3º NEURÔNIO

APN-VG: 46 anos pregando a sustentabilidade ambiental

Cinzas da professora Tânia Peixoto, fundadora da APN-VG, sendo jogadas no Rio Gravataí, em homenagem póstuma

O jornalista Claudio Wurlitzer, sócio-fundador da APN-VG, ex-presidente e membro do Conselho Deliberativo, escreve para o Seguinte: sobre os 46 anos da entidade, completos neste sábado


Pode parecer um pouco estranho começar um texto escrevendo “Eu estava lá”, sim, na primeira pessoa. Mas o textão que segue tem o conteúdo conjugando os verbos valorizando o coletivo, o trabalho em equipe. E não poderia ser diferente, pois o relato recheado de reflexões foi e está sendo construído por muitas mãos e mentes. Quando digo “eu estava lá” é para ressaltar, com muita satisfação, que fiz parte do grupo que deu início à história da Associação de Preservação da Natureza Vale do Gravataí – APN-VG – que neste sábado, 14 de junho de 2025, completa 46 anos de atuação na defesa daquilo que de mais importante nós temos: o meio ambiente.

Nem sempre compreendidos, os ambientalistas recebem críticas típicas dos tempos de negacionismo. De que haveria exagero no combate à destruição dos recursos naturais; de que somos contra o desenvolvimento. Diante da recente catástrofe vivida pelo Rio Grande do Sul, entretanto, algumas vozes foram capazes de reconhecer que parte dos danos causados tem origem no desrespeito ao meio ambiente. Embora a luta ambiental tenha deixado claro, há décadas, o ser humano agride os recursos naturais como se outra Mãe Terra estivesse à nossa disposição. É triste, mas parece que uma tragédia dessa magnitude, ainda sentida na pele por famílias desabrigadas, tenha servido como alternativa para ensinar e fazer repensar esse comportamento muitas vezes irracional no planejamento de bairros e cidades inteiras.   

Embora textão, a narrativa que segue é consistente, e síntese de uma luta incansável da nossa APN-VG, que segue com garra e disposição para levar adiante seu propósito contido no próprio nome da entidade: a Preservação da Natureza. Pela lógica, a família ambientalista se insurge diante de projetos que ainda hoje, com o pretexto de “flexibilizar” licenciamentos querem facilitar o desmatamento e prejudicar os recursos hídricos, e até mesmo contaminar alimentos. Ou seja, não basta uma tragédia climática apontar erros na urbanização de cidades, ainda assim, há quem defenda prejudicar ecossistemas que são barreiras naturais e precisam ser preservadas.

Ousadia desde o começo

No final da década de 1970, surgia em Gravataí um movimento da sociedade civil que ousava, para a época, manifestar seu descontentamento com a destruição de um banhado. Um banhado, que para os leigos pouco representava, para os ambientalistas era algo vital para a preservação das nascentes do Rio Gravataí. Percebendo o crime ecológico contra o Banhado Grande, e o que representaria o dano ambiental para o futuro da região, surgia a inspiração e os motivos para dar base à Associação de Preservação da Natureza Vale do Gravataí. Assim surgia a APN-VG, uma entidade não-governamental, sem fins lucrativos, fundada no dia 14 de junho de 1979, durante uma assembleia no auditório do Colégio Dom Feliciano.

Cabe lembrar que, para chegar à criação da entidade, os idealizadores do movimento não contavam com espaços na mídia. Poucos jornalistas pautavam o tema. Como divulgar as ideias? Nem cartazes coloridos, nem telefones, nem carros de som para mobilizar possíveis adeptos de uma ideia, que muito tempo depois seria compreendida como uma luta justa pelo “desenvolvimento sustentável”. Telefone celular e uso de e-mails, para se comunicar com o mundo, não existia nem em filme de ficção científica. Os contatos eram no corpo-a-corpo, mandando recados nas escolas, nas igrejas, pegando um ônibus para ir à Cachoeirinha; demorando quase um dia inteiro para ir à Alvorada e Viamão, ali, logo depois do rio.

