Em sessão marcada por tentativa de ganhar tempo e, depois, pela urgência na votação de requerimento, Nedy salvou o mandato sem dizer uma única palavra em sua própria defesa
Nedy de Vargas Marques não passará à História como o primeiro vice-prefeito cassado em Canoas.
Em sessão de julgamento que durou cerca de sete horas nesta quinta-feira, 6, o vice salvou o mandato com uma articulação em torno de um requerimento apresentado por volta das 16h40 pelo vereador Márcio Freitas (Avante), até então tido como um voto ‘no muro’ por dar sinais de que estava hora de um lado, hora de outro no processo que poderia ter levado à cassação de Nedy. Sem precisar pronunciar uma única palavra na tribuna em sua defesa, Nedy segue vice e frustra a tentativa do grupo majoritário da política canoense em vê-lo longe do paço antes do final do mandato, em dezembro do ano que vem.
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Pela manhã, a impressão que se tinha era que a votação poderia chegar a 18 a 3 a favor do impeachment. Nessa conta, 14 votos era dados como ‘certos’, sem chance de mudança. Haviam 3 ‘no muro’ – além de Márcio, Leandrinho (PSD) e Adriano Agitasamba (PL) – e 3 francamente contrários, quais sejam, Cézar Mossini (MDB), Juares Hoy (PTB) e Abmael (Solidariedade). Maria Eunice, do PT, deu a senha de que a maioria poderia não se consolidar ao longo do dia: em sua primeira intervenção, logo nos primeiro minutos da sessão, pediu o adiamento do julgamento para garantir a presença do advogado de defesa, Rodrigo Schmitt, que havia dito ter um compromisso às 14h no Fórum de Canoas.
Com ela no muro, a vantagem ainda era da cassação: 14 a 3 e 4 ‘indecisos’.
Tentando ganhar tempo, a defesa insistiu na autorização para exibir vídeos das oitivas e os vereadores contrários à cassação, especialmente, foram além: queriam a leitura das quase 6 mil páginas produzidas pela Comissão Processante. Nada disso foi necessário; bastou que se derrubasse o muro para garantir a vitória.
Explico.
A matemática política que explica o 18 a 3 é a mesma que dá a vitória a Nedy. Ao longo da semana, alguns dos vereadores que estavam dispostos a votar pela cassação disseram ao blog que ‘iriam com a maioria’. Era o ‘efeito manada’: para onde a balança pendesse, também penderiam. Quando em algum momento entre o meio-dia e as 16h Nedy convenceu os vereadores da ‘manada’ que tinha os 7 votos que somavam os ‘do muro’ com os contrários ao impeachment, fez acender a luz de alerta na articulação pró-cassação.
Daí, bastou que Márcio Freitas entrasse no plenário com o requerimento pedindo o arquivamento do processo para a ‘manada’, disposta à cassar, mudasse de lado. Não foi de um minuto para o outro, nem se sabia com antecedência o que iria acontecer. Aposta de Nedy ficou clara quando, no retorno de um recesso, faltando 4 minutos para as 16h, Rodrigo Schmitt pediu ao presidente Cris Moraes (PV) para dispensar a leitura dos documentos pelos quais havia sido perdida mais de uma hora de discussão na manhã. Era a senha que deixaria a política ouriçada sobre o ‘jogo virado’ que Nedy tinha na mão.
Após a consulta ao plenário, Cris dispensou a leitura antes que se chegasse ao relatório final da Processante e a defesa final entregue por Nedy, por escrito, na semana passada. Um novo recesso, de mais de meia hora, antecedeu o que era para ser o momento de manifestação dos vereadores, mas acabou se tornando a pá de cal sobre o impeachment: a apresentação do requerimento de Márcio Freitas.
O documento foi assinado por oito vereadores: Márcio, Abamel, Mossini, Eric Douglas (PTB), Gilson Oliveira (Avante), Juares, Leandrinho e Adriano Agitasamba. A denúncia não teria como alcançar mais os 14 necessários à cassação e naufragava à vista de todos. Maria Eunice (PT) e Jurandir Maciel (PTB) terminaram de selar o destino do processo ao apresentarem apoio ao requerimento no microfone do plenário, minutos depois. Com 10 ‘em campo’, Nedy tinha virado o jogo: do outro lado, restavam outros 10 uma vez que Airton Souza (MDB) se encontra em viagem para visitar um parente hospitalizado.
Exatos seis minutos após a leitura que Márcio fez sobre o requerimento, após um novo recesso, o presidente da Câmara Cris Moraes encerrava os trabalhos determinando o arquivamento da denúncia contra Nedy. Mandato salvo, o ‘homem dos 500 júris’, famoso pela qualidade de tribuno e orador, derrubou um impeachment sem dizer uma única palavra.
Quando o mundo não gira, capota.