opinião

O que queria que a GM mostrasse ao prefeito; é dúvida de todos, acredito

Prefeito Marco Alba e procurador-geral Jean Torman chegando para videoconferência na GM na terça

Se já não leu, e ler no voo que faz logo mais a São Paulo as informações da reportagem do Estadão, que reproduzo após meu comentário, é possível ao prefeito Marco Alba prever o que lhe espera na reunião com executivos da General Motors.

Se no artigo Se precisar fechar, fecha, que publiquei sexta no Seguinte:, trouxe informações da Folha de S. Paulo onde essa sentença duríssima foi dada, em um encontro reservado com o alto escalão da montadora, por Carlos da Costa, secretário especial de Produtividade, Emprego e Competitividade do Ministério da Economia, agora é o Estado de S. Paulo que publica reportagem preocupante: “GM faz pressão por incentivos para investir – Empresa busca mais benefícios fiscais e cortes de salários para anunciar novo plano”.

As fontes, diferentemente da Folha, não são anônimas. São os prefeitos de São Caetano do Sul (Grande São Paulo), José Auricchio Jr., e de São José dos Campos (interior paulista), Felício Ramuth, onde a GM tem fábricas, e que como Marco Alba, já participaram de reuniões com a montadora e sindicalistas.

Antes de tudo é preciso observar que o caso paulista é diferente de Gravataí. Aqui é fabricado o Onix, líder de vendas no Brasil, e o Prisma, líder em seu segmento. O custo por funcionário (mesmo sem os cortes que a montadora propôs nesta segunda e foram rejeitados pelo Sindicato dos Metalúrgicos nesta terça) é muito menor que as outras GMs brasileiras – a participação em lucros e resultados, o famoso PLR que a cada ano alegra o chão da fábrica e mexe com as economias locais chega a R$ 20 mil por trabalhador em São Paulo e não passa de R$ 15 mil em Gravataí (projeção para 2019 definida pelo Sindicato dos Metalúrgicos). Fechar a fábrica em Gravataí certamente não está nos planos de curto prazo dos norte-americanos, e daí o otimismo de Marco Alba, que após participar nesta segunda de videoconferência com o presidente da GM Mercosul, Carlos Zarlenga, declarou não acreditar que a GM encerre suas atividades no município.

Porém, a notícia que se espera que o prefeito traga – seja boa, ou ruim, e aí será preciso replanejar pelo menos parte do futuro da cidade – é sobre a continuidade dos investimentos do ‘show do bilhão’ anunciado em 2017 para Gravataí. Para quem não acompanha, a fábrica local já é preparada (e, antes de estourar as notícias da crise da GM, funcionários comentavam sobre um lay off, uma parada temporária da produção, já em fevereiro, para adaptação da plataforma da fábrica) para montagem dos novos modelos, com os investimentos de R$ 1,4 bilhão, do total de R$ 13 bilhões anunciados para o Brasil.

Recapitulando, o sinal de alerta veio quando a presidente mundial da GM, Mary Barra, deu entrevista em Detroit, neste janeiro, informando sobre resultados ruins da operação na América do Sul. Dois dias depois, reproduções de email do presidente da GM no Mercosul, Carlos Zarlenga, foram coladas em murais na fábrica de Gravataí, o que motivou funcionários a enviarem fotos ao Seguinte:, que em reportagem de Silvestre Silva Santos levantou a polêmica sobre a possibilidade da montadora sair do Brasil – já que o comunicado dizia que os prejuízos no país não podiam se repetir e que 2019 seria um ano decisivo.

– Do sucesso do plano que estamos preparando dependem investimentos da GM e o nosso futuro – foi o aviso, tão sincero quanto o medo.

Depois disso, a GM apresentou um plano de ‘sacrifícios’ aos sindicalistas e prefeitos de cidades onde tem sedes em São Paulo. E também a Gravataí, onde 21 pontos foram apresentados, reduzindo ganhos de trabalhadores e concessionárias. Sobre a pressão por incentivos dos governos municipal, estadual e federal, nada foi divulgado ainda, em on ou off. Mas o comunicado e a pauta de arrocho salarial apresentada pela montadora – nada mais é que uma adequação de uma empresa que visa lucro a uma legislação que agora pode beneficiá-la, a chamada ‘reforma trabalhista’, aprovada ano passado – inegavelmente sinaliza que estão ameaçados não só os contracheques dos funcionários, mas o terceiro turno retomado em 2017, e que estava suspenso desde 2015, além do lançamento do novo modelo gravataiense para o segundo semestre de 2019.

