opinião

Rita é ’prefeita’, não ’prefeito’; PT reclama

Placa com foto de Rita e Cristiano foi inaugurada nesta sexta junto a outros 21 prefeitos e vices

O prefeito Marco Alba inaugurou uma nova galeria de fotos dos prefeitos e vices de Gravataí, como tratei no artigo A nova galeria dos prefeitos e vices de Gravataí; a força das palavras, publicado sexta no Seguinte:.

A executiva municipal do PT envia nota.

Siga trechos.

Ao fim, comento.

 

“(…)

Lamentavelmente na foto da PREFEITA Rita Sanco do PT, única mulher a ocupar o cargo na história da cidade, seu gênero não foi respeitado e a cultura machista prevaleceu. Ela foi referida como PREFEITO em vez de PREFEITA. 

A linguagem inclusiva é uma das tantas lutas que as mulheres precisam enfrentar. Por meio dela é possível dar visibilidade para a participação feminina, que sempre existiu na construção da nossa sociedade, mas que nem sempre foi destacada. 

O governo Marco Alba do MDB, além de não promover políticas públicas para as mulheres e retroceder em projetos que foram tão importantes para o público feminino durante nosso governo, desrespeita a linguagem nominal demonstrando sua concepção machista de sociedade. 

As mulheres do nosso país vivem um momento perverso, o número de feminicídios é alarmante, os índices de violência doméstica e de estupros estão nas alturas e o governo Bolsonaro nada aplica para mudar essa realidade. Pelo contrário, viabiliza através de suas falas, a desconstrução e desvalorização das lutas das mulheres. 

Dito isso, vimos por meio desta repudiar a falta de sensibilidade do governo municipal para com a linguagem inclusiva, que é tão importante na promoção da igualdade de gênero, e solicitar a imediata correção. 

Rita Sanco foi a primeira e até hoje única PREFEITA MULHER de Gravataí.

A representatividade importa, inclusive na gramática.

(…)”

 

Analiso.

Óbvio que polemizar sobre se está escrito PREFEITO ou PREFEITA numa placa que poucos olham no saguão da Prefeitura, pode parecer uma bobagem se comparado ao drama de alguém que neste momento espera leito no calorão, sem ar ou ventilador, em uma maca no hospital.

Reputo, porém, um debate mais construtivo do que assistir a programas de domingo, como Silvio Santos, 88 anos, perguntando a uma menina com menos de 10 se prefere “Sexo, poder ou dinheiro?”. 

(agora, se você vai levar um ventilador para emprestar para a Santa Casa, ok, falemos sobre isso depois).

Mas, sigamos.

O Zeitgeist, o ‘espírito do tempo’, fantasma cruel com as mulheres, é construído também na linguagem. As vítimas do silêncio são as mesmas de sempre. ‘Mesmas’, observe o gênero.

Sempre me constranjo em ocupar o ‘lugar de fala’ de feministas, mas como o PT enviou a nota a mim, recorro ao ‘Manual para o uso não sexista da linguagem’, onde Paki Venegas Franco e Julia Pérez Cervera resumem: através da linguagem aprendemos a nomear o mundo em função dos valores imperantes na sociedade; as palavras determinam as coisas, os valores, os sentimentos, as diferenças.

Ao alertar para uma ideologia dominante, que ensina que existem comportamentos diferentes, adequados ou não, para meninas e meninos, as autoras citam Teresa Meana, e a consideração dos homens como o centro e a medida de todas as coisas:

– Os homens são considerados os sujeitos de referência e as mulheres seres dependentes e subordinados a eles.

Aí, o que não se nomeia, não existe. Utilizar o masculino como genérico tornou invisível a presença das mulheres na história, na vida cotidiana, no mundo.

Segue:

– Basta analisar frases como: “Os homens lutaram na revolução francesa por um mundo mais justo, marcado pela liberdade, igualdade e fraternidade”. E as mulheres? Onde ficam nessa luta? Não nos enganemos: quando se utiliza o genérico está se pensando nos homens e não é certo que ele inclua as mulheres. Não sabemos se atrás da palavra homem se está pretendendo englobar as mulheres. Se for assim, elas ficam invisíveis e se não for assim, ficam excluídas.

Ao fim, “O que bem se diz, bem se entende”, é o subtítulo do Manual, cheio de bonitas ilustrações (não é ‘mamadeira de piroca’, ou ‘kit gay’, viu?), que você lê na íntegra clicando aqui.

Se fácil não é, mal não faz chamar as coisas pelo nome que elas têm.

E, para o prefeito, que aposto nem percebeu, não custará mudar a moldura e nominar Rita como prefeita. Até porque, em nome da correção, a placa já terá que ser refeita: o sobrenome do vice de Rita, Cristiano, está escrito errado. É Kingeski, e não Kingenski.

 

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