Desafios que outros movimentos mais recentes não conhecem e as novas gerações nem conseguem imaginar como era “compartilhar” informações, tirar fotos e esperar dias pela revelação, além de pagar caro pelo serviço. Era um desafio atrás do outro. Mas o pessoal ia, afinal, era a forma de sensibilizar as pessoas para uma luta digna e por uma causa justa, que percorridos estes 46 anos continua merecendo atenção e esforços. Afinal de contas, a defesa do rio requer ações ainda mais efetivas, pois ele ainda não está salvo. Pior do que isso: até leva culpa em alguns comentários sobre a enchente que assolou o Rio Grande do Sul em maio de 2024. Sim, a zona norte de Porto Alegre recebeu enorme volume de água e parte da catástrofe teria o Rio Gravataí como causador.

Retomando o pensamento sobre a história da APN-VG, é bom lembrar que pensar na organização de um manifesto, ainda no período do Regime Militar, era colocar a integridade física a prêmio. Criada a APN-VG, durante quase um ano, um grupo percorreu escolas, igrejas, sindicatos, associações de moradores e outras entidades com o objetivo de chamar a atenção para um ato que desencadearia numa verdadeira “rebelião” para a época. Sem contar com os recursos modernos de multimídia, como o data-show, apresentando fotos em slides, cartazes feitos à mão, o movimento explicava que a destruição dos banhados para uso de áreas e da água para o plantio de arroz significaria o fim do rio.

Nessa luta, aos poucos, a população foi compreendendo a importância dos banhados como elementos naturais para servirem de mecanismos reguladores da vazão do rio. Além disso, os banhados, em especial o Banhado Grande, tem uma importância fantástica relacionada com a flora e fauna, pois ali vivem inúmeras espécies que têm a região como seu habitat natural.

Em meio à luta pela defesa do rio, a primeira conquista surgiria ainda em junho de 1979, quando a então Secretaria Estadual da Saúde e Meio Ambiente fixava a portaria 10/79, “proibindo toda e qualquer obra de drenagem nas nascentes do Rio Gravataí”. Para os líderes do movimento, a portaria foi o primeiro reconhecimento de que a luta era algo viável e que tinha sua razão de ser. Além disso, a portaria era uma espécie de aval para levar a batalha adiante e justificar a mobilização caso alguma força contrária tentasse atrapalhar.

Na época (1979), a estimativa apontava que o rio era responsável pelo abastecimento de 400 mil pessoas no Vale do Gravataí. Como alternativa apresentada para conter a vazão do rio, a mobilização pedia ao governo estadual a construção de uma barragem, possivelmente na altura do Passo dos Negros, ou mais acima, na região da Lagoa da Anastácia. Tal indicativo, com o avanço de estudos e análises, resultaria em projetos para a construção de mini barragens em diversos trechos do rio como forma de devolver em grande parte a capacidade do manancial. A nova opção de obra evitaria impactos ambientais desagradáveis. Mas a lentidão em colocar projetos em prática segue preocupante.

A justificativa para a barragem era uma só: com a destruição da “esponja natural”, provocada pelos canais de drenagem, desde uma obra do DNOS, em 1962, a saída seria uma outra obra para segurar a água nos períodos de estiagem, evitar o desabastecimento da região, e ainda controlar o volume de água nas épocas de grandes enxurradas, o que evitaria alagamentos de vilas ribeirinhas ao rio Gravataí, especialmente em Cachoeirinha e Alvorada. E, como se viu recentemente, a inundação da ligação destes municípios à capital do estado tem, em parte, um volume de água que poderia estar armazenado na nascente do rio. Na trajetória de denúncias e de reivindicações viria o pedido de um Plano de Bacia e outras providências para se ter um olhar mais abrangente sobre o crescimento da urbanização das cidades.

