RAFAEL MARTINELLI

A polêmica sobre vídeo de Zaffa e a Greta Thunberg no Plano Diretor de Gravataí; Assista

A III Guerra Política de Gravataí – Zaffa x Alba, pós Abílio x Oliveiras e Bordignon x Stasinski – tem sua mais recente batalha no debate sobre a atualização do Plano Diretor após 23 anos. Neste artigo reporto as polêmicas políticas da semana, mas, ao fim, também justifico a manchete, o que reputo o mais importante, principalmente para futuras gerações.

Vamos à III GPG.

A Câmara, em articulação do presidente Alison Silva (MDB) – inimigo figadal do prefeito – e do vereador Alan Vieira (MDB), afilhado político do ex-prefeito Marco Alba (MDB), promoveu na noite de segunda-feira audiência pública à parte das organizadas pelos últimos dois anos no cronograma de elaboração do Plano Diretor.

A audiência foi uma explosão de críticas à minuta entregue pela empresa licitada pela Prefeitura para a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano (SMDUR). Você assiste clicando aqui.

No fim da tarde de terça-feira, o prefeito Luiz Zaffalon (PSDB) postou o vídeo “esclarecimento sobre o Plano Diretor” e alertou para uma “rede de desinformação” sobre o tema em “reuniões”, “grupos de Whats”, “postagens” e “vídeos de gente que não conhece o rito, ou conhece, apavorando que a cidade vai parar”.

Detalhe: para convocar a população para audiência pública, Alison e Alan tinham postado vídeo apontando problemas na minuta do plano. Assista clicando aqui.

Voltemos ao vídeo de Zaffa.

Enquanto o prefeito fala sobre “desinformação”, aparecem imagens da audiência pública promovida pelo legislativo e também de reunião na sala da presidência com interessados no Plano Diretor – foto que, entendo eu, foi escolhida como crítica, por ter, entre os presentes, ouvido como expert, servidor municipal preso em 2020, segundo a Polícia Civil, por “negar projetos urbanísticos protocolados na Prefeitura e depois, por meio de contato direto com as pessoas, apresentar melhorias nos projetos e cobrar para fazê-los”; processo segue em segredo de justiça.

– Quem trouxe mais de R$ 400 milhões em investimentos do mercado imobiliário em 2023, certamente não quer parar o município – disse Zaffa, citando “grande empresário homenageado na cidade que elogiou o prefeito e equipe pelo tratamento com investidores”.

Mais uma provocação. O empresário é Pedro Brair, dono da rede de farmácia São João, que recebeu o título de cidadão gravataiense por indicação justamente do presidente Alison.

– É desinformação pura e simples, por interesses particulares. Mas no ano eleitoral falar mal do prefeito faz bem… – disse, explicando que dia 20 recebe a minuta, sobre a qual a SMDUR está “suprimindo e acrescentando” alterações e, com base em sugestões que tem recebido, “em janeiro” finalizará o projeto que será enviado para “decisão final dos vereadores”.

– É balela que não houve participação. Foram 8 audiências públicas, posto no shopping, oficinas, carro de som nas ruas… – disse, observando que “ninguém questionou o edital” de contratação da empresa especializada.

– Mas já disseram até que a empresa é de esquerda… – ironizou, concluindo o vídeo:

– Não vá atrás de desinformação. O plano vai ser bom para toda cidade.

Parte que considero a principal no vídeo de Zaffa deixo para o final do artigo, porque é o que sustenta a manchete.

Sigamos na III GPG.

O contra-ataque do grupo de Alba veio minutos depois da publicação do vídeo.

Na sessão da Câmara, Alison e Alan trataram o vídeo como “mais um recuo do governo após a audiência pública”, considerando recuos a não interdição da escola Bahaí após laudo técnico de engenheira da Prefeitura e o acordo pós-greve com o sindicato dos professores para pagamento do piso com repercussão na carreira.

– A audiência pública, diferente daquelas que se ouve, mas não se escuta, foi para alertar, não para apavorar. Pela minuta, a nova emergência do hospital Dom João Becker não poderia ser construída, a maioria dos condomínios não poderiam ser aprovados – disse Alan, argumentando que falta diálogo ao prefeito, conforme ele, “característica de quem ganhou a eleição de mão beijada”.

– A não ser que se crie crise, dificuldades, para vender facilidades – insinuou.

– O prefeito é desinformado sobre o Plano Diretor, não conhece – disse Alison, lamentando o governo não ter adiado a última audiência pública do cronograma oficial do plano para não coincidir com sessão solene da Câmara, o que impediu a participação de vereadores.

– Tem postura antidemocrática, nunca pediu voto na rua – disse, evocando para Marco Alba o papel de ‘Grande Eleitor’ do prefeito em 2020.

Assista a sessão clicando aqui. Alan fala aos 19:50 e Alison ao 48:55.

Agora chegamos ao que considero o principal.

Ao dizer que “nem tudo” será atendido, nos tantos interesses que envolvem o Plano Diretor, o prefeito citou dois exemplos no vídeo.

– Por exemplo: um grande loteamento, com microlotes, lá na divisa de Taquara, onde não tem nada, não tem rede de esgoto, drenagem, água potável, segurança pública, as vias de acesso não são boas, não tem transporte público, não tem escola suficiente, não tem posto de saúde, não tem assistencial social, evidente que o município não vai gostar disso, não vai querer um grande loteamento neste local, com lotes desse tamanhozinho – disse.

– Ah, mas construir escola, posto de saúde, isso o loteador constrói. Ok. Construir é barbada, o problema é operar isso para o resto da vida, o custo que isso vai ter – complementou, e citou outro exemplo de veto no novo Plano Diretor:

– Loteamento onde água invade, onde tem imagens comprovando, onde a água invadiu há poucos dias, construir em zona de banhado, não vamos autorizar.

