Ministro analisou caso de trabalhor demitido e isentou prefeitura de indenização trabalhista: o nexo de causalidade
Em meio à mediação judicial do pagamento das rescisões dos demitidos da Gamp, vem das mãos – e da caneta – do ministro Alexandre de Moraes o fato novo e curioso que promete ser um novo ponto de inflexão nas negociações entre a prefeitura e os sindicatos dos trabalhadores. Em decisão tomada há dez dias, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) isentou a Prefeitura de Canoas do pagamento de encargos rescisórios a um técnico de enfermagem que prestou serviços ao Gamp e foi demitido. O trabalhador era ligado ao Hospital Universitário e, ao sair, acionou a Prefeitura na Justiça para receber o que teria direito.
No Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, o TRT4, onde também tramita a mediação dos atuais demitidos, o trabalhador teve ganho de causa. A decisão daqui entendeu que o contrato com o Gamp se tratava de uma terceirização e que o município não teria fiscalizado corretamente o cumprimento das obrigações trabalhistas da entidade em relação aos seus funcionários, condemando à indenização subsidiariamente, como se o técnico tivesse prestado serviços ao município diretamente.
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A defesa da Prefeitura, acatada por Alexandre de Moraes, alegou que o contrato com o Gamp se deu nos termos da Lei de Parcerias promulgada em 2014 e, portanto, não se tratava de uma mera terceirização. Esta lei prevê regras diferentes para a relação entre entidades e o poder público – inclusive no que toca a eventuais indenizações de funcionários. Prevê o óbvio – o que, muitas vezes, precisa ser dito e repetido: cabe à entidade o pagamento das obrigações trabalhistas e não ao ente público; o Gamp, no caso, recebeu recursos públicos para execução de um plano de trabalho, prevendo custos trabalhistas que deveriam ser honrados.
Senão, fica fácil: vem, faz lambança e vai embora, deixando para trás um 'rabo' enorme de custos e despesas que prefeituras tem de arcar para que trabalhadores que nada tem a ver com as irregularidades das entidades não sejam prejudicados.
Além disso, Alexandre de Moraes entendeu que não houve 'nexo de causalidade' entre o prejuízo do trabalhador e a ação da prefeitura, ou seja, o ente público não teria colaborado para o dano ao funcionário e, portanto, não caberia o pagamento pelos cofres da municipalidade.
Mas o que isso tem a ver com as atuais negociações com os demitidos do Gamp? Bem, nada e tudo, ao mesmo tempo.
O que está acontecendo agora é uma mediação judicial. A Prefeitura de Canoas é a interventora do Gamp no município e tem a obrigação de proceder com as indenizações – mas também tem a obrigação de acionar o Gamp para reaver valores que tenha pago a mais pelos termos de fomento assinados lá em 2016. É o famoso 'encontro de contas' que, mais cedo ou mais tarde, terá de ocorrer – e é bom que ocorra. O Gamp e seus sócios precisam pagar, inclusive com o próprio patrimônio se for o caso, pelas derrapagens e irregularidades encontradas em Canoas na famosa ação do Ministério Público e da Polícia gaúcha em dezembro de 2018.
Por outro lado, a decisão de Alexandre de Moraes protege, em parte, a prefeitura em eventuais ações judiciais futuras – que podem ocorrer mesmo após o fim desta mediação. Trabalhadores que julgarem que deveriam receber valores diferentes do que restar combinado agora tem o direito de acionar a Justiça pelo correto cálculo das indenizações. Mas, aí, talvez não seja a Prefeitura a responsável direta pelo pagamento e sim o Gamp – ou o que restar dele até lá.
Embora sindicatos e trabalhadores tenham razão e legitimidade para defender o melhor acordo para seus assistidos, a decisão de Alexandre Moraes é, sem dúvida, uma alerta. Reputo o 'acordo possível' como o melhor caminho – pelo menos por enquanto e sem demérito algum ao valoroso trabalho das entidades sindicais nesse processo. Imaginem como se daria uma interminável discussão judicial contra uma massa falida e uma jurisprudência que isenta a prefeitura dos pagamentos quando ela não tiver contribuído para o dano?
O Gamp enganou a todos.