Mesmo com uma morte por dengue hemorrágica, revelada com exclusividade pelo Seguinte: há uma semana, Gravataí só tem vacinas na rede privada. Nenhum município gaúcho resta incluído na primeira fase da campanha nacional de vacinação.
Ah, então a dengue é a ‘covid do Lula’ e o ‘nove dedos’ é genocida!
É abjeta essa comparação.
Vou explicar, nesta quarta-feira, em que Gravataí registra 99 casos confirmados de dengue e 597 em investigação.
Na rede privada, a vacina custa em média R$ 300. Na rede pública, a imunização começou em fevereiro, com a vacina Qdenga, do laboratório Takeda, em um esquema de duas doses, que devem ser tomadas em um intervalo de três meses.
O Ministério da Saúde comprou o quantitativo total disponível pelo fabricante para 2024: 5,2 milhões de doses. O laboratório vai doar 1,3 milhão. Para 2025, estão contratadas mais 9 milhões de doses.
“Diante da capacidade limitada de fabricação de doses da vacina, cerca de 3,2 milhões de pessoas devem ser vacinadas em 2024, já que o imunizante precisa de duas doses, com intervalo mínimo de três meses”, informa o ministério que, devido à quantidade limitada, estabeleceu para a aplicação em 2024 a aplicação a partir de critérios definidos junto à Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização (Ctai).
Foram escolhidos na primeira fase 521 entre os 5.568 municípios brasileiros, de 16 estados e do Distrito Federal, por terem mais de 100 mil habitantes e altas taxas de transmissão da doença nos últimos 10 anos.
O público-alvo da imunização são as crianças e adolescentes entre 10 e 14 anos, faixa etária com o maior número de hospitalizações por dengue depois dos idosos, grupo que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) não autorizou a aplicação da vacina.
A vacina Qdenga foi aprovada pela Anvisa em março de 2023, após demonstrar eficácia de 84,1% de proteção geral contra a doença – evitando hospitalizações – em estudos desenvolvidos ao longo de quatro anos.
Em 31 de julho, o laboratório Takeda pediu a incorporação do imunizante ao SUS. O governo decidiu pela inclusão em dezembro, depois do parecer favorável da Comissão Nacional de Incorporações de Tecnologias no SUS (Conitec).
No fim de janeiro chegou a primeira remessa de 750 mil unidades e em fevereiro começou a aplicação.
A produção nacional, pelo Instituto Butantan, se encontra na fase três de produção, que é de dose única, mas o dossiê ainda precisará passar por análise da Anvisa.
Reputo é delinquência intelectual e um crime moral qualquer paralelo da dengue com a covid.
A doença transmitida pelo mosquito, que se cria nos pátios sujos de particulares e em logradouros mal cuidados pelo poder público, matou 1.079 brasileiros em 2023.
Já a pandemia da covid, com vírus transmissor entre humanos, só em Gravataí registrou mais de mil mortes; leia em Gravataí poderia ter um Memorial para 1.116 vidas perdidas pela covid; O ‘PIXida’ genocida.
Inesquecíveis foram os erros dolosos que atrasaram por 7 meses – ou mais de 100 mil vidas perdidas – a compra das vacinas pelo ex-presidente e futuro detento Jair Bolsonaro, que preferia apostar em tratamentos sem comprovação científica, como a cloroquina, hidroxicloroquina ou vermífugos, ao lado de seu ministro da Saúde Eduardo Pazuello, agora investigado pelo STF por uma das tragédias mais marcantes da pandemia: as mortes de pacientes por falta de oxigênio nos hospitais de Manaus.
Bolsonaro ignorou a primeira oferta de 70 milhões de vacinas feitas pela Pfizer por duas vezes, a segunda em carta direta do CEO global Albert Bourla.
O negacionista recusou a compra da CoronaVac, desenvolvida pela empresa chinesa Sinovac, produzida e distribuída no Brasil pelo Butantan, dizendo que os brasileiros não seriam “cobaias” da “vacina chinesa”.
Enquanto o mundo negociava com diferentes laboratórios para garantir milhões de doses, Bolsonaro apostou em apenas uma vacina, a AstraZeneca. “Pessoal diz que eu tenho que ir atrás da vacina. Quem quer vender é que tem”, disse à época.
Talvez o principal, pelo efeito na população, Bolsonaro sempre negou a importância da vacinação. Questionou a segurança dos imunizantes, defendeu a não obrigatoriedade da vacinação e afirmou que, ele mesmo, não tomaria a vacina. “Eu não vou tomar vacina e ponto final. Se alguém acha que a minha vida está em risco, o problema é meu”, disse, na TV.
Ao fim, são os fatos, aqueles chatos que atrapalham argumentos: a dengue não é a ‘covid do Lula’. Propagar isso é sintoma de contaminação por uma doença moral. É, para defender o indefensável, exumar um milhão de corpos para relativizar a maior tragédia da nossa história.