Perfeito!, tratem-se de exemplos reais, fictícios ou ‘ainda não’ reais.

É um alívio saber que o novo Plano Diretor não vai permitir a construção de loteamentos em regiões sem infraestrutura.

E, principalmente, que será respeitada a ‘mancha de inundação’.

Permitam-me recordar o que escrevi em outubro, após dois desastres climáticos, em Plano Diretor: prefeito e vereadores precisam ser o ‘dique’ contra construções em áreas sob risco de alagamento em Gravataí; Saiba o prejuízo bilionário com as cheias nos próximos 30 anos e Crise climática custa para Gravataí ‘uma ponte do Parque dos Anjos’; O Plano Diretor e a ‘mancha’ necessária para não enxugar gelo.

É longo, mas importante. A leitura dura menos que os 23 anos em que o Plano Diretor não é atualizado.

“O bilhão necessário em diques, minibarragens e adutoras para enfrentar cheias e estiagens na bacia do Rio Gravataí será dinheiro público – municipal, estadual e federal, e privado – jogado pelo ralo se legislações municipais não garantirem a contenção de empreendimentos imobiliários em áreas de risco.

O novo Plano Diretor está respeitando a ‘mancha de inundação’ estabelecida pela Metroplan, mas pelo que apurei a pressão está forte sobre o governo Zaffa e vereadores governistas e oposicionistas que devem votar ainda neste ano o arcabouço de leis que regulamentam construções e ocupações de solo em Gravataí.

A ‘mancha de inundação’, descrita no “Estudo de alternativas e projetos para minimização do efeito de cheias e estiagens na Bacia Hidrográfica do Rio Gravataí”, foi projetada por especialistas observando um tempo de recorrência de 100 anos – o que, os desastres naturais evidenciam, deve caducar antes devido à crise climática mundial, que neste mês teve o Rio Grande do Sul como case no discurso do presidente Lula na ONU.

Iniciado em 2015 como parte do Plano Metropolitano de Proteção Contra as Cheias e integrante do Plano Nacional de Gestão de Riscos e Respostas a Desastres Naturais, o estudo, publicado ainda em 2018, na revista técnica da Metroplan, já antecipava prejuízos de até R$ 5 bilhões em 30 anos caso não fossem feitos investimento de pelo menos R$ 2,5 bi, principalmente em Porto Alegre, Gravataí, Cachoeirinha e Alvorada.

“Tal valor representa, na verdade, o prejuízo que a sociedade arcará se a situação das cheias não for devidamente enfrentada”, alertava, no documento, Pedro Bisch Neto, superintendente da Metroplan, ao apresentar o estudo como “uma visão regional inédita do fenômeno das cheias na Região Metropolitana de Porto Alegre”.

Clique aqui para ler a íntegra do documento, que detalha investimentos necessários, projeta necessidade de desapropriações de edificações existentes e remoções de milhares de famílias, além da restrição a novas construções e ocupações de solo a partir da ‘mancha de inundação’.

Para se ter uma ideia da histórica falta de prioridade pelos governos, a bacia do Gravataí, fruto da mobilização político-ambiental na busca por identificar áreas alagadas, tem o processo mais avançado do RS, mesmo que estudos se arrastem desde o PAC da Prevenção lançado em 2012!

Após uma década, está em andamento a confecção de estudos e projetos para, por exemplo, diques de contenção de cheias em Gravataí (Parque dos Anjos), Cachoeirinha (da ponte divisa com Porto Alegre até atrás do Cadop) e na zona norte de Porto Alegre, além de, para enfrentar estiagem, os 13 minibarramentos no Rio Gravataí.

Resumidamente, as obras são necessárias para diminuir a velocidade da água no inverno de chuvas e segurar a água no verão de seca para o banhado não esvaziar rápido.

Para efeitos de comparação, o Vale do Taquari, imerso em uma tragédia, não tem plano algum.

Mas, por que é tão importante a ‘mancha de inundação’ e restrições de ocupação do solo?

Em um exercício simples de lógica, respeitá-la significa evitar problemas futuros, enquanto se busca resolver problemas do passado e do presente.

Inegável é que a não aceitação da recomendação da Metroplan pelos municípios, antes e depois do estudo, permitiu silenciosos aterramentos e barulhentas construções em áreas onde se sabe que a água pode chegar.

Mesmo que não baste apenas Gravataí respeitar a sustentabilidade, já que águas não tem fronteiras, é preciso agora associar-se à inclusão da ‘mancha de inundação’ e restrições de ocupação de solo na proposta de revisão no Plano Diretor, além de tornar prático o Plano Municipal de Drenagem, estudo contratado pela Prefeitura que vai detalhar o que precisa ser feito dentro dessa ‘mancha’, que inclui o Parque dos Anjos e a Vila Rica, por exemplo.

Caso Zaffa e os vereadores segurem o ‘dique das pressões’ do mercado imobiliário e aprovem um Plano Diretor sustentável, mostrarão na prática que as forças políticas de Gravataí têm a medida do problema social causado pelas cheias e secas.

Como em todo Plano Diretor, alguém perde. Que não seja o interesse coletivo a ser deixado de fora do barco”.

Ao fim, concluo hoje, justificando a manchete: com tantos interesses políticos e, principalmente, financeiros, há de se saudar, e lutar para garantir, um pouco de Greta Thunberg no nosso novo Plano Diretor.

A crise climática resta entre nós. Pensemos nos filhos e netos. O grande negócio de hoje pode ser o prejuízo de amanhã. Sabemos quem paga pelo desastre: os pobres.


Assista abaixo ao vídeo de Zaffa, postado pela SEGUINTE TV

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