3º NEURÔNIO

Conto os dias para ver Bolsonaro derrotado

Recomendamos o artigo do jornalista, professor e escritor Juremir Machado da Silva, publicado pelo Matinal Jornalismo


Eu conto os dias para ver Jair Bolsonaro derrotado por uma centena de razões. Em primeiríssimo lugar, ele não é um presidente como os outros que o antecederam depois da redemocratização. Ao contrário de Fernando Henrique Cardoso, Lula, Dilma Rousseff, e até do destituído Fernando Collor, Bolsonaro não joga dentro “das quatro linhas da Constituição”. Um presidente não é um mero gestor. Boa parte do seu trabalho consiste em representação, símbolo, liturgia e decoro. O ex-capitão, como expressão da extrema direita, tem mais a ver com o imaginário da ditadura militar. Não quer representar o todo, não se coloca como símbolo da nação, não respeita a liturgia do cargo, ignora o que seja decoro, comporta-se o tempo todo como chefe de clã.

Eu conto os dias para ver Jair Bolsonaro derrotado por não suportar suas tiradas racistas, suas declarações machistas, sua homofobia explícita e seu obscurantismo permanente. Um presidente não pode ser misógino, racista, homofóbico, machista e xenófobo. São tantas as frases de Bolsonaro que permitem rotulá-lo de tudo isso, que ele diz não ser, que não vale a pena ser redundante. Não são apenas frases, brincadeiras, provocações, um jeito de falar. Nada disso. É um modo de ser, de existir, de pensar e de sentir que se revela quando Bolsonaro se deixa levar por sua índole, por sua “natureza”, por sua formação e derrama-se em violências simbólicas intoleráveis.

Só três motivos podem ter levado a maioria dos eleitores brasileiros a preferir Bolsonaro em 2018: o antipetismo radical estimulado pela mídia e pela operação Lava Jato, o desencanto com a política por causa da corrupção e o cinismo do mercado e de parte das elites. Havia, contudo, alternativas, inclusive o tucano Geraldo Alckmin e o pedetista Ciro Gomes. Bolsonaro, porém, encarnava um modo de ser com o qual muitos se identificavam. Eu conto os dias para ver Jair Bolsonaro derrotado por continuar acreditando em democracia, liberdade de expressão, responsabilidade, honestidade intelectual, justiça e num mundo melhor. Um presidente precisa ter a grandeza de não se acomodar na pequenez dos seus erros. Também lhe cabe sair da sua bolha para enxergar o todo. Eleito por uma parte, deve buscar ir além dela, refletindo uma época, ampliando horizontes, voando.

Eu conto os dias para ver Jair Bolsonaro derrotado por não crer em cidadãos armados como melhor forma de defesa contra o crime, por entender que o Brasil precisa se empenhar na preservação da Amazônia e no respeito às terras indígenas, por achar que o Estado deve servir para melhorar a vida dos vulneráveis e por acreditar em cultura, ciência, vacinas e no conhecimento construído e acumulado graças ao emprego da razão ao longo dos séculos. Enfim, tantas coisas tão simples, tão caras, tão evidentes, tantas coisas que em algum momento, em algum grau, já tivemos e não podíamos ter perdido. Eu conto os dias para ver Jair Bolsonaro derrotado por estar cansado de ouvir o presidente da República, a maior autoridade da nação, como se fosse normal, banal, aceitável, moderno, bacana, falar tanta merda.

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