Atualmente, somos mais de um milhão e duzentos mil habitantes dependendo das águas do Rio Gravataí, incluindo parte da população da zona norte de Porto Alegre. Mesmo com toda a importância, o Gravataí, embora todos os esforços e as denúncias da APN-VG, de alguns órgãos públicos, e de amplas reportagens da imprensa, ainda é um manancial que segue fragilizado e comprometendo a qualidade de vida e o desenvolvimento da região.

 Para recordar, a Bacia Hidrográfica do Rio Gravataí, na Região Metropolitana de Porto Alegre, tem uma área aproximada de 2.020 km² e abrange, total ou parcialmente, os municípios de Alvorada, Cachoeirinha, Canoas, Gravataí, Glorinha, Porto Alegre, Santo Antônio da Patrulha e Viamão. Embora fragilizado, um programa de Educação Ambiental da APN-VG já mostrou a milhares de pessoas que o nosso rio tem paisagens exuberantes e água de qualidade onde a urbanização ainda não o atingiu.

A Procissão

Registra a história que para organizar o manifesto da APN-VG, que viria a se chamar “Procissão Ecológica”, os ativistas precisaram utilizar um artifício logo no início de sua organização. Passeata, ato público, marcha, manifesto e outros termos semelhantes não pegariam bem para o sistema político vigente. A “Procissão Ecológica”, além de ser uma forma simpática para ganhar apoio de diferentes segmentos da sociedade, acabaria tendo um formato sem restrições de parte das forças de segurança. Assim, a própria Brigada Militar, que naqueles tempos recebia ordens para reprimir qualquer passeata por entender que isso seria balbúrdia, provocação à ordem e contra o regime, acompanhou o nosso evento e mais tarde passou a ser parceira em ações de combate à caça ilegal e outras práticas prejudiciais ao rio.

Fundada em junho de 1979, a APN-VG seria “batizada”, por assim dizer, quase um ano depois, quando colocaria à prova sua razão de existir numa grande concentração popular. Assim, aproximadamente oito mil pessoas se concentraram no Parque dos Anjos e percorreram a Avenida Antônio Gomes Corrêa até a beira do Rio Gravataí, na Sociedade Caça e Pesca, onde foi realizada uma cerimônia ecumênica. Isso, no dia 8 de junho de 1980. Caravanas organizadas nas cidades vizinhas lotaram ônibus e ajudaram a dar a sustentação que o movimento criado em Gravataí tanto precisava. Faixas e cartazes misturavam súplicas e reclamações; e os cânticos evangelizadores saudavam a natureza, pediam a proteção divina, sem deixar de denunciar o descaso do governo estadual com o nosso rio.

Era denunciado que a área original do banhado foi gradativamente reduzida pela ganância do homem, especialmente para o desenvolvimento da orizicultura. Da área original, equivalente a 450 Km², a vida do rio dependia de somente 50 Km² de banhados. Era destacado, também, que ao longo dos trechos médio e inferior do rio localizam-se parte das áreas urbanas dos municípios integrantes da bacia com altas densidades de ocupação e intensa degradação dos seus recursos naturais, principalmente com os despejos de esgotos sem tratamento. Para dar uma ideia da dimensão do problema, se os números não aumentaram, o rio recebe, diariamente, 50 toneladas de esgotos sem tratamento. Para não dizer que o problema é só na bacia do Gravataí, olhando a triste realidade em termos de estado, sabe-se que cerca de sete milhões de gaúchos ainda convivem com a falta de coleta e tratamento de esgotos.

Em relação à procissão ecológica, mesmo deixando orações de lado e fazendo críticas bem direcionadas ao governo estadual, não ocorreu nenhum incidente durante o ato. E coisa muito rara para a época, a imprensa da capital se deslocou a Gravataí e acompanhou a manifestação, dando espaço nos noticiários de tevê, jornal e rádio na segunda-feira. Era o segundo grande reconhecimento da luta, e algumas portas se abririam nos órgãos estaduais a partir de então. Inclusive as portas do Palácio Piratini, mesmo que fosse apenas para reconhecer que o Gravataí precisava ser salvo, sem ações concretas como desejávamos.

