MOISÉS MENDES

Os fracassos da geração dos generais de Bolsonaro

A elite militar que trabalha para Bolsonaro pode ter feito, pela avaliação de entendidos, boas gestões de quartéis e de planejamento tático e estratégico das suas atividades estritamente castrenses.

Mas essa elite fracassou, e fracassou muito, quando se meteu em áreas que nem os marechais e generais e seus gênios civis da ditadura dominavam.

Os generais fracassaram junto com as missões do Brasil em nome da ONU no Haiti. Fracassaram com Braga Netto na intervenção militar no Rio.

Fracassaram com o desastre de Eduardo Pazuello no Ministério da Saúde e fracassaram com Hamilton Mourão no comando da Amazônia.

Os generais fracassaram já no lançamento, em 2020, do que deveria ter sido o Programa Pró-Brasil, apresentado como um arremedo dos planos desenvolvimentistas da ditadura.

Esses são os militares do entorno de Bolsonaro, muitas vezes vistos não como subalternos do sujeito, mas como seus tutores desde o início do governo.

Bolsonaro está cercado de gente fardada que não conseguiu fazer o básico nas empreitadas assumidas. São oficiais de alta patente que comandam, ao lado de civis, mais de 6 mil colegas das três armas, muitos em postos de chefia, da Educação à Funai.

Sob outro ponto de vista, pode-se dizer também que, ao contrário da percepção de fracasso, eles conseguiram tudo o que desejavam fazer. E assim teriam sido bem sucedidos, e muito mais agora sob as ordens de Bolsonaro.

Mas é difícil aceitar que a sabotagem das medidas contra a pandemia e a vacinação e que a entrega da Amazônia à bandidagem tenham sido projetos pensados com método e racionalidade pelos militares.

Vamos ao exemplo da Amazônia. Na quarta-feira, a Globo News exibiu uma das mais constrangedoras entrevistas concedidas por um general brasileiro.

O general vice-presidente Hamilton Mourão, presidente do Conselho Nacional da Amazônia, confessou seu fracasso com uma sinceridade de recruta.

Admitiu não ter poder, não ter autoridade para mandar, não ter gente, não ter verbas e não ter chefia que o liderasse com firmeza no comando da Amazônia.

E no final confessou: talvez tenha sido incompetente para fazer o que deveria ter sido feito em defesa do território, dos povos e da floresta.

Mourão se desculpava o tempo todo porque nunca teve um cargo executivo. Mas não soube dizer por que as Forças Armadas, e não só o seu conselho, fracassaram na defesa da Amazônia, diante das ameaças externas e dos bandidos internos que mataram Bruno Pereira e Dom Phillips. Soube apenas se desculpar.

Mourão não mandava em ninguém, como admitiu, e se ressentia de um líder. Disse que alguém deveria ter exercido uma liderança agregadora na Amazônia, dando a entender que essa pessoa não seria ele.

E se despediu da conversa como um subalterno que se pune em público por sua submissão a um trabalho nobre que se transforma em algo quase sem sentido.

Um general não conseguiu impor sua autoridade de general e de vice-presidente na região mais problemática do país e a mais exposta aos olhares do mundo todo.

Mourão não mandava e não apitava na Amazônia, onde grileiros, garimpeiros, contrabandistas, mineradoras, traficantes de outros países e assassinos de índios, de jornalistas e de indigenistas mandam e desmandam.

Foi uma omissão deliberada? Por ordem de Bolsonaro compartilhada com os militares? Ou por ser parte do projeto dos militares, encampado pelo poder político de Bolsonaro?

O certo é que essa elite militar, que fracassou em missões internacionais, sabotou a imunização contra a Covid, abriu caminho para gangues de vendedores de vacinas dentro do governo, não enfrentou os bandidos da Amazônia e, bem antes, não ofereceu nenhuma saída para a guerra civil no Rio, essa é a elite ao redor de Bolsonaro.

Não é razoável pensar que esse grupo, muito bem identificado com os projetos de Bolsonaro, pretenda mesmo levar adiante o blefe de um golpe.

Todos os golpes liderados por militares fracassaram nas últimas décadas na América do Sul. As experiências recentes da elite militar brasileira não credenciam esse grupo a organizar, aplicar e manter um golpe liderado por Bolsonaro.

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