O Seguinte: tem nova colunista! Vamos falar um pouco dela, e já publicar sua coluna de estréia.
Marcilene Forechi é uma jornalista capixaba que chegou a Gravataí em 2014. Veio de mala, cuia e família para fazer um doutorado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Passados cinco anos e concluído o doutorado, decidiu ficar. E uma vez aqui, decidiu que conheceria melhor as pessoas e a cidade que escolheu para viver.
Curiosa, interessada e habilidosa na arte de se comunicar, Marcilene Forechi é do tipo que faz amigos, que se interessa pelas histórias de gente comum, pelas sutilezas e riquezas que surgem em meio aos afazeres cotidianos. Ela costuma dizer que se pudesse escolher um verbo que a definisse, este seria prosear.
– Porque é assim que vivo e compreendo o mundo: a partir e com as palavras compartilhadas, que se transformam em vivências, experiências, emoções, histórias e inspirações.
Com uma formação multidisciplinar, Marcilene é do tipo que aprecia os pequenos eventos que se desenham nas brechas dos afazeres e compromissos cotidianos. E é sobre isso que ela fala e escreve. Suas áreas de interesse e estudos, além da comunicação e do jornalismo, abrangem a mídia, as redes sociais, o empreendedorismo feminino, a gestão e a produção cultural, a produção de conhecimento (autoconhecimento) e a felicidade.
Em quase 30 anos dedicados ao jornalismo e à vida acadêmica, já fez “muita coisa”. Foi repórter, editora, redatora, assessora de comunicação, professora universitária, consultora, pesquisadora, facilitadora em cursos livres e de atualização profissional.
Atualmente, é editora da Revista Sincor-ES, instituição sediada em Vitória (ES), há 15 anos, professora conteudista da Editora A, empresa de Porto Alegre especializada em produção de material didático, consultora e estrategista de comunicação, integrante do banco de palestrantes da Federasul, membro do Conselho de Política Cultural e do Conselho da Mulher de Gravataí e integrante do Núcleo de Negócios da Mulher Empreendedora AME da Acigra.
Siga abaixo a coluna de esteia da Marcilene, O que eu posso oferecer ao ano que começa?.
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Impossível escapar. Todo final do ano, chovem mensagens de todos os lados desejando que o novo ano nos traga desafios, saúde, paz, amor e tudo o mais que, acreditamos, pode tornar nossa vida melhor. Assim, como que guiados por um sentimento comum, compartilhado por todos os que iniciam esse novo ano, acreditamos que a partir desse marco zero – o dia primeiro de janeiro – teremos muito o que esperar e muito para realizar e para recomeçar.
Acreditamos, principalmente, que o novo ano, tal qual uma entidade autônoma e com poderes para tudo transformar e realizar, fará com que passemos por dias melhores. Impossível escapar também do espírito de férias, marcha-lenta que toma conta de tudo e de todos. Talvez, por conta do recesso escolar nos deixemos levar pela expectativa de que o tal ano novo que nos trará tudo de bom comece, de verdade, em fevereiro, ou março,preferencialmente depois do carnaval.
Difícil mesmo é escapar de uma reflexão sobre o significado do novo ano e do tempo que o aprisiona em 365 dias. Por que não tentar fazer melhor para o ano de 2020 em vez de esperar que ele nos traga algo melhor? Ao contrário dos que fazem planos para o novo ano e afirmam, categoricamente, que vão deixar para trás o que passou, proponho uma olhada sincera para o passado e para o ano que termina. E questiono o motivo pelo qual insistimos em jogá-lo no lixo, junto com calendários e agendas vencidas.
O aprisionamento do tempo e a ideia de que o ano que se inicia não carrega nada do que o velho nos levou nos dá a ilusão da ideia reconfortante de um recomeço que não existe. Um novo ano não nos traz nada, tampouco nos leva a lugar algum. O desejo de que algo mude e se transforme, esse sim, é capaz de nos impulsionar por novos caminhos. Pensando no ano que termina, pergunto sobre o que fiz, o que deixei de fazer e, principalmente, sobre os motivos que me levaram a fazer ou deixar para depois, “para o ano que vem”.
Questiono, a olhar o horizonte de 2020 despontar na minha frente, sobre o que me fez sentir orgulho, o que me angustiou, que sentimentos tive, que desejos alimentei, que sorrisos distribui, que sofrimentos causei. Talvez, tenha me faltado tempo para pensar sobre o sentido da vida, afinal, que sentido há pensar sobre isso se a vida corre desenfreada a caminho do trabalho, no engarrafamento, no shopping, no almoço corrido, na TV ligada em incontáveis capítulos de uma série que sempre deixa cenas imperdíveis para o próximo episódio.
Definitivamente, não espero nada de 2020. Nem conheço esse ano e sequer sei se irei simpatizar com ele. Tenho certeza apenas que ele não guarda segredos ou dispõe de poderes mágicos que possam me fazer tomar as decisões certas ou escolher os melhores caminhos. Os segredos e os poderes mágicos são guardados por cada um, de maneiras diferentes e, em momentos igualmente diferentes, se impõem para nos transformar, para nos afligir, para nos tornar melhores ou para nos mostrar as possibilidades de um caminho diferente.
Pensar no novo ano como a continuação do que termina e, principalmente, pensar sobre a interdependência de todos os fenômenos pode ser útil para fazermos algo por nós e pelos outros. Pensar o mundo como uma grande teia, cujas tramas estão além do que nossos olhos podem ver, pode ser útil para diminuirmos o ritmo da nossa respiração, para ouvirmos o vento, para observarmos as tantas cores e os diferentes sabores que a natureza nos oferece.
Desenvolver atitudes de compaixão e solidariedade pode ser não só uma promessa para o novo ano como um compromisso assumido. Por que não fazer um planejamento estratégico para nossa vida pessoal em 2020? Em vez das tradicionais listas do que quero fazer, posso planejar de forma mais elaborada o que preciso fazer e o que é prioritário fazer. Posso começar com uma mudança na forma como me relaciono com tudo o que me cerca. Qual a minha relação com roupas, comida e dinheiro, por exemplo? De que forma essa relação provoca reações nos outros e em mim mesmo a ponto de me trazer prazer ou sofrimento?
São perguntas aparentemente simples que, se bem avaliadas, exigem esforço para serem respondidas e podem levar a mudanças profundas no modo de ser e agir no mundo. Ao olhar um armário cheio de roupas que não são usadas há mais de um ano devo questionar o sentido que elas têm e o porquê de ainda continuarem a ocupar espaço na minha casa se não me servem mais. A felicidade surge quando somos capazes de compreender a natureza e a interdependência dos fenômenos que nos rodeiam. Se eles são produtores de bem-estar imediato e sofrimento no médio e longo (para mim e para os outros, ainda que não os conheça), então podemos ter certeza de que não valem a pena.
O ano de 2020 não será melhor ou pior de forma isolada ou independentemente. Ele será produto de nossas ações isoladas e, também, da dinâmica social, cultural, econômica e política à qual estamos submetidos. Não espero nada de 2020. Mas quero que ele receba o melhor de mim. Espero que pessoas melhores possam dar uma chance para esse ano que começa e que, com certeza, não terminará com uma grande queima de fogos no dia 31 de dezembro. Espero conseguir desaprisionar o tempo, nem que seja por alguns minutos do dia.