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DO LIXO AO LUXO | Como anda nossa coleta seletiva

Carlinhos, Ivanir e Patrícia Alba, na sede da Cootracar que fica na área do antigo Aterro Sanitário Santa Tecla, destacam a importância da coleta seletiva

Há 28 anos a escola de samba Beija-Flor de Nilópolis chamou a atenção do país e da parte do mundo preocupada com o meio ambiente e o futuro do planeta ao levar para a passarela do samba, no Rio de Janeiro, o tema "Ratos e urubus, larguem a minha fantasia", idealizada por ninguém menos que o imortal de Joãosinho Trinta, carnavalesco falecido em 2011.

Foi em 1989 que a escola apresentou o tema na Sapucaí, inclusive criando polêmica com a imagem de Cristo de braços abertos, contestada pela igreja católica e mesmo assim levada à avenida em carro alegórico coberto de preto e com a frase “Mesmo proibido, olhai por nós”, em meio a uma ala de mendigos.

Não deu para a Beija-Flor de Nilópolis, que ficou com o segundo lugar. Nem foi um start para o movimento ecológico que já andava a passos largos na luta pela despoluição dos recursos hídricos – rios e mares, principalmente –, proteção das matas e menos poluição do ar que respiramos.

Mas pode ter ajudado bastante na popularização de um tema que ainda engatinhava e que, hoje, cada vez mais é bandeira de movimentos sociais organizados: a coleta seletiva e a destinação correta dos resíduos como forma de ajudar a natureza, dar ocupação às pessoas e gerar renda à parcela da sociedade, geralmente pessoas à margem do mercado de trabalho.

 

E aqui, em Gravataí

 

Em Gravataí, desde o ano 2000, os catadores, carrinheiros e carroceiros viviam – e vivem! – daquilo que para quase a totalidade das pessoas é lixo, amparadas pela Associação dos Trabalhadores, Carroceiros e Carrinheiros, a Atracar. Desde 2009 existe outra entidade, a Cooperativa de Trabalhadores Carroceiros e Catadores de Materiais Recicláveis, Industrialização e Comercialização (Cootracar).

A sede fica em um local bastante sugestivo e, até não muitos anos decorridos, motivo de brigas constantes entre ambientalistas e autoridades municipais, o ex-Aterro Sanitário Santa Tecla. O lugar, hoje, já não recebe mais detritos, está em franca recuperação, mas ainda expele – de forma controlada – uma quantidade enorme de gás metano. E atrai urubus, mas em bem menor quantidade.

O Seguinte: foi conhecer a Cootracar e o trabalho que é realizado lá.

Quem nos recebeu foi uma engajadíssima Ivanir Alves dos Santos, moradora de Gravataí há cerca de 20 anos.
Engajada, como assim?

Ivanir é funcionária da Fundação Luterana de Diaconia (FLD), uma Organização Não-Governamental (ONG) religiosa de Porto Alegre, controlada pela Igreja Evangélica de Confissão Luterana do Brasil (IECLB). Como tal, trabalha na Rede de Coleta Seletiva Solidária Vale do Gravataí, que abrange além da aldeia dos anjos as cidades de Sapucaia do Sul e Viamão.

E, como tal de novo, já que a Cootracar faz parte, Ivanir está ligada ao Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR).

Deu para entender porque Ivanir entende de tudo (com  o perdão da redundância!) do movimento, da reciclagem, da destinação correta de resíduos?

 

: Ivanir dos Santos é uma engajada trabalhadora nas entidades e movimentos de coleta seletiva

 

Trabalho e renda

 

A Cootracar tem atualmente 58 pessoas diretamente ligadas à entidade, os chamados cooperados, mas gera trabalho e renda para mais de 130 pessoas, aí contabilizados os carroceiros e carrinheiros, além daquelas que estão ligadas à coleta seletiva como motoristas dos caminhões e coletores.

O serviço atinge ainda no começo deste mês aproximadamente 70% dos domicílios de Gravataí. Por determinação do prefeito Marco Alba (PMDB) e com apoio da primeira-dama Patrícia Bazotti Alba, vai atingir até o final de setembro 100% dos domicílios  gravataienses.

