A Prefeitura divulgou o material “Plano Diretor de Drenagem Urbana prevê investimento de R$ 300 milhões e renovação de toda a rede”. É preciso explicar, para Gravataí ter a dimensão do desafio e da dinheirama necessária para as obras. O leitor está pronto para essa conversa? Não vai esquecer quando a chuva parar? Vai aceitar se a prioridade do governante de plantão for enterrar canos? Aí vai textão, mas é importante.
Começo reproduzindo o material divulgado pela Prefeitura. Abaixo, sigo.
“(…)
Adaptando-se às novas realidades climáticas, Gravataí finaliza o Plano Diretor de Drenagem Urbana e Manejo das Águas Pluviais (PDDRU) no final deste ano. O projeto prevê um investimento de mais de R$ 300 milhões e uma modernização de toda a rede de drenagem do município. Desde o ciclone extra tropical de junho de 2023 e nos eventos que seguiram em setembro e janeiro de 2024, a Prefeitura já refez o serviço de micro e macro drenagem em mais de 70% da cidade e começou a construir soluções.
Dentre as principais ações, foi feito o desassoreamento completo do Arroio Oriçó e do Arroio Demétrio, incluindo o trecho Freeway/Rio Gravataí, que nunca havia recebido este tipo de intervenção. Além destes, arroios nas regiões da Morungava, Costa do Ipiranga, Cerro Azul e pontos nas RS-020 e 030 também passaram por melhorias e adaptações para evitar alagamentos.
Trabalhando dentro desta nova realidade, também foi feita a readequação de pontes e pontilhões, por meio da troca de tubos por novas galerias. Dentre as principais estão a construção da nova Ponte da Estrada Santa Cruz e de uma passagem com galerias na Estrada David Canabarro, importante estrutura para a comunidade da Morungava, proporcionando mais vazão à água. A obra também foi pensada para evitar erosões na pista e proteger o asfalto.
De acordo com o prefeito Luiz Zaffalon, a gestão municipal já conta com o diagnóstico dos casos mais graves e, por meio de estudos e projetos bem feitos, será possível fazer a aplicação correta de recursos e soluções.
“Nós temos que fazer, por exemplo, as redes de drenagem de maior bitola em 120 locais da cidade. Com os projetos de micro e macro drenagem em mãos poderemos buscar os recursos necessário. Gravataí nunca teve este olhar e este cuidado para as questões de drenagem urbana. Agora vivemos um novo momento e isso é parte essencial do bom funcionamento da cidade”, explica.
Obras para o futuro
O Plano Diretor de Drenagem Urbana prevê a estruturação de um cadastro de rede de drenagem, delimitação das faixas de Áreas de Preservação Permanente (APPs) e avaliação das inundações das sub-bacias dos arroios Barnabé, Demétrio, Brigadeira e do Rio Gravataí, entre outras medidas. O projeto é composto por um comitê que conta com a Prefeitura de Gravataí, por meio da Secretaria do Meio Ambiente, Sustentabilidade e Bem-Estar Animal (Sema) e as empresas que executarão o plano, Concremat Engenharia e Rhama Analysis.
Buscando a prevenção de alagamentos e a modernização da rede drenagem, será necessário atuar em todas as regiões de Gravataí. O entorno do campo do Esporte Clube Bagé, a Cohab C, abaixo do Morro do Coco, a Avenida Gravataí e os bairros Neópolis e Rosa Maria são alguns exemplos.
Para a Vila Rica já há um projeto novo e adequado, buscando a melhoria da qualidade de vida da população. Na localidade será necessária a construção de um dique no canal do Arroio Barnabé e realocação de 40 residências que estão no leito das obras; precisamos construir também uma casa de bombas para a melhor drenagem. Além disso, a Prefeitura de Gravataí também já conta com projetos em andamentos e obras por iniciar para a construção de três bacias de amortecimento, desde a Morada do Vale até a Vila Rica.
As obras também contarão com melhorias no esgotamento sanitário, pois será necessário o isolamento de toda a rede de esgoto cloacal da Corsan, que atravessa o bairro.
(…)”
Sigo eu.
Os R$ 300 milhões não representam investimento feito. É o investimento necessário para obras.
É um montante maior do que tudo o que vai investir o prefeito Luiz Zaffalon (PSDB) nos quatro anos de mandato.
Corresponderia ao governo destinar para a redução de alagamentos tudo o que investiu em quatro anos em asfalto, postos de saúde, escolas infantis e, também, drenagem.
Para efeitos de comparação, a projeção do governo é chegar aos R$ 250 milhões em investimentos, de financiamentos e recursos próprios, entre janeiro de 2021 e dezembro de 2024. Para TODAS AS OBRAS NA CIDADE, grifo.