Junto com a mobilização pela defesa das nascentes do rio, a APN-VG passou a agir na fiscalização de outras agressões ao meio ambiente, denunciando crimes como o desrespeito à lei federal 6766/79, do parcelamento do solo urbano, que permitiu a proliferação de loteamentos irregulares na década de 1980, não apenas em Gravataí, como na região. Isto provocou ações no Ministério Público e notícias nos veículos de comunicação. Era a APN-VG vigilante no crescimento das cidades. Mesmo assim, e é de conhecimento público, dezenas de loteamentos até hoje dão dor de cabeça aos administradores com a falta de infraestrutura. Pior, ainda, são bairros em áreas que deveriam ser respeitadas por estarem em locais de preservação permanente. A recente catástrofe climática trouxe à tona a falha no planejamento urbano. Basta olhar os mapas para ver que a maior parte dos atingidos está em áreas impróprias para a habitação.

O ano de 1983 foi marcado na luta ambiental do Rio Grande do Sul com a iniciativa da APN-VG ao trazer a Gravataí uma série de especialistas sobre a importância dos banhados. Foi o primeiro Ciclo de Estudos e Debates sobre os Banhados do RS. Durante as trocas de informações, foi unânime a opinião de que o Gravataí sofrera enorme crime ambiental com a destruição de parte de suas nascentes. A proposta aprovada apontou que algo deveria ser feito para recompor aquele ambiental natural, o que representaria a sobrevivência do manancial. Diante disso, o encontro atestou que a luta no Vale do Gravataí estava correta e a comunidade deveria seguir buscando soluções junto aos órgãos responsáveis.

Em Cachoeirinha, ações da APN-VG foram decisivas para a preservação de um banhado próximo ao Shopping do Vale e outra luta que é reconhecida pela comunidade diz respeito à preservação da área de mata nativa do Mato do Julio, alvo constante de especulação imobiliária. O movimento ganhou a simpatia de importantes setores da sociedade e o debate prossegue. Com a recente catástrofe climática, o local serviu de esponja para absorver enorme volume de água das chuvas e evitar uma tragédia ainda maior em bairros próximos. Este fato foi reconhecido e, inclusive, pautou debate em reunião do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Gravataí. Resultado disso foi o encaminhamento de pedido para que a área seja desapropriada pela União. O resultado ainda não saiu, fazendo com que o debate pela preservação da área não deva parar.

Cabe recordar outra luta encabeçada pela APN-VG na defesa da região. Foi em 1985, quando a entidade liderou um debate para mostrar que a pretendida exploração de carvão mineral causaria enormes riscos à poluição hídrica e atmosférica no Vale do Gravataí. De tempos em tempos, todavia, surge um interessado em retomar o assunto, o que motiva uma atenção permanente.

Os banhados: a origem da luta

Ainda tratando e resgatando a história, querendo ou não, compreendendo ou não, a vida e o desenvolvimento da Região Metropolitana de Porto Alegre passam pela preservação do que restou dos banhados e outras áreas naturais que sustentam o Rio Gravataí. A bacia é caracterizada pela presença de encostas, coxilhas e uma planície lagunar onde estão localizados três importantes banhados: o Banhado Grande, o Banhado do Chico Lomã e o Banhado dos Pachecos. São importantes ecossistemas naturais e, como dizia o maior ambientalista de todos os tempos, José Lutzenberger, “os banhados são ecossistemas que devem manter-se intactos, sob pena de comprometer a vida até mesmo de cidades distantes”.

