Em entrevista ao PortoAlegre24horas, prefeiturável disse governo “sabia que tragédia ia acontecer e não avisou as pessoas para não criar pânico”
ATUALIZADA – Márcio Freitas (PRD), candidato a prefeito, foi entrevistado pelo jornalista Diego Garcia no programa Raio X, do canal PortoAlegre24horas nesta sexta, 29, e disse algo que, absolutamente, não é verdadeiro. Conhecendo Márcio, entenderá a crítica e a sugestão: recua, Márcio!
Em trecho da entrevista que está postado no Instagram — o blog só não reproduz aqui por que a Meta não permite o compartilhamento do conteúdo —, o candidato conta de uma reunião que aconteceu na sala da presidência da Câmara em 2 de maio de 2024, dois dias antes do início da enchente que avassalou todo o lado Oeste da cidade. Naquele encontro, o prefeito Jairo Jorge e o secretário de Resiliência Climática, José Fortunati, teriam dito aos vereadores que a tragédia aconteceria mas que não era para avisar as pessoas para não causar pânico, segundo o relato de Márcio ao canal. Quer ver? Clica aqui e confere direto no Instragram no PortoAlegre24horas.
O blog apurou que a reunião, de fato, aconteceu. O papo, no entanto, não foi bem assim.
A conversa sobre o que estava por vir
A reunião foi chamada a pedido do prefeito Jairo Jorge com todos os 21 vereadores para a manhã do dia 2 de maio, a quinta-feira após o feriado do Dia do Trabalhador. Três não compareceram: Airton Souza (PL), Juares Hoy (PP) e Jonas Dalagna (PP), que afirma ter sido avisado em cima da hora. Naquele dia, a prefeitura já havia comunicado o governo federal de que havia o risco de que as chuvas intensas daqueles dias provocassem uma cheia nos rios que circundam a cidade e que isso pudesse afetar os bairros Mato Grande e Harmonia, áreas desprotegidas de diques. Nem de longe se compara essa expectativa, ruim por si mesma, com a catástrofe ocorrida na madrugada de 4 de maio, quando houveram dois rompimentos de dique – um no Fátima/Rio Branco e outro no Mathias Velho, enchendo todo o lado Oeste de Canoas com cerca de 100 bilhões de metros cúbicos de água barrenta.
Vale lembrar que a prefeitura tinha em mãos, naquele 2 de maio, o alerta emitido pelo INMET em 27 de abril prevendo chuvas entre 150 e 200mm nos 5 dias seguintes; choveu 417mm – praticamente três vezes mais do que o mínimo que constava no aviso. O alerta foi compartilhado na conversa com os vereadores. Não houve nenhum pedido para que a informação não fosse divulgada, só para que se evitasse o pânico entre a população e a atenção aos avisos oficiais.
A fala do prefeito foi confirmada pelo blog com pelo menos seis vereadores — dois deles da oposição, inclusive.
Ao blog, o prefeito disse que a reunião com os vereadores aconteceu exatamente para que todos tivessem ciência do que estava por vir, mesmo que ninguém, aquela altura, esperasse a menor fração do que houve depois.
Enxurrada de fake news
E não foi só a enchente. Canoas viveu um momento de extrema turbulência com uma enxurrada de fake news naquele momento. Os alertas para evacuação de bairros da cidade, que começaram a ser divulgados pela prefeitura exatamente no dia 3, foram recebidos com certo ceticismo por circularem entre versões desencontradas e disseminadas por fontes duvidosas e sem amparo oficial. Muita gente que ficou na área alagada acabou acreditando no ‘zap do tio’ e não nos avisos do governo. Não as culpo; ninguém estava preparado para lidar com uma situação tão extrema como aquela.
Quando Márcio se refere à reunião do dia 2 e diz que ‘a prefeitura sabia’, olhando em retrospectiva, fica a impressão de que houve a intensão deliberada de deixar a cidade alagar. E isso, absolutamente, não houve. A verdade precisa ser dita – Márcio me entenderá e sabe que, se fosse com ele, adotaria a mesma postura que adoto agora, sem transigência.
Pandemia também teve ‘derrapada’
Na pandemia de Covid-19, um representante do Fórum das Entidades, indignado com a decisão do então prefeito Luiz Carlos Busato de decretar o fechamento do comércio, sugeriu que o prefeito fechasse a prefeitura e cortasse o próprio salário para dar o exemplo. Reputei, à época em coluna no Diário de Canoas, que foi uma ‘derrapada’ do tal dirigente. Simbolicamente, entedia a ideia, mas não seria com o retalho do salário do prefeito que Canoas enfrentaria uma pandemia com a que tirou 700 mil vidas brasileiras antes da vacina.
A fala de Márcio Freitas me lembra o episódio de 2020, na pandemia. Márcio derrapou nessa como o dirigente empresarial derrapou lá atrás. Entendo a crítica ao comando de Jairo, o que justifica inclusive a própria candidatura de Márcio, mas não dá para imputar ao prefeito o conhecimento antecipado da tragédia para ganhar o like do dia.
Márcio poderia recuar nesse discurso.
ATUALIZAÇÃO – Quando esta reportagem foi postada, informamos que apenas dois vereadores não haviam participado da reunião com o prefeito em 2 de maio. Na verdade, foram três: Airton Souza, Juares Hoy e Jonas Dalagna. O texto já foi corrigido.