Hipocondria
Tirando os casos de alguns escritores famosos e de outras celebridades que deixam seus epitáfios prontos, como resumo de sua vida, última piada ou mensagem à posteridade (“Só peço a Deus que tenha piedade da alma deste ateu” era o de Miguel de Unamuno), as frases inscritas nas lápides dos túmulos tratam de homenagear quem está sepultado ali e são bastante previsíveis.
Mas até nessa área há espaço para a originalidade. Assisti, outro dia, pela tevê, entrevista com um pesquisador que havia percorrido inúmeros cemitérios dos Estados Unidos, em busca de epitáfios antigos. E um deles me encantou: “Eu não falei que estava doente, George?”
Hipocondria 2
Muito antes destes tempos de discursos politicamente corretos — que me parecem bem-vindos, embora não tenha paciência com alguns patrulhadores linguísticos de plantão —, tive um colega de trabalho, o Geio, que tinha a mania de pôr apelidos em todo mundo e, em geral, eram tão precisos, que colavam na pessoa de forma definitiva.
Um dia, fomos dar as boas-vindas a um diretor novo, e chamou nossa atenção um estojo branco, que havia sobre sua mesa, com diversos compartimentos, cada um com uma pílula diferente.
Então, ele nos explicou: “Este antidepressivo eu tomo ao acordar; esta vitamina, no café da manhã; este aqui é para manter minha pressão sob controle; este…..”
Quando saímos de sua sala, o Geio já o havia batizado: “Que te pareceu o ‘Próximo Feriado’, Sônia?”.
Palavras abandonadas
Que pena tenho daquelas palavras que, depois de nos prestarem bons serviços durante séculos, e que expressavam com precisão imbatível o que queríamos dizer, foram substituídas por similares mais pobrinhos!
Aprendi, no Curso de Jornalismo, que temos de escrever de forma a ser entendidos por todos, desde uma criança de oito anos e semianalfabetos (Eis aí uma palavra que caiu em desuso e, a propósito, desuso também não se usa mais…) até expoentes da Academia (Xiii, acho que esta também já foi pro saco…).
Então, tenho um método para saber se devo ou não empregar uma palavra dessas, quando estou escrevendo. Pergunto a uma colega de trabalho um pouco mais antiga do que eu, que tem um vocabulário riquíssimo, se ela ainda a usa. Se responde que sim, escolho outra.
Antes, chamávamos quem anda por aí feito animal superior de esnobe ou pernóstico. Agora, só sobrou o metido. Também já não tenho ouvido nem lido as palavras chumbrega, xexelento, chinfrim, quiproquó, serelepe, sirigaita, chapoletada, supimpa, marmota, colosso e inúmeras outras igualmente saborosas.
Há, também, palavras que estão sumindo, porque passaram a ser consideradas politicamente incorretas, como judiar e denegrir, que deixei de usar há tempos. Mas, cá entre nós, há muito exagero nesta área, como se pode ver na cartilha Politicamente Correto e Direitos Humanos, publicada, em 2004, pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, transformada em ministério em 2015. http://www.dhnet.org.br/dados/cartilhas/a_pdf_dht/cartilha_politicamente_correto.pdf
Quanta baboseira! A propósito, ainda se usa esta palavra?
Palavras intraduzíveis
Há algumas palavras e expressões tão precisas que é quase impossível traduzi-las a qualquer outro idioma. Há quem diga que saudade é uma delas, e o poeta Fernando Pessoa até escreveu uma quadrinha a respeito: “Saudade só portugueses/Conseguem senti-las bem/ Porque têm essa palavra/Para dizer que as têm”.
Trouxe, dos 17 anos que vivi no Equador, algumas palavras em espanhol e em quéchua que guardo entre minhas preciosidades. Gosto tanto delas que tenho a tentação de usá-las o tempo todo e só não o faço porque pareceria estranho para quem me escuta.
Uma delas é finiquitar, que significa terminar de uma vez. Dias atrás, em uma reunião que se estendia mais do que o suportável, eu me surpreendi propondo aos demais presentes, sem paciência alguma; “Por favor, vamos finiquitar este assunto!”.
Perifrásico — que, descobri há pouco, também existe no vocabulário português —, é outra palavra que me encanta. “Fulano es un perifrástico!”, ou seja, o Fulano fala, fala, fala, mas nunca chega ao cerne da questão. Sua voz está sempre fora do perímetro da conversa.
Em quéchua, há maravilhas… Quando está com asco, o indígena equatoriano faz uma cara bem feia e grita “Atatai!”; no frio, encolhe-se e reclama “Achachai!” e, no calor, exclama, indignado, “Arrarai!”.
Em 1992, assim que lançaram Jaime Nebot, um político que se daria muito bem em Brasília, como candidato à Presidência do Equador, logo apareceram por toda a cidade adesivos que diziam “Nebot? Atatai!”.
Não é o máximo?