do Joyce no topo do ranking dos best-sellers que poucos leitores leem até o final.
Então, agarrei-me ao sábio conselho do Jorge Luis Borges: “Se um livro os chateia, não o leiam porque é famoso, não o leiam porque é moderno, não o leiam porque é antigo. Se os chateia, não foi escrito para vocês. A leitura deve ser uma forma de felicidade.”, e passei o Ulisses adiante, liberta de qualquer complexo de culpa.
Os livros que não li (2)
Uma ocasião, quando vivia no Equador, convidei uma amiga para ir a uma sessão de autógrafos de um escritor conhecido, o que, por lá, era sempre algo muito formal. O Salão Nobre da Prefeitura de Ambato (cidade em que morei na última etapa da minha permanência no País) estava lotado, e o mestre de cerimônias apresentou o autor, que falaria sobre sua obra, e cinco especialistas, que a comentariam, e levou tanto tempo na leitura de seus currículos que pude imaginar a roubada em que estávamos nos metendo.
Aquilo estava tão chato que já havia decidido não comprar, e muito menos ler, o tal livro, e contava os minutos para poder fugir dali sem chamar a atenção. Lá pelas tantas, quando o quarto especialista já levava mais de dez minutos discorrendo sobre a genialidade do autor, o que havia falado em primeiro lugar adormeceu, ali mesmo, sentado à mesa, no palco.
Aproveitei a deixa para puxar minha amiga pra fora do salão com o argumento de que “Se nem eles se aguentam, por que deveríamos aguentá-los?”. E ela me deu um puxão de orelhas: “Isto te ocorre por esta tua mania de querer ser ‘cultita’.” Entendi tão bem a mensagem que nunca mais fui a um evento cultural ou comprei um livro “por obrigação”.