Recentemente, também por uma ação da administração, ganhou um transformador de energia e, agora, tem capacidade para movimentar um equipamento sofisticado que faz a extrusão, principalmente de materiais plásticos. Ou seja: transforma todo tipo de plástico que chega, depois da separação, em matéria prima para a indústria. É plástico que vai voltar para nossa casa nas mais diversas formas.

 

Os ecopontos

 

De acordo com Ivanir, apoiada por Carlos Alberto dos Santos Jorge, o Carlinhos, de 30 anos, coordenador de Logística da cooperativa, estão sendo assumidos e vão ser melhorados e criados novos ecopontos em Gravataí, locais nos quais as pessoas podem descartar objetos que já não lhes servem mais ou os detritos do dia a dia, devidamente separados em orgânico e inorgânico (papéis, papelões, latas, alumínios, plásticos).

A ideia é que Gravataí tenha, a médio prazo, pelo menos oito destes ecopontos com localização estratégica e planejado de forma a serem aceitos pela comunidade da vizinhança, para recebimento dos recicláveis, também chamados de lixo seco.

— Ninguém quer ter no lado de casa um depósito de lixo, ou um local onde os detritos são depositados sem critério, provocando mau cheiro e proliferação de insetos. Por isso queremos que seja algo bem feito, com caçambas ou containers e recolhimento programado, com datas certas, para que ao invés de incomodar seja ponto de referência para a população do bairro ou da região – diz Carlinhos.

 

: Carlinhos, coordenador de Logística da Cootracar, fala em melhorar e ampliar os ecopontos.

 

Mais conscientização

 

A Cootracar recebe, atualmente, entre 120 e 130 toneladas por mês de material dito reciclável. Dito porque, na verdade, nem tudo é reaproveitável. Do volume recebido, consegue separar e organizar e vender aproximadamente entre 70 e 80 toneladas. Muito pouco vai diretamente para a indústria e grande parte tem a intermediação dos atravessadores, o que reduz o dinheiro a ser rateado entre cooperados e a ser pago aos trabalhadores da cooperativa.

O que não é aproveitado, o rejeito, vai para a estação de transbordo – ponto onde ainda podem ser vistos os remanescentes urubus, tão comuns nos tempos do lixão a céu aberto do aterro Santa Tecla – e, dali, para o município de Minas do Leão. Mas nem tudo são flores. Se houvesse mais conscientização, a realidade da Cootracar seria bem melhor, o governo municipal gastaria bem menos e o meio ambiente bateria palmas.

É que Gravataí manda para Minas do Leão cerca de – pasme, leitor! – 200 toneladas por dia de detritos. Lixo seco e orgânico. A Cootracar operacionaliza apenas, tão somente, 130 toneladas por mês. Notou a diferença? São 200 toneladas por dia para Minas do leão, e 120/130 toneladas por mês – por mês! – que entram na Cootracar.

 

HOJE, COM A TRITURAÇÃO E PRENSA MECANIZADA QUE A COOTRACAR UTILIZA, É POSSÍVEL PROCESSAR EM APENAS TRÊS DIAS O QUE, ANTES, DEMORAVA 30 DIAS PARA SER FEITO.

 

Primeira-dama

 

— Tem muito para ser feito em termos de conscientização — admite a primeira-dama de Gravataí, Patrícia Bazotti Alba. É no gabinete dela que são idealizadas as campanhas e coordenadas as atividades e desenvolvidos programas para que cada vez mais a separação do lixo dentro das moradias se torne uma prática comum, um hábito cotidiano.

E para que cada vez mais a coleta seletiva seja reconhecida pela comunidade, e utilizada pelas pessoas, como forma de dar destinação correta às latas, plásticos, papel e todo material que pode ser reciclado e reutilizado pela indústria em benefício da economia e do meio ambiente.

— Uma das nossas ações é a realização de visitação orientada com os alunos da rede escolar aos galpões da Cootracar — diz a primeira-dama.