Os levantamentos comprovam que a região dos banhados forma um ponto de migração de aves que vêm de outras regiões do Brasil e até mesmo de outros pontos do continente, que passam pelo banhado em diferentes épocas do ano em busca de repouso e alimento para seguirem viagem. Também há o registro de que uma infinidade de peixes e répteis busca seu último e derradeiro abrigo em banhados, aproveitando suas águas mornas e calmas, o que permite a desova, o aninhamento e a procriação destes animais. E mamíferos, como a capivara, ameaçada de extinção, tem o banhado como refúgio único. E foi a partir de constatações como estas e afirmações de Lutzenberger, que a APN-VG organizou em Gravataí um seminário exemplar para a década de 80. Foi em 1984, quando ecologistas e pesquisadores de diversas partes do RS trouxeram experiências para o Primeiro Encontro de Estudos e Debates sobre os Banhados do Rio Grande do Sul.

O resultado disso serviu para reafirmar a importância desses ecossistemas e de nossa luta em defesa das nascentes do Rio Gravataí. O evento ganhou a adesão dos municípios vizinhos, e a defesa dos banhados não cessou.

Surge o Comitê de Bacia

Com a mesma consciência de que os recursos hídricos da região deveriam receber um tratamento especial, a luta da APN-VG motivou a proposta para a criação do Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Rio Gravataí. E isso se efetivou em fevereiro de 1989, tendo no RS apenas o Comitê Sinos como antecessor. Nesse Comitê, a APN-VG tem voz e voto, e comemorou a aprovação de parte do Estado da definição do Termo de Referência que inclui estudos para a elaboração do Plano de Bacia para a região, algo que vai permitir saber o quanto há de água disponível na bacia, como podem ser seus usos e o quanto deve ser pago por estes usuários. Cabe destacar que a atual gestão do Comitê tem o geólogo Sérgio Cardoso, da APN-VG, na presidência.

Junto à luta para tocar em frente o Comitê da Bacia Hidrográfica, a comunidade ambientalista da região foi protagonista no movimento de criação – nove anos depois – da Área de Proteção Ambiental do Banhado Grande. A APA integra dois terços da bacia do Gravataí, juntamente com a Unidade de Conservação do Refúgio da Vida Silvestre, localizada no Banhado dos Pachecos. Nessa área habitam espécies raras de nossa fauna, como o Cervo do Pantanal e o Jacaré do Papo Amarelo.

A luta de todos

É por essas e tantas outras ações que a preservação do Rio Gravataí não pode ser somente um sonho dos ambientalistas, mas uma batalha que cada morador da região, industrial, agricultor, cidadão e cidadã deve empreender e seguir, tendo a exata noção do quanto representa o rio para a sobrevivência da população e o verdadeiro crescimento econômico da região. Nossa luta, por razões óbvias, não aceita uma fala sobre “desenvolvimento” sem que ele seja sustentável, também, do ponto de vista ambiental e social.

Por isso, acompanhando a atuação da APN-VG nesses 46 anos na defesa da causa ambiental, também é importante destacar que a entidade tem participação direta em organismos de discussão democrática. Ou seja, vai ao debate; tem argumentos e mostra porque é protagonista nessa luta ainda por muitos ignorada. Participando nos conselhos municipais de Meio Ambiente, do Plano Diretor, do Turismo, no Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Rio Gravataí; no Conselho Regional de Desenvolvimento Delta do Jacuí, no Conselho da APA do Banhado Grande, entre outros espaços de discussão pública, a APN-VG, tendo direito a voz e voto, manifesta-se sempre como uma organização identificada com a defesa do meio ambiente, da sociedade e do bem público.

A conquista de espaço não é recente. Tratando-se da legislação ambiental, a primeira grande intervenção da entidade nos destinos do município de Gravataí ocorreu durante a elaboração da Lei Orgânica pela Câmara de Vereadores, em 1990. Os legisladores, na oportunidade, seguiram orientações e conselhos para que a Lei Orgânica cuidasse do futuro da cidade.

No ano 2000, a elaboração do Código Municipal de Meio Ambiente também contou com a APN-VG opinando sobre questões que interferem diretamente no modelo de crescimento que a cidade poderia suportar.

