Era um dia frio e luminoso de abril, e os relógios marcavam 13 horas.
A abertura de “1984”, de George Orwell, poderia incluir o Rio Grande do Sul junto a Oceânia, Eurásia e Lestásia, no mundo distópico do romance que está entre os mais citados do século 20.
Na tarde desta terça de abril, o liberal Eduardo Leite (PSDB) vai usar de novilíngua para transformar a bandeira preta em vermelha para, como bem descreveu a presidente do sindicato dos professores de Gravataí, Vitalina Gonçalves, “sambar na cara da Justiça” e permitir a volta às aulas presenciais.
O governador tomou a decisão após 'reunião de emergência', por videoconferência, com o presidente da Assembleia, Gabriel Souza, o presidente da Famurs, Maneco Hassen, e o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo.
Antecipei o início do fim do Distanciamento Controlado, sexta e sábado, em Leite vai brincar de colorir mapinha? Gravataí, Cachoeirinha e Grande Porto Alegre querem bandeira vermelha por decreto e A novilíngua de Leite: Gravataí e Cachoeirinha já tem data para volta às aulas presenciais; ’Governador samba na cara da Justiça’.
Fato é que hoje será comunicado que todos os municípios gaúchos estarão em bandeira vermelha apenas três dias(!) após o mesmo governador anunciar a 51ª semana em bandeira preta, de altíssimo risco de contágio pela COVID-19 – e sem que indicadores recomendem o que será um ‘liberou geral’, já que prefeituras em cogestão, como as da Grande Porto Alegre, poderão aplicar regras da bandeira laranja.
Não esqueçamos de lembrar que laranja era a bandeira durante a eleição e o Carnaval, nos meses anteriores ao colapso na saúde de março, pior e mais letal mês da pandemia, onde em Gravataí, por exemplo, mais gente morreu do que nasceu, e detalhei em A virulência da COVID em Gravataí: O mês que teve mais mortes que nascimentos.
Domingo, o desembargador Antonio Vinicius Amaro da Silveira decidiu assim, ao manter liminarmente a suspensão das aulas, depois confirmada, na noite desta segunda-feira, por unanimidade pela 4ª Câmara do Tribunal de Justiça gaúcho:
– Não há como transigir com a vida ou com a morte. Vivemos um período notadamente de exceção, equiparável a um estado de guerra diante de um número tão elevado de mortes, o que requer medidas excepcionais com o intuito de preservar bem maior, o que não significa ignorar a existência de danos colaterais inevitáveis. Lamentavelmente essa é a realidade.
Então, a guerra acabou, governador?
Sim, a partir desta tarde, e por um decreto que caberia no orwelliano Ministério da Verdade, aquele que promovia a Mentira; assim como, no duplipensamento criado pela novilígua, o Ministério da Paz, fazia a guerra; o Ministério do Amor, cuidava da tortura; e o Ministério da Pujança, da escassez de alimentos.
Ao fim, incluamos na novilíngua o jeitinho gaudério. É o que faz o governador, ao acabar com a credibilidade do Distanciamento Controlado, que foi pioneiro no Brasil e respeitado por especialistas pelos critérios técnico-sanitários e, hoje, mais parece aquele meme de rede social em que Eduardo Leite brinca de colorir mapinhas.
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