Reportagens apontam que Eduardo Bolsonaro estaria no “conselho de guerra” que planejou a empreitada. Ele teria se reunido com empresário braço-forte de Trump, e realizado sucessivos encontros com a família do ex-presidente. O Seguinte: reproduz o artigo publicado pelo Congresso em Foco
Reportagem de dois sites investigativos dos Estados Unidos associa o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) à tentativa de golpe no país, no último dia 6 de janeiro, quando militantes pró-Donald Trump invadiram o Capitólio, sede do Legislativo.
O nome do filho do presidente Jair Bolsonaro aparece, na publicação, como o único estrangeiro a participar de uma reunião do chamado “conselho de guerra” de Trump na residência privada do então presidente dos Estados Unidos, no Trump International Hotel.
O ato, que acabou com 90 pessoas presas, dezenas de feridos e cinco mortes, tentava impedir o reconhecimento da eleição de Joe Biden à presidência.
O nome de Eduardo, presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, é citado na lista das pessoas que se encontraram com o empresário Michael J. Lindell, considerado um dos mais próximos conselheiros de Trump e investigado por incentivar a tentativa de golpe. As primeiras reportagens sobre o assunto foram publicadas por Olivia Little, da Media Matters, e de Seth Abramson, do Proof, em fevereiro. Mas o assunto só ganhou repercussão no Brasil neste fim de semana, após divulgação de nova matéria do Proof, que aprofunda as ligações de Eduardo com outros integrantes do chamado “conselho de guerra”.
– Detalhes anteriormente desconhecidos da reunião de Lindell-Bolsonaro em 5 de janeiro podem estabelecer ligações entre o círculo interno de Trump e a insurreição de 6 de janeiro e o ataque ao Capitólio – diz trecho da reportagem de Abramson.
O jornalista afirma que há indícios de que Eduardo participou de reuniões com o grupo “conspirador” entre os dias 4 e 5 de janeiro, aponta as ligações dele com a família Trump e outro suposto integrante do grupo com negócios no Brasil. O Congresso em Foco procurou o deputado para comentar o assunto, mas ainda não houve retorno.
Em live transmitida da rua pelo Instagram no dia da invasão, Lindell disse que havia provas mais que suficientes de fraude eleitoral e que tinha certeza de que o republicano continuaria à frente do país pelos próximos quatro anos. Ofegante enquanto caminhava, o americano citou ainda ter se reunido na véspera com o filho de Jair Bolsonaro (veja vídeo, com tradução, mais abaixo).
Naquele mesmo dia, o filho do presidente brasileiro publicou nas redes sociais uma foto ao lado de Lindell, identificado pelo deputado como um “ex-drogado” que virou um grande empresário. A foto foi publicada nos stories do Instagram por volta das 18h do dia 6 – momento em que parte da turba que invadiu o Congresso estava se retirando do prédio, e um toque de recolher estava sendo iniciado sob ordens da prefeita Muriel Bowser.
Mas, conforme observa o Congresso em Foco, há indício de que a foto não tenha sido tirada naquele momento. No vídeo citado acima, gravado pela manhã, Michael Lindell aparece com terno azul, gravata listrada e broche de cruz – roupas diferentes da foto postada minutos antes pelo parlamentar brasileiro. É a mesma roupa que ele usa em uma live à tarde, já no momento da invasão.
É o mesmo traje usado por ele, na sequência, em uma entrevista ao canal de TV Newsmax, dada pouco depois da live, o que indica que ele não estava com Eduardo na hora em que o filho do presidente divulgou a reunião com ele. O vídeo da live foi publicado no Twitter, em versão traduzida, pelo jornalista brasileiro Samuel Pancher.
De acordo com reportagem de Olivia Little, o encontro entre eles ocorreu no dia 5, em uma reunião com a participação de ao menos outras 20 pessoas na residência particular do então presidente, no qual foi discutida a invasão. O conselheiro do ex-presidente é apontado como financiador da usina de contestações do resultado da eleição nos Estados Unidos e é processado por espalhar fake news contra o presidente Joe Biden durante a campanha. Por causa das mentiras que disseminou, ele foi banido do Twitter.
– Com uma nova reportagem de Olivia Little da Media Matters sobre sobre quem Mike Lindell encontrou na noite de 5 de janeiro e, além disso, sobre as pessoas com quem passou os ‘dois dias’ anteriores ao Dia da Insurreição, a lista dos presentes no infame ‘conselho de guerra’ de Trump na ‘residência privada’ no Trump International Hotel está agora crescendo a um nível que ninguém poderia ter previsto – diz o autor, Seth Abramson.
Escritor e colunista da revista Newsweek e passagem pela CNN, BBC e CBS, Abramson afirma que essas duas dezenas de pessoas tramaram a revolta na capital americana. Entre os 22 nomes apontados pela reportagem, estão Lindell, Eduardo, os dois filhos mais velhos de Donald Trump, empresários, senadores e ex-assessores do republicano.
Um deputado do círculo próximo de Eduardo disse na ocasião ao Congresso em Foco, ao ser perguntado sobre o paradeiro do colega brasileiro, que não tinha notícias do filho do presidente, mas que sabia que estaria “passando férias nos Estados Unidos”. As férias de Eduardo, porém, estavam registradas em seu Instagram com terno e gravata: na terça-feira (5), o parlamentar foi recebido na Casa Branca a convite da filha de Trump e conselheira política do pai, Ivanka Trump.
– Ocasião para reforçar os laços entre os nossos países e para uma agradável conversa – ressaltou o parlamentar, acompanhado de sua esposa, a psicóloga Heloísa Bolsonaro, e sua filha recém-nascida, Georgia Bolsonaro.
Na véspera, Heloísa havia publicado imagens de uma casa onde aparentava estar hospedada na Virgína, estado vizinho a Washington e onde mora o escritor Olavo de Carvalho, principal articulador ideológico do bolsonarismo. Eduardo não aparece em nenhuma das imagens.
No dia seguinte à invasão do Capitólio, novamente acompanhado da esposa e da filha, o “zero-três” foi até a sede do CPAC, sigla em inglês para “Comitê de Ação Política Conservadora”. Na pauta do encontro com o CEO da cúpula, Matt Schlapp, detalhes para a segunda edição da Cúpula no Brasil, que deve ocorrer ainda neste ano. A primeira ocorreu em 2019 e contou com diversos membros do gabinete de Jair Bolsonaro – exceto o presidente, que foi representado por Eduardo.
O governo brasileiro não condenou a invasão ao Capitólio. Um dia após o episódio, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, disse que o povo norte-americano se sentia “agredido e traído” por sua classe política e desconfiava do resultado do processo eleitoral que deu vitória a Joe Biden. Ele defendeu que as pessoas que invadiram o Congresso, depredando e saqueando a sede do poder Legislativo do país, não fossem chamadas de “fascistas”.
– Há que reconhecer que grande parte do povo americano se sente agredida e traída por sua classe política e desconfia do processo eleitoral – escreveu o chanceler em uma série de mensagens no Twitter sobre a eleição de Joe Biden.
E defendeu que fosse investigada a participação de “infiltrados” no movimento, além de considerar que as pessoas que invadiram o Congresso, depredando e saqueando a sede do poder Legislativo do país, não podem ser chamadas de “fascistas”.