Na China, o prefeito de Cachoeirinha está no lugar certo, na hora certa.
Reputo há desconhecimento do jeito chinês de fazer negócios — e provincianismo — nas críticas de políticos e jornalistas à missão internacional de Cristian Wasem (MDB) a Pequim para apresentar o município a potenciais investidores chineses e consolidar um financiamento de meio bilhão que pode transformar a cidade.
Nesta quinta-feira, ao lado do secretário do Planejamento Paulo Garcia, a agenda do prefeito registra palestra no painel Construindo Cidades Resilientes ao Clima, em evento do Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura (AIIB), que vai financiar US$ 78 milhões (cerca de R$ 500 milhões) no programa Cachoeirinha 2050.
Alguns críticos consideram a viagem a China turismo institucional e, os mais oportunistas, já usaram até a ausência durante o pico da enchente para condenar Cristian –– e começo por isso.
O prefeito andou pelas madrugadas e fez posts nas casas de bombas acompanhando os alagamentos na segunda e terça passada antes de embarcar para as mais de 24 horas de viagem.
O que nem considero seja uma obrigação.
Será mesmo função de um prefeito enfrentar alagamentos com as botas nos pés ou com a caneta na mão? Coordenar, decidir, planejar e articular — inclusive fora do país — também faz parte da gestão.
Na véspera de cruzar o oceano, também anunciou licitação de R$ 20 milhões que busca resolver um dos tantos problemas históricos em um município que alaga a cada evento climático, não necessariamente extremo.
Então, parece-me oportunismo criticar a ausência do governante.
Mas o principal não resta aí.
O que se revela preocupante nas críticas é o desconhecimento do modelo chinês de relações institucionais e comerciais. Negociar na China é diferente. A cultura de negócios chinesa é profundamente marcada pelo conceito de guanxi — uma rede de conexões e laços de confiança pessoal que, segundo a Harvard Law School ensina aos ocidentais, está no centro da forma como os chineses fazem parcerias duradouras.
E esse tipo de relação, que guarda íntima relação com o confucionismo, a filosofia que inspira a sociedade chinesa, não se constrói apenas por e-mail ou videoconferência a 18 mil quilômetros de um nǐ hǎo.
Exige presença, respeito cultural e, principalmente, vontade política de “passar o portão”, como simboliza a própria palavra guanxi.
Ao optar por ir a Pequim, Cristian não ignora a cidade e seu despreparo para as enchentes — pelo contrário, tenta buscar soluções ao posicioná-la no mapa de interesse do maior parceiro comercial do Brasil.
Para efeitos de comparação, as tratativas envolvem um financiamento internacional cujo valor representa o dobro dos empréstimos que transformaram a vizinha Gravataí nos últimos oito anos.
Fato é que Cristian é evangélico, de centro-direita e, ainda assim, ignorou eventuais muralhas ideológicas para fortalecer laços com a China.
– Quero fazer de Cachoeirinha uma das cidades brasileiras mais próximas da China – disse o prefeito, ao anunciar na segunda-feira ao Seguinte: o investimento de R$ 1 bilhão da Tellescom, em parceria com companhia asiática, em uma fábrica de semicondutores no município.
Essa abertura ao diálogo e ao pragmatismo é característica que diferencia líderes que enxergam além das fronteiras e das ideologias; não é proibido ou feio reconhecer — a menos não para mim, mesmo já tendo feito um dilúvio de críticas a políticas de Cristian e do governo.
Ruim seria se estivesse em bunkers ideológicos, ou mesmo reais, como aqueles prefeitos brasileiros em Israel, doutrinados a aceitar que a vida de 20 crianças vale a morte de um terrorista do Hamas.
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Ao fim, goste-se ou não do sistema político chinês, é inegável que o país é uma potência mundial. O AIIB, banco multilateral com forte influência chinesa, é uma fonte crucial de financiamento para infraestrutura de resiliência. Se há um momento para um prefeito brasileiro estar em Pequim, batendo na porta das instituições e construindo guanxi, esse momento é agora.
Cristian Wasem, neste caso, está no lugar certo, na hora certa. É desinformação, má vontade, ou provincianismo mesmo, não reconhecer.
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