RAFAEL MARTINELLI

O frango histórico de Zucco com a bandeira Trump/MAGA ao fundo; o patriotismo invertido

Foto Edilson Rodrigues/Agência Senado

A anedota do goleiro frangueiro –– em que o técnico até admite que toda bola no gol seja gol, mas apela ao arqueiro para não desviar para dentro as bolas que iriam para fora – ganhou sua foto na política gaúcha.

Luciano Zucco (PL), pré-candidato a governador do Rio Grande do Sul pelo bolsonarismo, protagonizou na terça-feira um daqueles Grandes Lances dos Piores Momentos: em meio a deputados federais da oposição, uma bandeira com o nome “TRUMP” e o slogan “Make America Great Again” serviu de pano de fundo para ato em que participava na Câmara Federal em defesa de Jair Bolsonaro.

A imagem, que ganhou capa de Zero Hora, viralizou como símbolo de uma subserviência que fere o orgulho gaúcho e os interesses econômicos do estado.

O Rio Grande do Sul é o segundo estado mais prejudicado pelo tarifaço de 50% que Donald Trump ameaça impor aos produtos brasileiros, com perdas estimadas em R$ 1,9 bilhão, segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI).

Para usar um exemplo de Gravataí, onde Zucco foi o quarto mais votado em 2022 com 6.576 votos, empresas como a Prometeon –– que tem os EUA como principal cliente de pneus –– estão no caminho do atropelo pela sanção com base na premissa mentirosa de que os EUA teriam prejuízo comercial com o Brasil. A GM mundial, sem detalhar a operação gravataiense e brasileira, projeta redução de lucro em US$ 5 bilhões por conta de tarifas de Trump mundo afora.

A reação ao erguimento do estandarte do autor do tarifaço foi imediata e devastadora.

Nas redes sociais, 77% das menções foram críticas, com 28% classificando o ato como “traição à pátria” e 24% como “submissão ideológica a Trump”, de acordo com levantamento do analista de redes Pedro Barciela para o ICL Notícias.

No plenário, parlamentares como Domingos Sávio (PL-MG) exigiram a retirada da bandeira, antevendo o desastre político.

Zucco tentou se desvencilhar: alegou ignorância sobre a bandeira e disse ter ordenado sua remoção.

– É uma injustiça o que estão fazendo comigo. Era uma reunião com mais de 120 pessoas. Não tinha como controlar tudo – disse, à colunista Rosane Oliveira, de GZH.

Reputo a defesa soou tão frágil quanto a do goleiro que desvia bolas inofensivas para dentro do gol.

O patriotismo invertido e a aliança suicida

O episódio escancara uma contradição com potencial fatal para o ‘bolsonarismo-raiz’: o patriotismo invertido que substitui o verde-amarelo pelo vermelho do MAGA.

Enquanto Lula pede que o povo “reivindique a bandeira brasileira”, setores da oposição adotam símbolos de um governo que causa danos econômicos diretos ao Brasil, com tarifas que Trump explicitamente vinculou ao processo contra Bolsonaro e ataca a soberania nacional, como no cancelamento de vistos de ministros do STF (medida que a Transparência Internacional considerou “sem fundamentos legais”).

Eduardo Bolsonaro, articulador dessa política a partir dos EUA com recursos do pai, celebra as sanções como uma vitória. Zucco, por sua vez, tenta equilibrar-se na corda bamba: condena o tarifaço, mas repete o mantra bolsonarista de que a culpa é do “governo Lula, que não sabe negociar”.

Fato é que, ao associar-se, mesmo que involuntariamente, a uma imagem de apoio a Trump, e principalmente por ser militar, força que deveria ajudar a garantir a soberania nacional, Zucco inevitavelmente experimenta os danos colaterais de uma, até pouco tempo, improvável rejeição nas redes antissociais –– cujo algoritmo ‘simpatiza’ com a extrema direita.

Se 77% das menções são críticas, termos como “Mama Americanos Again” e “patriotários” sugerem que o gesto cristalizou a percepção de uma elite desconectada do povo.

Resta a imagem, mesmo com legenda explicativa, fotografando que, enquanto o RS teme o desemprego, políticos celebram o causador da crise.

A bandeira alheia como mortalha

A pergunta que resta não é se Zucco cometeu um frango, mas se o bolsonarismo consegue sobreviver a sua própria simbologia tóxica.

Se a bandeira do MAGA já causa vergonha até em aliados, e constrangimento a ele próprio, quanto tempo levará para que os próprios símbolos bolsonaristas –– do gesto de arma ao boné verde-amarelo –– sejam rejeitados como emblemas de uma aliança antinacional?

O goleiro Zucco não apenas desviou para dentro uma bola que iria para fora: atirou contra o próprio gol. No campo geopolítico onde o RS joga seu futuro econômico, esse frango pode custar mais que R$ 1,9 bilhão –– pode custar a alma política de quem jurou defender o estado.

Ao fim, não dá para esquecer de lembrar que ano passado Zucco foi testemunha primária de operação da PF na casa dos Bolsonaro em Angra, ao voltar de passeio de jet ski com Carlos Bolsonaro. Com amigos assim, nem o Manga…

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