Não é de hoje que a segurança pública é a prioridade número um dos brasileiros. Desde meados da década de 90, quando a hiperinflação herdada da ditadura militar (1964 – 1985) foi finalmente domada pelo Plano Real no governo (1995 – 2002) de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), 94 anos, e até o governo atual, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), 80 anos, a segurança pública tem sido uma das maiores preocupações da população. Não será diferente nas eleições de 2026. Aliás, não foi por outro motivo que, em 28 de outubro, o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), 46 anos, por sua conta e risco, lançou a megaoperação Contenção contra a facção criminosa Comando Vermelho (CV). A operação foi executada por 2,5 mil policiais, que deveriam cumprir 180 mandatos de busca e apreensão e 100 de prisão nos complexos do Alemão e da Penha, um conjunto de favelas na Zona Norte do Rio onde existem 26 comunidades e vivem 280 mil pessoas.
A operação durou dois dias e resultou em 121 mortos, entre eles quatro policiais, além de muitos feridos e presos. Ganhou a manchete dos jornais ao redor do mundo com a foto de 63 mortos enfileirados no chão da Praça São Lucas. A imagem tornou-se o símbolo desta que foi a operação mais letal da história da polícia do Rio. O Datafolha publicou uma pesquisa mostrando que 57% dos moradores do Rio concordaram total ou parcialmente com o governador, que disse ter sido um sucesso a operação. Outros 27% discordaram totalmente da avaliação de Castro e 12% discordaram em parte – 3% não concordaram nem discordaram e 2% responderam que não sabiam. A imprensa continua acompanhando os desdobramentos desta história. Fiz dois posts sobre o assunto, um deles publicado no final do mês de outubro: Autópsia nos 121 mortos contará os bastidores da megaoperação no Rio. Na sexta-feira (7), o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta, 36 anos, surpreendeu os seus opositores e aliados. Anunciou o deputado Guilherme Derrite (PP-SP), 41 anos, como relator do projeto de lei antifacção do governo federal, que tramita em regime de urgência na casa. O projeto do governo foi uma resposta aos acontecimentos da megaoperação no Rio. A indicação de Derrite como relator causou espanto porque até o último dia 5 ele ocupava o cargo de secretário da Segurança Pública do Estado de São Paulo, que é governado por Tarcísio de Freitas (Republicanos), 50 anos. Tarcísio é o provável candidato dos seguidores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), 70 anos, para disputar a Presidência da República em 2026 contra Lula, que concorre à reeleição. Motta alegou que Derrite era garantia de uma abordagem técnica na relatoria do projeto. Não foi. Já fez quatro relatórios que foram marcados por mexidas profundas na proposta do governo. Entre outras mudanças, ressuscitou a abordagem de terrorista para os traficantes e limitou a ação da Polícia Federal (PF). Na quinta-feira (13), o presidente da Câmara decidiu adiar a votação da quarta versão do relatório para a próxima semana, terça-feira (18). Todos os envolvidos nesta história sabem que governo e oposição precisam chegar a um acordo para colocar um freio no avanço do poder das facções.
Acredito que com o andar do tempo rumo a outubro de 2026, quando acontecerão as eleições, a imprensa trará para o debate outro tipo de violência que inferniza a vida dos brasileiros: os roubos e furtos de celulares, de fios de eletricidade e de veículos. Nas redações dos tempos das máquinas de escrever este tipo de ocorrência policial era conhecido como “varejo”. Não tem como as forças de segurança colocarem um policial em cada esquina deste imenso Brasil para inibir os assaltantes. O policiamento ostensivo tem as suas limitações. Ouvi esta frase nos anos 80 de um comandante da Brigada Militar, como os gaúchos chamam a polícia militar. Na ocasião, fazia uma reportagem sobre uma “epidemia da violência”, como se chamava na época as ondas de assaltos a mão armada nas ruas de Porto Alegre. A técnica mais eficiente usada pela polícia para sufocar estes crimes é descobrir e prender os receptadores, que são o elo entre ladrões e o crime organizado. Lembro-me de reportagens que fiz sobre furtos de fios elétricos, que é valioso por ter cobre e outros metais na sua fabricação. O furto dos fios deixa milhares de pessoas sem eletricidade e internet. E espalha muita confusão pela cidade. Sou repórter desde 1979 e o que me lembro dos meus plantões na redação nos fins de semana é que foram escassas as vezes em que não havia problemas causados pelo furto de fios. Nos dias atuais, outro crime que estraga o dia de qualquer pessoa é o furto ou roubo do celular. Já há seguro para a perda do aparelho. Mas este é o menor dos problemas da vítima. O pior é o acesso dos ladrões aos conteúdos existentes no aparelho, como agendas de telefones, aplicativos de bancos, documentos e vários outros. Este crime alimenta uma rede de receptadores que lucram vendendo os equipamentos e as informações. Por último, o roubo e o furto de veículos, em especial os mais antigos, que são demolidos e as peças, depois de passar por um processo de legalização através de receptadores, vão alimentar um mercado milionário. Fiz muitas matérias sobre o assunto. Nas últimas décadas, o governo federal tem dificultado a vida dos receptadores. Mas não conseguiu desarticulá-los.
Aqui lembro uma lição que os jornalistas aprendem nas redações. Sempre que as autoridades conseguem sufocar uma estratégia dos bandidos, eles inventam outra ali na frente para seguir ganhando dinheiro com o ilícito. Isso não é exclusividade do Brasil. Acontece em todos os países, incluindo as grandes potências econômicas e militares. Não existe uma fórmula mágica para resolvê-los. O que temos é o trabalho da imprensa denunciando a ação dos bandidos. Aqui há um problema, que lembro sempre que surge uma oportunidade. Sumiu das redações dos jornais brasileiros a figura do repórter que fazia a cobertura dos assuntos policiais. Era justamente na “editoria de polícia” que os repórteres conseguiam fazer reportagens que pressionavam as autoridades para dar atenção à segurança pública. Não tem como voltar no tempo e ressuscitar o repórter policial. Mas as redações vão ter que resolver a questão, caso contrário correm o risco de perder muitos assinantes. A imprensa é a ferramenta mais eficiente que os leitores têm para pressionar as autoridades a enfrentar os problemas de segurança pública. Não existe “bala de prata”.