É de reconhecimento público, também, que o movimento ambientalista motivou a órgãos públicos e governantes na criação de setores na Prefeitura de Gravataí voltados à defesa do meio ambiente. Assim surgiria, na década de 80, a Coordenadoria Técnica de Meio Ambiente, um setor junto à Secretaria de Planejamento; e a criação, em 1994, da Fundação Municipal de Meio Ambiente, um órgão gerenciador da política ambiental no Município. Mais tarde, a FMMA tomaria o formato de secretaria, ampliando área de atuação com a inclusão da política de proteção animal,

A luta segue no sentido de que os órgãos governamentais tenham em suas políticas públicas a preservação ambiental como essencial ao desenvolvimento econômico e ao bem-estar social. Em relação a isso, a APN-VG está sempre atenta e preocupada quando estão em pauta propostas de alterações do Plano Diretor da cidade. Na área da Educação Ambiental, a luta é alicerçada numa busca constante de conscientização pela defesa dos recursos naturais. Nessa pauta, a entidade dá uma atenção especial ao proporcionar passeios de barco pelo Rio Gravataí, verdadeiras aulas para estudantes e professores. No final deste artigo aborda-se o maior exemplo de Educação Ambiental já experimentado na região, ou até mesmo no Rio Grande do Sul: o desenvolvimento do Projeto Rio Limpo.

Em 2008, a APN-VG apoiou o 1º Encontro Regional de Educação Ambiental, realizado pela Fundação de Meio Ambiente, em Gravataí; e em 2010, apoiou o segundo Encontro, desta feita promovido pela Secretaria de Meio Ambiente de Cachoeirinha. Com esta ótica, além de defender o Rio Gravataí, a APN-VG não deixa de apoiar ações e movimentos ambientais de outras bacias hidrográficas, entendendo que a defesa do meio ambiente não tem muralha, nem deve ter outras barreiras. Também em 2010 a entidade conseguiu finalizar a obra da sede própria. Após árdua campanha comunitária para garantir materiais e mão de obra, a sede foi instalada na rua Dr. Luiz Bastos do Prado, esquina com Timóteo Fonseca, defronte ao quartel do 17º BPM da Brigada Militar. Até então, reuniões e encontros de trabalho eram realizados em salas cedidas por escolas, na sede da Sociedade Orquidófila e na Casa Paroquial da Igreja Nossa Senhora dos Anjos. A área da sede foi doada pelo Município de Gravataí, em 1996. Neste local, sob os cuidados da APN-VG encontra-se a “Fonte do Moringa”, uma vertente natural que abastecia parte da região central da cidade no início do século XX.

Não fugindo dos debates

Além de manter a proposta voltada para que os órgãos governamentais tenham em suas políticas públicas a preservação ambiental como essencial ao desenvolvimento, a APN-VG, ao completar 46 anos de atuação no Vale do Gravataí, pretende ampliar suas ações de Educação Ambiental nesses municípios.

Consta no plano de trabalho que a prioridade é ser uma aliada permanente da comunidade escolar da região. As ações, além das aulas embarcadas, querem priorizar a conscientização sobre a importância dos arroios e demais recursos hídricos para a bacia, bem como seguir abordando aspectos da destinação final dos resíduos sólidos. Nesse aspecto, valoriza, sobremaneira, os programas da coleta seletiva. E a arborização urbana?

 A polêmica sobre corte de árvores

A APN-VG quer ser parceira na discussão e elaboração de planos de arborização urbana capazes de combater práticas equivocadas e a omissão de autoridades quanto ao corte desnecessário de árvores. Muitas vezes, o abate de árvores causa danos irreversíveis à população. População essa que nem sempre é orientada, provoca danos, mas muitas vezes vê, sem explicação, cortes desnecessários e até mesmo devastações que degradam o meio ambiente para dar lugar a obras da construção civil.