Abri o artigo O blefe da GM; quem paga esse almoço sugerindo “menos pânico, mais realidade, nas especulações sobre um pinote da General Motors da América do Sul”. Sigo com a mesma interpretação: a GM não vai fechar em Gravataí, pelo menos nos próximos cinco ou dez anos. Os principais fatores: o carro produzido aqui é líder de vendas; após a saída da Europa, o fechamento de fábricas e a redução de vendas nos EUA e Canadá, seu maior mercado é a América do Sul; o custo por funcionários é menor e vai reduzir ainda mais, porque, mesmo que não seja posto em prática um plano tão draconiano como o proposto pela montadora, seus trabalhadores aceitarão perdas para manter os empregos; e, no capitalismo ‘risco zero’ que transnacionais buscam no Brasil, muito provavelmente a companhia ganhará incentivos – exemplo: em São Paulo a antecipação do ICMS pelo governo estadual já é dada como certa.

A grande expectativa e dúvida, que acredito assole Gravataí, é pela manutenção ou não do investimento no novo carro, que significará mais receita para os cofres de Gravataí, hoje abastecidos por 40% do ICMS oriundo da GM, R$ 70 milhões de arrecadação só em 2018. Porque um reflexo negativo parece muito provável: a perda de poder aquisitivo dos funcionários, que ao que tudo indica acordarão do sonho que até pouco tempo era trabalhar na GM. Isso, conteste quem puder, prejudica o comércio local, onde essa gente compra.

Mas o que me intriga, e deve provocar curiosidade aos que gostam mais de fatos, os chatos que atrapalham argumentos, é conhecer os balanços da GM. Na crise dos EUA, entre 2008 e 2012, as fábricas na América do Sul, entre elas Gravataí, seguraram os resultados até fazer efeito o socorro do governo Obama às montadoras – o que hoje, conforme a Folha de S. Paulo, causa estranheza a técnicos do governo de Jair Bolsonaro, onde o superministro da Economia Paulo Guedes, um liberal aparentemente desenfreado, cita sempre como três temas proibidos “subsídios, proteção e mais gasto público”.

E, vamos combinar, Mary Barra e Carlos Zarlenga, não a imprensa, instalaram o terror ao falar em prejuízos. A GM tem ações na Bolsa, apesar da sucursal brasileira ser de “capital limitado”, enquanto outras gigantes que negociam papéis oferecem uma maior visibilidade aos acionistas, e ganha incentivos polpudos. Para se instalar em Gravataí, a conta chegou perto de R$ 2 bi – ou uma fábrica de graça em renúncias fiscais e obras públicas (registre-se: quase nada dos cofres municipais).

Não seria justo a montadora mostrar essa conta que alega precisar dividir? O brasileiro é ‘louco por carro’, mas não pode ser feito de bobo.

Para nós, de Gravataí, o assunto é difícil de tratar. Por mais esforços que o governo Marco Alba tenha feito para fugir da ‘GM-dependência’ (um deles foi, para ter mais receita própria da prefeitura, cobrar o IPTU correto de quem tinha área maior e pagava menos, ação justa, mas até hoje incompreendida, para ficar num exemplo polêmico), o fechamento da montadora seria uma tragédia, porque se criaria na região um bolsão de desemprego e miséria.

Egoisticamente torcendo (como egoisticamente se forma nossa arrecadação, já que Gravataí é uma ‘vilã’ bancada pelo que deixa de entrar no caixa de outros municípios devido à renúncia fiscal até 2033), esperemos que se houver o fechamento das fábricas de São Paulo, tenhamos uma concentração de investimentos aqui. Triste que, no total, estamos falando de 20 mil empregos diretos, fora os reflexos nas economias locais das três cidades.

Mas a pergunta que eu mais gostaria que fosse respondida pelo prefeito na volta de São Paulo é:

– Qual é o prejuízo da GM no Brasil?

Infelizmente, duvido que abram isso a ele, pelo menos com autorização para tornar público, ou a todos nós, os pagadores dessa conta.

A GM não falou oficialmente com ninguém sobre nada.

Quem pode, pode.

 

A reportagem

 

Siga abaixo a reportagem do Estadão, que prometi reproduzir ao abrir o comentário acima, e depois assista aos vídeos com entrevista do prefeito Marco Alba e do presidente do Sindicato dos Metalúgicos após a videoconferência com o presidente da GM Mercosul Carlos Zarlenga. Para entender a polêmica em detalhes, também apresentam os links em ordem cronológica dos acontecimento.

