Na Cachoeirinha dos vazamentos, proximidades e ousadias, Maurício Medeiros (MDB) que se cuide. A fila anda se o prefeito afastado Miki Breier (PSB) for cassado pelas acusações que detalhei em As supostas provas secretas anexadas ao impeachment em Cachoeirinha; 20 milhões bloqueados, códigos da propina e o ’Fundo de Investimentos Miki’.
Reputo o que ainda permite que o prefeito em exercício não seja refém dos vereadores são falhas dos ritos de abertura do quarto impeachment nesta terça-feira.
Explico.
Começo pela fragilidade da aceitação da denúncia do impeachment por 12 a 1, com 3 impedidos e sem a necessidade de a presidente Jussara Caçapava (PSB) votar, o que reportei em Câmara aceita denúncia de impeachment de Miki: Presidente já acusou prefeito afastado de integrar organização criminosa; Sartre, o inferno e o céu.
Os suplentes não foram convocados para substituir os impedidos: Mano do Parque (PSL), por ser o autor do pedido de impeachment; Marco Barbosa (PP), pelo cunhadio com Miki; e Gilson Stuart (PSB), por ser um dos denunciados pelo Ministério Público.
Diz o artigo 5º do Decreto 201/1967, que regulamenta os processos de impeachment, que “será convocado o suplente do vereador impedido de votar, o qual não poderá integrar a comissão processante”.
Por analogia, o mesmo artigo se aplica a Priscila Barra (PSD), escolhida relatora da comissão. Ela ocupa o mandato precariamente, já que é suplente de Juca Soares (PSD), que pode voltar a qualquer momento ao cargo do qual está afastado após ser preso por suspeita de ter a campanha financiada pelo irmão que supostamente chefe de facção envolvida com o tráfico de drogas, como tratei em artigos como Vereador é investigado por suspeita de ter campanha eleitoral financiada por facção criminosa.
Dos Grandes Lances dos Piores Momentos, o caso do presidente da comissão processante David Almansa (PT) lembra até Sérgio Moro, algoz de seu ‘Lula livre’ e chamado inclusive de “juiz ladrão” após ser desmascarado na ‘Vaza Jato’.
A suspeição pode ser colocada no tapetão pela mistura dos papéis de juiz e promotor de acusação.
Não pelo vereador em entrevistas ter acusado Miki de chefiar uma organização criminosa responsável pelo maior escândalo de corrupção da história de Cachoeirinha, o que analisei no Seguinte: em Vereadores tem medo de ser investigados, diz Almansa; CPI do Miki não tem assinaturas.
É que Almansa, ao lado dos vereadores Mano, Marco, Edison Cordeiro e Nelson Martini, é assistente de acusação no pedido para compartilhamento de provas feito pelo advogado Adriano Luz à 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça.
A autorização pelo desembargador Rogério Gesta Leal garantiu a inclusão em anexo do impeachment de supostas provas que estavam sob segredo de justiça, como detalhei em EXCLUSIVO | Justiça autoriza uso de provas contra Miki por CPI e impeachment; Bomba da noite coloca segredo de justiça em xeque.
Outra falha: a peça do impeachment e o anexo não foram lidos na íntegra. Determina o artigo 5º do Decreto 201 que “… de posse da denúncia, o Presidente da Câmara, na primeira sessão, determinará sua leitura e consultará a Câmara sobre o seu recebimento…”.
Pode parecer filigrana, frente a uma narrativa do MP que apresenta Miki não apenas como beneficiário de cerca de R$ 1 milhão em propinas, mas praticamente como sócio de uma empresa de empresário amigo, que teria sido adaptada para fraudar a licitação a limpeza urbana com um prejuízo de R$ 3 milhões.
Acontece que o processo de impeachment se resume a política e ritos; assustadoramente, já que guarda governantes em cativeiro de chantagens políticas, o mérito é um detalhe.
Uso exemplo que testemunhei.
Rita Sanco (PT) foi cassada em Gravataí sem nenhuma denúncia de corrupção e, 10 anos depois do golpeachment, não restou nenhuma condenação. Ela foi cassada pelo entendimento político de uma maioria de vereadores.
Tentou 22 medidas judiciais para barrar o impeachment e perdeu todas porque os ritos do processo foram considerados perfeitos. A cada decisão, a Justiça de Gravataí, o TJ e o STJ explicaram não poder julgar o mérito por representar interferência do Judiciário no Legislativo.
Podemos lembrar também de Dilma Rousseff (PT), vítima de um golpeachment por ‘pedaladas fiscais’ cometidas por presidente antes e depois da cassação.
Em resumo: se os políticos somarem votos para cassar, cassam.
É por isso que aposto não se tratar de “se”, mas “quando” a defesa de Miki tentará derrubar o processo judicialmente. Não deve acontecer neste momento porque, teoricamente, há 12 votos para aprovar a abertura de um outro impeachment. E são os votos necessários para o quórum qualificado da cassação.
Aí entra o alerta para Maurício. Melhor para ele é ter Miki, hoje um cadáver político, como seu espantalho para espantar aves de rapina. Experiente, já deve calcular que os mesmos 12 votos para impichar Miki também podem cassá-lo.
Por vezes, proximidades à parte, vereadores de 'governo' e 'oposição' se misturam, como devem fazer no mês que vem para eleger Felisberto Xavier (PSD) presidente da Câmara.
Ou acredita o prefeito em exercício ser coincidência ter vazado para o Real News, site de Canoas, depoimento do vereador Brinaldo Mesquita delatando a promotor que, quando secretário de Infraestrutura e Serviços Urbanos, em 2017, cumpria ordens do “prefeito e do vice” para aceitar planilhas supostamente fraudadas pela SKM em um desvio milionário no contrato de limpeza urbana?
O próprio Maurício confirmou encontros "institucionais" com o dono da SKM, na entrevista ao Seguinte: Maurício Medeiros, novo prefeito de Cachoeirinha fala sobre tudo: obras, previdência e reajuste do funcionalismo, Mato do Julio, eleições de 22 e 24, corrupção ou inocência de Miki.
Com a cassação de prefeito e vice até o fim de 2022 teríamos nova eleição. Há muitos grupos políticos e econômicos interessados em tomar a Prefeitura de assalto. Se Miki cair, a fila anda…
Não manifesto desejos neste artigo. Não tenho político de estimação e nem caço-cliques metralhando presunções de culpa no teclado no Grande Tribunal das Redes Sociais. São os fatos, aqueles chatos que atrapalham argumentos.
Ao observar alguns políticos travestidos de Diógenes, de lanterna na mão procurando um homem honesto, lembro Aquenda, do genial compositor e performer piauiense Getúlio Abelha:
“Ai meu Deus, o meu filho de calcinha / Como é que eu vou explicar pras criancinhas? / Oh, my dad, você pare de frescura / E vá ensinar pra elas o que foi a ditadura”
“Isso sim é um problema / Isso sim é uma sequela / E eu ainda nem contei / A história da galera”.
Ao fim, repito mais uma vez: pobre Cachoeirinha!
Seja Miki, Maurício ou um novo prefeito, se as relações políticas municipais não avançarem para um mínimo republicanismo, restará um refém em cativeiro Prefeitura.
E não terminou nem o primeiro ano de governo…
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