E a conta para reduzir os alagamentos é ainda maior, porque é preciso considerar toda a região metropolitana, já que a água não respeita fronteiras, projetos e orçamentos municipais.
O “Estudo de alternativas e projetos para minimização do efeito de cheias e estiagens na Bacia Hidrográfica do Rio Gravataí”, contratado em 2015 pela Metroplan, já antecipava prejuízos de até R$ 5 bilhões em 30 anos caso não fossem feitos investimento de pelo menos R$ 2,5 bi, principalmente em Porto Alegre, Gravataí, Cachoeirinha e Alvorada.
Parte do Plano Metropolitano de Proteção Contra as Cheias e integrante do Plano Nacional de Gestão de Riscos e Respostas a Desastres Naturais, o estudo observou um tempo de recorrência de 100 anos – o que, os desastres naturais evidenciam, deve caducar antes devido à crise climática mundial, que em 2023 teve o Rio Grande do Sul como case no discurso do presidente Lula na ONU.
Do discurso para cá, experimentamos mais dois desastres climáticos, em janeiro e agora.
– Tal valor representa, na verdade, o prejuízo que a sociedade arcará se a situação das cheias não for devidamente enfrentada – alertava, em documento de 2018, Pedro Bisch Neto, superintendente da Metroplan, ao apresentar o estudo como “uma visão regional inédita do fenômeno das cheias na Região Metropolitana de Porto Alegre”.
Para se ter uma ideia da histórica falta de prioridade pelos governos, a bacia do Gravataí, fruto da mobilização político-ambiental na busca por identificar áreas alagadas, tem o processo mais avançado do RS, mesmo estes estudos se arrastem desde o PAC da Prevenção de 2012!
O Vale do Taquari, de tragédia em tragédia, não tem plano algum, por exemplo.
Fato é que, após mais de uma década, está em andamento a confecção de estudos e projetos para, por exemplo, diques de contenção de cheias em Gravataí (Parque dos Anjos), Cachoeirinha (da ponte divisa com Porto Alegre até atrás do Cadop) e na zona norte de Porto Alegre, além de, para enfrentar estiagem, os 13 minibarramentos no Rio Gravataí – sobre este último tratei ainda neste mês, em Guerra da água: projeto técnico para construção das microbarragens no rio Gravataí fica pronto em maio; De Niño para Niña, da cheia para seca.
Resumidamente, as obras são necessárias para diminuir a velocidade da água no inverno de chuvas e segurar a água no verão de seca para o banhado não esvaziar rápido.
Clique aqui para ler a íntegra do documento da Metroplan, que detalha investimentos necessários, projeta necessidade de desapropriações de edificações existentes e remoções de milhares de famílias, além da restrição a novas construções a partir de uma mancha de inundação.
Grifo a ‘mancha de inundação’, porque as restrições de ocupação de solo são fundamentais na mitigação de alagamentos.
Os bilhões necessários em diques, minibarragens e adutoras, e agora os R$ 300 milhões previsto no Plano Diretor de Drenagem, para enfrentar cheias e estiagens na bacia do Rio Gravataí, será dinheiro jogado pelo ralo se legislações municipais não garantirem a contenção de empreendimentos imobiliários em áreas de risco.
Em um exercício simples de lógica, respeitar a ‘mancha’ significa evitar problemas futuros, enquanto se busca resolver problemas do passado e do presente.
Inegável é que a não aceitação da recomendação da Metroplan pelos municípios, antes e depois do estudo, permitiu e ainda permite, em toda região, silenciosos aterramentos e barulhentas construções em áreas onde se sabe que a água pode chegar.
Em setembro, em Plano Diretor: prefeito e vereadores precisam ser o ‘dique’ contra construções em áreas sob risco de alagamento em Gravataí; Saiba o prejuízo bilionário com as cheias nos próximos 30 anos, alertei que estava nas mãos do prefeito e dos vereadores observarem a necessidade da ‘mancha de inundação’ na revisão do Plano Diretor.
Como o Plano Diretor de Drenagem, alvo deste artigo, só fica pronto no fim do ano, e o Plano Diretor para toda Gravataí saiu de pauta, é uma discussão que avança para o próximo governo e compromete os próximos vereadores.
Ao fim, é uma ‘pauta-bomba’ para a campanha eleitoral deste ano.
Por isso questionei, na abertura do artigo, se o leitor estava pronto para essa conversa.
É preciso cobrar dos candidatos um plano de investimento para esses R$ 300 milhões necessários em obras anti-alagamentos.
Como o que o próximo prefeito terá para investir não deve ser mais que esse valor para todas as obras na cidade, é necessário um planejamento para pelo menos 10 anos.
Enterrando canos, o que para muitos – políticos e eleitores – realização não parece.