 

'(…)

GM faz pressão por incentivos para investir

Empresa busca mais benefícios fiscais e cortes de salários para anunciar novo plano

A General Motors, líder em vendas de carros no País, busca apoio para um novo plano de investimentos na casa dos R$ 10 bilhões, valor próximo aos R$ 13 bilhões aplicados nos últimos cinco anos. Dos governos, a empresa espera benefícios fiscais; dos fornecedores, redução de custos; dos concessionários, menos comissão nas vendas; e dos trabalhadores, corte de salários e dos benefícios. Sem essas “contribuições”, a montadora ameaça deixar o País. O valor do novo plano foi citado por sindicalistas que têm de explicar aos trabalhadores as razões de novos “sacrifícios” pedidos pela GM.

Entre eles, estão redução do piso salarial e da participação nos resultados, terceirização em todas as áreas e aumento da jornada de trabalho. Nem a empresa nem pessoas que participam das negociações confirmam oficialmente o valor do novo investimento. O prefeito de São Caetano do Sul, José Auricchio Júnior, afirma apenas que “o novo ciclo representará garantia de, pelo menos, mais dez anos de funcionamento da planta na região”. A discussão sobre os rumos da montadora começou no dia 18, quando o presidente da GM Mercosul, Carlos Zarlenga, enviou carta aos funcionários dizendo que a situação do grupo depende da volta, ainda este ano, da lucratividade da operação, que está negativa desde 2016. Na carta, ele reproduz texto em que a presidente mundial da companhia, Mary Barra, demonstra estar insatisfeita com os resultados da América do Sul (Brasil e Argentina).

“Não vamos continuar investindo para perder dinheiro”, disse ela. Zarlenga disse que um plano para viabilizar investimentos na região foi entregue à matriz. “Do sucesso desse plano dependem os investimentos da GM e o nosso futuro.” Na semana passada, Zarlenga iniciou encontros com dirigentes sindicais das fábricas de São Caetano do Sul e São José dos Campos, ambas em São Paulo. O grupo tem mais três fábricas, uma de carros em Gravataí (RS) e duas de autopeças em Mogi das Cruzes e Joinville (SC). Hoje será a vez de encontro com fornecedores, de quem Zarlenga espera redução de preços. Dos concessionários já teria obtido corte de 1 ponto porcentual da comissão das vendas. O prefeito Auricchio diz que está previsto para dezembro o início da produção de um SUV na fábrica de São Caetano, possivelmente a nova Tracker. 

“A empresa tem novos investimentos definidos, mas precisa saber se tem a garantia dos quatro pilares (governos, sindicatos, concessionárias e fornecedores) que devem trabalhar de forma sincrônica e harmônica”, diz. “Com a conclusão de tudo isso haverá o anúncio positivo dos investimentos”, afirma Auricchio. Segundo a Secretaria Municipal de Fazenda, dados preliminares indicam que, do repasse total de ICMS recebido no ano passado, 24% (R$ 80 milhões) foram de responsabilidade direta ou indireta da GM. Em relação ao ISS, a montadora recolheu R$ 6,5 milhões, 3% do total. Em São José dos Campos, onde a GM é a terceira maior empresa – atrás da Revap e da Embraer –, o secretário de Inovação e Desenvolvimento Econômico, Alberto Marques Filho, diz que “a empresa tem intenção de produzir novos veículos em 2023 e, para isso, teria de fazer investimentos para preparar as linhas a partir deste ano”. 

Segundo Marques, o município se dispõe a suspender a cobrança de ISS e IPTU da GM, “mas primeiro queremos saber que investimento será destinado à cidade para então avaliarmos prazos e se a renúncia será total ou parcial”. Do governo do Estado, a GM espera receber créditos acumulados de ICMS, retidos há quatro anos. O imposto é pago pelas empresas nas exportações e deveria ser devolvido em forma de crédito a ser descontado de outros impostos. Só as montadoras têm mais de R$ 5 bilhões retidos, dizem fontes do setor. No ano passado, a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo informou que tinha um calendário para a devolução que iria até 2020. Em 2018, seriam devolvidos R$ 1,2 bilhão às montadoras. Na sexta-feira, o órgão disse que devolveu no ano passado R$ 770 milhões e não informou quando vai liberar os outros R$ 430 milhões.

(…)"

 

A entrevista com o prefeito

 

A entrevista com o presidente do sindicato

 

 

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