BLOG DO RODRIGO BECKER

CANOAS | Licitação do transporte é necessidade; rodoviários não são o para-choque da Sogal – nem os ‘novos luditas’

Atual concessão do transporte público à Sogal encerra no dia 23 de dezembro e governo já manifestou que irá fazer nova licitação nesse período. Foto: Arquivo RB

Dúvidas sobre o futuro dos empregos fazem acender o fogo de uma greve entre a categoria – a história dos luditas se repete, primeiro como tragédia, depois como farsa

Há uma diferença entre o legítimo e o justo.

A preocupação dos rodoviários com o futuro dos empregos conforme se aproxima o prazo final para o fim da concessão do transporte coletivo à Sogal é legítima. Da pandemia para cá, o histórico de pagamentos da empresa é sofrível, mas não é a única rotina que tira o sono de quem tem que receber o soldo da empresa. Quando fez um plano de demissões para redução da folha, em 2019, prometeu pagamentos mensais e sucessivos e atrasaram ‘mês sim e outro também’, praticamente. A última informação que levantei era de que alguns ex-trabalhadores acumularam quase uma indenização e meia somente com as multas que a empresa, agora, lhes deve. Leilões de terrenos foram feitos e, mesmo assim, foi insuficiente para quitar os compromissos com motoristas e, principalmente, cobradores que aceitaram deixar o emprego na Sogal, mas jamais abriram mão do que a lei lhes garante de rescisão.

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Os trabalhadores da ativa tampouco estão em melhor situação. Durante a pandemia, os atrasos na folha foram mais frequentes e notórios. A empresa sentiu a ‘uberização’ e caiu praticamente de joelhos quando a Covid-19 tirou as pessoas das da rua – e os passageiros das roletas. Não fossem os aportes públicos mantidos mês a mês, a Sogal teria seguido o mesmo destino da ‘irmã’ Vicasa, que num nascer do sol neste mesmo mês de junho, há dois anos, simplesmente deixou de mandar seus ônibus às ruas. Só a Prefeitura de Canoas põe no caixa da empresa cerca de R$ 1 milhão por mês. É com essa grana que são pagos os salários dos cerca de 350 funcionários que ainda restam à Sogal – as pensões alimentícias que se descontam deles, os impostos sociais e os vales-refeição, que também andaram atrasando de forma contumaz.

Não dá para culpar o motorista que conduz o ônibus de qualquer canto da cidade pela intranquilidade que ronda o seu emprego. Ele que viu o salário atrasar, o vale ser pago em dias diferentes a cada mês, que viu os colegas demitidos indo para frente da garagem cobrar a rescisão que não foi paga, esse trabalhador está pensando em como ficará a sua situação quando finalmente a Sogal fechar os portões. A preocupação dele é legítima.

A greve, no entanto, não é justa.

Não vejo como parar o transporte seja útil para garantir pagamentos, indenizações e melhores condições de trabalho na Sogal – seja lá por quanto tempo ela mantenha o serviço em pé. Ao contrário: se os ônibus não rodarem, menos moedas pingam no combalido caixa da empresa e mais fácil fica para dizer que não tem como honrar seus compromissos. Rodoviários não são o para-choque da Sogal, mas numa eventual greve, seriam usados como se fossem. Mais uma vez, a empresa usaria a insegurança profissional alheia como força de pressão por uma prorrogação da concessão, mais recursos públicos ou até uma eventual indenização – vejam só – pelo serviço que a Sogal prestou à cidade nos últimos 50 anos; só quem anda de ônibus sabe o naipe que o serviço tem.

Vejo a licitação como necessária para que se acabe com esse ciclo vicioso em que se tornou a relação da Sogal com a cidade. É fundamental que em pleno 2023 se abra possibilidades de inovação no transporte e a atual concessão não permite isso. Controle mais transparente também. Melhor qualidade do serviço. E melhor remuneração dos funcionários – coisa que hoje parece impensável. É nesse sentido que imagino os atuais trabalhadores da Sogal sendo empurrados pela empresa para uma posição de ‘neoluditas’: no início do século XIX, com a Revolução Industrial literalmente a pleno vapor na Inglaterra, funcionários de tecelagens destruíam máquinas das novas fábricas por imaginarem que isso manteria os seus empregos. As novas máquinas eram vistas pelos luditas como a responsável por demissões num primeiro momento, mas o que se viu, em toda a Europa, foi um crescimento rápido do nível de emprego com a produção mais eficiente que os novos equipamentos geraram. Uma greve, agora, reforçaria a ideia de que os rodoviários são os ‘novos luditas’ da licitação e de que, em nome dos empregos, a Sogal precisa ser mantida a qualquer custo.

Como filho de um ex-motorista de ônibus, sei que não é assim que a maioria pensa. Espero que na reunião que está marcada entre a categoria e o prefeito Jairo Jorge para esta terça-feira, 13, se avance no sentido de garantir um percentual de recontratação mínima para os trabalhadores da Sogal nas novas ou na nova empresa que assuma o transporte público em Canoas. Isso é possível, viável e talvez contemple a preocupação de todos. Conversando, dá para ir adiante. Só não dá para parar o progresso.

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