O ex-diretor de administração e finanças do Daer, Saul Sastre, teve celular, computadores e documentos apreendidos na manhã desta terça, em sua casa, em Cachoeirinha, durante uma ação da Delegacia de Repressão a Crimes contra Administração Pública e Ordem Tributária, do Deic. Eram parte dos 15 mandados de busca e apreensão cumpridos durante a Operação Abecedário, desencadeada para apurar possíveis crimes de fraude licitatória e peculato envolvendo, além de Saul, outro diretor geral do departamento Ricardo Moreira Nuñez. Na outra ponta da suposta fraude estão empresários do setor de tecnologia.
Conforme o delegado André Lobo Anicet, há apontamento de sobrepreço superior a R$ 400 mil — que, corrigidos, chegariam a R$ 500 mil — na contratação, com dispensa de licitação, de serviços de protocolo na autarquia. O contrato foi assinado em junho de 2016, com duração de seis meses, ao custo de R$ 616 mil.
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Suspeita não deve abater Saul Sastre
— A Contadoria Geral do Estado (Cage) apontou que, além de haver sobrepreço no serviço de organização do protocolo, é questionável a necessidade do serviço justamente no momento em que o departamento passava pela informatização do sistema. Já houve procedimento por parte da Cage, do Tribunal de Contas do Estado e uma sindicância interna, mas a Polícia Civil foi procurada por haver a suspeita de mais envolvidos. Agora, com os documentos apreendidos, vamos aprofundar a investigação esclareceu o delegado Max Ritter.
Segundo ele, há nítida fraude licitatória. Além do mandado em Cachoeirinha, os policiais recolheram materiais em Passo Fundo, São Leopoldo, Porto Alegre e Rio de Janeiro.
Sindicância levou à demissão
O caso não é propriamente novo. Saul Sastre assumiu a diretoria em janeiro de 2015, e foi um dos respónsáveis pelo processo de modernização da autarquia. Em 2017, a contratação foi o alvo principal da sindicância que levou, em setembro, ao pedido de demissão de Saul Sastre do cargo que ocupava por indicação do PSB no governo José Ivo Sartori (MDB).
— Naquele momento, ele não se sentia em condições psicológicas de permanecer no cargo. Agora, não sei no que a investigação está baseada. O Saul prestou todos os esclarecimentos necessários ao TCE e à sindicância — afirma o advogado Gabriel Pauli Fadel.
: Documentos, computadores e celulares foram apreendidos em 15 locais | POLÍCIA CIVIL
Conforme o defensor do administrador de Cachoeirinha, as duas principais alegações que deram início à investigação são contestáveis.
— O sobrepreço alegado pela Cage foi baseado em parâmetros diferentes do serviço que estava sendo contratado — aponta.
Segundo os investigadores, a empresa vencedora tinha entre os seus sócios, nomes coincidentes com os de outras empresas que concorreram para prestar o mesmo serviço, apresentando preços diferentes antes da escolha. O delegado Anicet relata, inclusive, o pagamento feito a um dos sócios por uma empresa diferente daquela que havia sido a escolhida para operar o protocolo do Daer.
— Detectar a coincidência de sócios não era uma atribuição exclusiva do diretor. Toda a contratação passa por uma análise técnica pelo setor de controle, envolvendo ainda a diretoria executiva e jurídica. Não foi um ato isolado — alega Fadel.
Para a assinatura do contrato em 2016, no entanto, Sastre teria alegado "urgência ou calamidade pública" para contratar a empresa OWL Gestão e Tecnologia, que depois trocou o nome para Disruptcode e LAB308. Ela foi contratada por carta-convite e, como o até então diretor alegou na época da sindicância, tratava-se de um serviço necessário, apesar da informatização que iniciava naquele período.
— O serviço, inclusive, se mostrou eficiente — garante o advogado.
A suspeita da polícia é de que havia um lobbysta que facilitava a contratação do grupo econômico beneficiado pela suposta fraude, com a anuência de servidores. A investigação prossegue.