Segundo ela, as crianças têm uma elevada capacidade de assimilação e um potencial muito grande de transmissão do conhecimento, principalmente entre pais e amigos, sendo capaz de fazer mudar os hábitos da família.

E Patrícia decreta:

— A coleta seletiva pode ser muito melhor trabalhada. É uma atividade que gera ocupação e renda às pessoas diretamente envolvidas, reduz custos à sociedade, para a indústria e aos governos que vão gastar menos com o encaminhamento do lixo aos aterros, limpa a cidade com maior agilidade e eficiência e colabora de uma maneira significativa para a preservação ambiental.

Ivanir dos Santos, a engajada lá do início desta matéria, destaca:

— Há uma dificuldade muito grande em fazer as pessoas entender a diferença entre o que é lixo e o que é material reciclável. De uma forma geral, tudo é lixo, mas não é bem assim. Por isso é que precisamos trabalhar para que as pessoas compreendam o que é uma e outra coisa — diz Ivanir.

 

: Patrícia Bazotti Alba coordena ações para conscientização da importância da coleta seletiva

 

Estrutura

 

Além, da estrutura para recebimento do que chega à sede da cooperativa na forma de coleta seletiva realizada em 70% da cidade, a Cootracar tem energia para pagar, combustível, manutenção de caminhões recebidos através de projetos e convênios – como os que são mantidos com a Petrobras – e outros gastos.

O dinheiro vem do que é vendido do material que recicla, e da verba que recebe, por exemplo, de aproximadamente R$ 130 mil mensais, da Prefeitura de Gravataí.

— Esse valor é para a manutenção dos veículos, dos prédios, maquinários e custeio da coleta — diz Patrícia.

Da venda do material reciclado sobra cerca de R$ 30 mil, em média, dinheiro que se destina às 17 pessoas que trabalham na esteira de separação de resíduos. Cada uma delas separa dois tipos de material que pode ser, por exemplo, o plástico branco, o colorido, papel e papelão, entre tantos outros.

No local, sede da Cootracar, uma minúscula sala serve para descaracterização de eletrônicos. É onde os aparelhos são desmontados. O que é plástico tem um destino, o cobre vai para outro depósito, e os componentes mais sofisticados ficam em outro tonel, de onde serão encaminhados às empresas especializadas.

 

O VÍDEO

 

Assista, no vídeo abaixo, um pouco do que o Seguinte: conheceu na sede da Cootracar.

 

Uma casa

 

A dona de casa Noreci Maria da Silva está há quatro anos trabalhando na esteira de separação de detritos da Cootracar. Ela é natural de Alvorada mas há 40 anos mora no bairro Antônio Carlos Jobim. Casada, é mãe de três meninas e ex-catadora de material reciclável nas ruas. Aquele pessoal que a gente vê com sacfos de latinhas, carrinhos cheios de papelão, pelas ruas da cidade.

Esse dinheiro ajudo, dona Noreci?

— Claro que ajuda. E muito. Isso ajuda nas despesas e já usei até para fazer minha casa nova — conta Noreci, destacando que o trabalho dela e dos colegas cooperados são importantes para o meio ambiente.

— A natureza agradece — diz.

 

Clique na imagem e ouça o samba da Beija-Flor "Ratos e urubus, larguem a minha fantasia" A letra está abaixo.


 

Reluziu… É ouro ou lata

Formou a grande confusão

Qual areia na farofa

É o luxo e a pobreza

No meu mundo de ilusão

 

Xepa de lá pra cá xepei

Sou na vida um mendigo

da folia eu sou rei

 

Sai do lixo a pobreza

Euforia que consome

Se ficar o rato pega

Se cair urubu come

 

Vibra meu povo

Embala o corpo

A loucura é geral

Larguem minha fantasia

Que agonia… Deixem-me

Mostrar meu carnaval

 

Firme… Belo perfil!

Alegria e manifestação

Eis a Beija-flor tão linda

Derramando na avenida

Frutos de uma imaginação

 

Leba – laro – ô ô ô ô

Ebó lebará – laiá – laiá – ô

 

Reluziu…

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