Na live desta quinta, o governador Eduardo Leite repassou aos prefeitos a responsabilidade por abrir ou não o comércio a partir desta sexta para os 3,5 milhões de habitantes da região metropolitana. Parece-me o filme Tubarão (Jaws, 1975). No clássico de Steven Spielberg, os alertas são dados, ataques já acontecem, mas ainda assim a praia é aberta aos banhistas.
Hoje, Gravataí está classificada como ‘bandeira laranja’ no ‘distanciamento controlado’ programado pelo Governo do RS, em uma escala que tem abaixo a amarela e acima a vermelha e a preta.
Na analogia com o mar, o banho seria permitido, mas com alerta de correntes e buracos. Guarda-vidas que consultei adverte que é uma das bandeiras que mais preocupa, porque os veranistas não tomam os mesmos cuidados que uma bandeira vermelha – mas os perigos existem.
O prefeito está neste momento reunido com o Comitê de Enfrentamento ao Coronavírus para anunciar em live, às 19h30 de hoje, se, quando e como acontecerá a retomada da atividade econômica. Domingo, em Gravataí: máscara obrigatória a partir de segunda e aula só depois de 31 de maio, Marco Alba antecipou ao Seguinte: que aguardaria o governador. Caso o decreto estadual não fosse prorrogado, apresentaria regras sanitárias para reabrir o comércio a partir desta sexta, 1º de maio.
Uma abertura do comércio amanhã seria decidida observando normas definidas pela prefeitura, conforme critérios da Vigilância Sanitária.
Isso porque, no plano do Governo do RS, as planilhas com possibilidade de consulta online sobre os indicadores sanitários e econômicos para enquadramento em cada bandeira, e as regras de funcionamento para cerca de 50 diferentes atividades em 12 setores, ficarão prontas e disponíveis online somente a partir do sábado dia 9.
Inegável é que do domingo em que projetava a reabertura do comércio até esta quinta há novas informações para o prefeito e seus técnicos analisar.
Salvo engano, como já alertei ontem em Gravataí pode ter 12 vezes mais infectados por COVID 19; reabrir ou não comércio?, não identifico no modelo matemático e epidemiológico do Estado dados que garantam segurança para a saída imediata do distanciamento social.
Sigamos, na ‘ideologia dos números’.
Uma das fórmulas do ‘distanciamento controlado’ faz uma relação entre a velocidade do contágio e a capacidade de atendimento hospitalar, além de incluir na conta um público de risco, o idoso.
Começando pelo fim, Gravataí tem potencial para ser um ‘covidário’, como já mostrei em Os milhares de Gravataí que estão no grupo de risco da COVID 19; teste se você escapa. São 30 mil idosos, e outros grupos de risco, como hipertensos e pessoas acima do peso, que correspondem a mais da metade da população.
Sobre a velocidade do contágio, dois aspectos.
Um. O estudo do RS mostra o tamanho da subnotificação de casos de infecção pelo SARS-CoV-2, como mostrei em Gravataí pode ter 12 vezes mais infectados por COVID 19; reabrir ou não comércio?. Hoje Gravataí teria não 24, mas 288 pessoas infectadas. Índice pior aparece ao aplicar modelo matemático a partir de testagem feita no Distrito Federal: o potencial de gravataienses com o vírus em abril chegaria a 4 mil – apresentando ou não sintomas, o que tratei em É moralmente homicida pressão pela volta da ’vida normal’; o que fará Gravataí?.
Dois. Como o modelo do Governo do RS trabalhará com índices de sete dias para manter ou reclassificar as bandeiras, sempre aos sábados, é necessário observar o crescimento no número de casos oficiais em Gravataí no período de uma semana – isso testando apenas pessoas hospitalizadas com sintomas evidentes.
Entre hoje e a quinta passada, foram 8 casos e uma morte. Média de mais de uma confirmação por dia. Até a semana anterior a medida era de um caso a cada dois dias.
Outro aspecto do estudo é a capacidade de atendimento hospitalar. Os leitos de UTI em Porto Alegre, hoje referência para Gravataí, tem ocupação de 7 a cada 10, destes 8% por pacientes por COVID-19. No Hospital Dom João Becker/Santa Casa, há 12 leitos de UTI, como já mostrei em Gravataí, Cachoeirinha e Viamão tem mais casos de COVID 19 que UTIs; o 11 de setembro.
Serão 30, mas apenas a partir do dia 15, com outros 10 no hospital de campanha e mais 10 no HDJB – e só serão leitos de UTI caso o governo federal confirme o envio de 20 respiradores negociados pela Prefeitura com o Ministério da Saúde, como o Seguinte: mostrou em Entramos no novo hospital de campanha de Gravataí; assista.
Sem estes equipamentos, os 10 leitos no Becker e os 10 no hospital de campanha não passarão de espaços de triagem, já que não teriam a capacidade de unidades de tratamento intensivo para tratamento de pacientes com sintomas graves, com necessidade de respiração mecânica.
O governador alertou que o estudo evidencia que o Rio Grande do Sul está no início da pandemia. Um dos critérios é observar o número de casos ativos e recuperados. Quando há mais ativos, a população está mais distante da imunização. Em Gravataí, em dados oficiais de hoje, são 5 recuperados em 23 casos.
Como também apresentei em Gravataí pode ter 12 vezes mais infectados por COVID 19; reabrir ou não comércio?, pelo indicador R, do Imperial College, instituto mais usado no mundo para medir a pandemia, o Brasil tem a maior taxa de contaminação do planeta: 2,8. Significa que cada infectado contamina outros 3. Na Alemanha é 0,8, ou 1 para 1.
O estudo do Governo do RS confirma a taxa de alta taxa de transmissibilidade. Familiares dos casos detectados como positivos pela pesquisa também foram testados: 75% também estavam contaminados. Poderia ter chegado a 100%: dos 6, um morava sozinho e em outro caso, onde quatro familiares foram positivados, um quinto que morava na residência não foi localizado para fazer o teste.
Fato, aquele chato que atrapalha argumentos é que as regiões de Passo Fundo e Lajeado, que abriram o comércio para a Páscoa, hoje são as únicas do RS com ‘bandeira preta’. Em Santa Catarina, Blumenau dobrou o número de casos após abrir shoppings – o vídeo captado em um deles, que você assiste clicando aqui, e mostra músico recebendo a aglomeração ao som do saxofone, lembrou-me a cena do Titanic em que a banda tocava enquanto pessoas eram lançadas ao mar.
Ao fim, aguardemos a live do prefeito logo mais. Já que a pandemia só faz avançar, mais prudente, para quem esperou até agora, parece-me aguardar a aplicação definitiva das fórmulas e a definição dos protocolos pelo Governo do RS, prorrogando a saída gradual do distanciamento social para o dia 11. Conforme o chefe da Infectologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre Eduardo Sprinz estudos orientam relaxamento das medidas somente após 10 semanas de isolamento; e chegamos apenas à quinta semana. Porém, se a decisão for pela reabertura do comércio, que lojistas e clientes tomem cuidado – e a Prefeitura não só oriente, mas fiscalize e multe de verdade, para que não fique ainda pior o 'liberou geral' nas ruas.
O tubarão está entre nós.
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