O prefeito Luiz Zaffalon (PSDB) postou vídeo sobre a instalação de monumento a Lúcifer em Gravataí, polêmica que ganhou repercussão nacional, de G1 a Jovem Pan, e reportei em Com estátua de 5 metros, Gravataí terá o maior santuário dedicado a Lúcifer no Brasil; Os limites da polêmica e Sobre Gravataí, o Templo Satânico de 50 mil seguidores e o mal que faz estátua dentro de muitos.
Há, no vídeo, uma sugestão para adversários aloprados, mas que reputo valer também para seus aloprados.
Antes, vamos ao que disse o prefeito.
Zaffa explicou estar esclarecendo “uma polêmica que surgiu nas redes sociais me atingindo, atingindo ao governo, a Prefeitura”.
– Nem começou a campanha ainda, mas a baixaria, a acusação, o baixo nível já chegou – disse.
O prefeito reforçou o que já comunicou nota oficial divulgada ontem: o terreno é privado e não há dinheiro público destinado ao santuário.
– A Prefeitura não tem nada a ver com isso – disse.
O sítio foi comprado pela “Nova Ordem de Lúcifer na Terra” e a estátua de cinco metros e uma tonelada, a um custo de R$ 35 mil, também.
Zaffa buscou desfazer a confusão entre o monumento da seita e a imagem de Exú Bará instalada em área pública, no Distrito Industrial, também sem recursos públicos, autorizada a partir de projeto “aprovado por unanimidade pela Câmara de Vereadores” e sem veto da Prefeitura.
– Proposição de um vereador da casa lá que… – diz no vídeo, que tem um corte neste momento, em que faz uma expressão que cada um que assistir pode interpretar, referindo-se ao autor, o presidente do legislativo no 2023 da aprovação, Alison Silva (MDB), seu adversário político e ligado ao ex-prefeito Marco Alba (MDB), concorrente na eleição deste ano assim como Daniel Bordignon (PT).
Aí é preciso pontuar um erro na fala do prefeito. O PL 164/2023 não foi aprovado por todos os vereadores. Segue a ata de votação – onde há votos contra e ausências, principalmente das bancadas evangélica e da causa animal, e neste artigo não entro no mérito – e, abaixo, sigo.
– Aquele (o monumento a Exú) é uma coisa, teve projeto, foi analisado, autorizado, esse do Lúcifer não tem nada a ver com a Prefeitura. As pessoas dentro de seus terrenos fazem homenagem a quem quiser – reforçou o prefeito, citando caso de amigo criador de cavalos que colocou em sítio estátua de animal que perdeu.
– A Prefeitura não entra nisso. A lei permite – reforçou.
Zaffa também usou o princípio constitucional que garante a liberdade de crença, “mas sem privilégios”, para dizer que não autorizaria a instalação do monumento em área pública.
– Teria vetado. Sou contra, somos uma sociedade majoritariamente cristã – disse, acrescentando que religiões de matriz africana também “tem liberdade aqui na cidade”, “praticam tão bela cultura” e aprovou leis que “facilitam alvarás” para templos.
– É uma sociedade que vive em paz, em tranqüilidade – disse.
O prefeito informou que a Procuradoria Geral do Município vai “fiscalizar”, caso o projeto na área privada “se tornar algo diferente do proposto” – ou seja, se o sítio da “Nova Ordem de Lúcifer na Terra” for além da instalação do monumento e se tornar um ponto para turismo da demonolatria.
Zaffa também se apresenta no vídeo como “cristão, humanista”, que “respeita liberdade de culto” e batizou filhas “e, esses dias, meu neto, na Igreja da Corcunda”.
– Eu, evidentemente, sou contra. Mas é uma homenagem que um cidadão quer fazer para algo que ele professa, e ele tem liberdade para isso – reafirmou, sobre o monumento a Lúcifer.
Zaffa fez um apelo para adversários não fazerem “política baixa” e disse que “mentirosos de plantão” e “o pessoal que semeia discórdia”, “já estão com o demo na cabeça”.
– Vamos parar com baixaria, com mentiras, com acusações – disse, sugerindo “apresentar propostas” e “trabalhar por Gravataí”.
– Seguimos com Cristo, com Deus, com nossa crença, que a vida vai ser boa para todo mundo – concluiu.
Reputo correta a manifestação do prefeito no que diz respeito à institucionalidade. Sobre a religião que professa, não me interessa: o Estado é laico.
Não deve e nem há garantias legais para a Prefeitura interferir na liberdade de culto, nem no direito à propriedade da “Nova Ordem de Lúcifer na Terra”.
E resta na garantia constitucional da liberdade de crença sem privilégios o acerto da Câmara em aprovar – e ele, Zaffa, não vetar – o monumento a Exu Bará (oriundo da mobilização de religiosos de matriz africana, não de uma seita), mesmo que gentrificado ao Distrito Industrial, quando temos um monumento à Bíblia na praça central que carrega o mesmo nome.
Em relação ao oportunismo político, entendo a recomendação do prefeito aos adversários vale também para apoiadores seus.
Se li posts e recebi materiais pelo WhatsApp ligando-o ao monumento a Lúcifer, também li e recebi outros ligando adversários – que, por obvio, não foram produzidos pelos próprios.
Minhas quase três décadas de jornalismo e cobertura política me permitem ao menos achar que consigo identificar quando vídeos e memes são produzidos por malucos de internet ou por gente ligada à política.
Então, por lógica o apelo de Zaffa vale também para aloprados simpáticos à sua candidatura.
Fato é que a repercussão dessa polêmica boba é assustadora. São tempos de delírio e intolerância.