Em 2023, a APN-VG participou de um encontro voltado a discutir a importância da arborização urbana. Especialistas expuseram, em Gravataí, exemplos de êxito praticados em diversas partes do país. Pede-se, cada vez mais, uma gestão sustentável da vegetação, desde o levantamento e orientações técnicas sobre quais espécies e locais são apropriados para plantio na cidade, bem como um controle rigoroso no que trata de árvores que, de fato, precisam ser abatidas. Em recente documento elaborado pela APN-VG é destacado que a “arborização urbana não é um luxo”. Pelo contrário: “é uma necessidade e todos que assim o fazem, constroem um ambiente mais saudável, resiliente e humano”. O mesmo documento faz um apelo para que esse caminho seja seguido não apenas por uma imposição legal, mas por uma consciência coletiva.

Rio Limpo

A APN-VG está desenvolvendo um programa de Educação Ambiental que entrou para a história da defesa do meio ambiente em toda a Bacia Hidrográfica do Rio Gravataí. Através de uma parceria com a Petrobras, com seu programa Petrobras Socioambiental, a APN-VG passou a realizar ações no sentido de conscientizar a população sobre a importância da preservação do nosso rio como fonte essencial para o desenvolvimento da Região Metropolitana de Porto Alegre e do Rio Grande do Sul. Através do projeto inédito para a região, a comunidade passou a ser informada sobre as maneiras de colaborar para salvar e preservar nosso principal recurso hídrico, do qual dependem mais de um milhão de habitantes. Redes escolares de toda a bacia receberam material didático específico para melhor compreender a proposta educativa. Através de seminários, palestras, oficinas, atividades lúdicas e formação de professores, o projeto atuou durante dois anos em mais de uma centena de escolas da região. A iniciativa teve patrocínio até o cumprimento de todas as metas, entre 2014 e 2016, e obteve pleno sucesso. A meta de público a ser atingida era de seis mil pessoas. Com o engajamento da equipe de trabalho ao desenvolver o Plano Pedagógico, esse número chegou a 82 mil pessoas contempladas de forma direta, e mais de um milhão de maneira indireta. O ponto alto da iniciativa foi a construção de um barco-escola, tipo catamarã, que passou a percorrer o Rio Gravataí a partir de março de 2016, propondo um novo olhar sobre o manancial sempre citado como um dos mais poluídos do Brasil. A principal lição apresentada nas aulas embarcadas apontou que grande parte do rio tem água limpa e uma vegetação exuberante, contradizendo críticas de que é um rio quase morto. Sempre foi lembrado que o trecho altamente poluído se encontra em áreas urbanas onde redes de esgotos sem tratamento chegam ao Gravataí.

O sucesso alcançado pelo Projeto Rio Limpo rendeu o reconhecimento público em duas premiações à APN-VG: a primeira, através da Câmara de Vereadores de Gravataí, que concedeu o Prêmio Selo Ambiental/2017. O segundo, pela Assembleia Legislativa do RS, com o Prêmio Pioneiros em Ecologia.

Após o atingimento de todas as metas previstas, e concluído o compromisso com o Programa Petrobras Socioambiental, chegava o desafio de seguir as viagens técnicas pelo rio. A adesão das forças do Vale do Gravataí para o Rio Limpo fase II seria fundamental na manutenção dos custos operacionais. Nos últimos anos esse apoio vem se concretizando e as viagens seguem mostrando a milhares de estudantes o quanto de beleza e vida tem o Rio Gravataí.

 O movimento ambiental que chega aos 46 anos teve como motivador para começar a luta o engenheiro mecânico e professor Paulo Roberto Müller, que foi o primeiro presidente da APN-VG, e também liderou a entidades em outros períodos. Ao longo da trajetória também presidiram a entidade a profª Lia Mara Ciarelli, Edegar Luiz Alves, Teodomiro Fernandes, a profª Tânia Dias Peixoto, Marcelo Domingues, o geólogo Sérgio Luiz Cardoso, também gestor do projeto Rio Limpo; e o autor deste artigo, jornalista Claudio Wurlitzer. O atual presidente é o profº Leandro Martins.

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