Mesmo quando se sentava diante do computador para procurar na Internet um livro que realmente queria muito, logo um novo interesse tirava Lara de seu propósito. Depois voltava, às vezes na outra semana, quando já era tarde e precisava comprar a obra na livraria mais próxima.
Dizia pra si mesma que tudo bem agir assim e dali em diante seria diferente, mas no mesmo dia, no trabalho, mais uma vez anotou num post-it que amanhã, sem falta, concluiria a pesquisa que já adiara há uma semana.
O prazo de entrega? Outro amanhã!
Pro-cras-tina-dora! Ela mesma dizia com olhar de xingamento na frente do espelho. Odiava se sentir incapaz de realizar tudo o que queria, quando queria. Um hábito terrível de procrastinar tudo; desde visitar os pais até sair com os amigos, de fazer compras pra casa e entregar as traduções francês-português que garantiam o pagamento das contas.
Convivia há 28 anos com esse jeito de fazer as coisas e achava doentio. Leu certa vez que o nome do flagelo que carregava vinha do Latim pro (à frente) e cras (amanhã) e, no seu contexto de vida, tudo ia para qualquer dia depois do hoje.
Tentou colocar em prática todas as dicas que o Google apresentou sobre “como vencer a procrastinação”. Fez listas de tarefas partindo das mais fáceis até as mais difíceis; colocou lembretes pela casa e pelo escritório; criou uma escala de recompensas para si mesma, referente a cada projeto concluído; compartilhou nas redes sociais os compromissos esperando se sentir comprometida em oferecer o resultado a mais alguém que não apenas ela!
Deu certo. Por exatos oito dias deu certo.
Porém, logo a seguir, lá foi ela arcar com os cuidados do gato da amiga que viajou e deixou para depois a conclusão de uma apresentação que seria exibida a clientes em potencial da editora onde trabalhava. Foi o fim. Mas aquilo era importante demais e ela virou a noite trabalhando, emendou as horas iniciais da manhã seguinte até que conseguiu o melhor resultado possível naquele tempo tão escasso.
E enquanto era cumprimentada pela clareza de suas observações expostas em cada slide, a angústia e a culpa de ter deixado para a última hora algo que teve semanas para executar desapareceram. No lugar, veio o calor de um abraço amoroso, do tipo que aparece quando perdoamos a nós mesmos e Lara percebeu que deixar para a última hora não era um defeito, mas a forma como ela conseguia fazer muito bem o que precisava ser feito, sem afetações ou floreios demasiados. Enxuto, preciso e caótico, mas suficientemente eficaz.
E no dia seguinte ela se recostou na cadeira com ainda mais projetos por realizar, mas satisfeita por saber que não era mais empurrar com a barriga, enrolar, pospor, protrair, retardar, lerdear, moenar e muito menos vagabundear.
Era apenas o seu jeito de fazer tudo, no tempo que conhecia.
O seu tempo.