3º NEURÔNIO

Você não se pertence mais 

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O momento atual é muito grave e pede atenção. Pede que você, mulher, pare e analise ao seu redor. Pare tudo o que está fazendo, volte uma casa e pense se os tempos atuais condizem sobre a sua presença na Terra, se ela é válida, legítima, se você poderia estar aqui — porque quase tudo que vem acontecendo escancara que não, você não pode. Parece exagero? Não é. 

É impressionante que, em pleno século 21, depois de tantas conquistas, ainda sejamos tratadas como lixo, sendo impedidas de viver nossas particularidades, nossas contradições, sermos donas dos nossos corpos. É simbólica a forma como aquele sujeito, chamado Léo Dias, se referiu ao caso “Klara Castanho”, informando, em entrevista a Danilo Gentili (um sujeito misógino e racista) que a história que ele não podia contar sobre a atriz se tratava de “uma ‘maldade’, que ‘a conta iria chegar’”, dizendo isso com um sorriso enorme estampado no rosto. Outra questão tão grave foi a forma como a juíza catarinense se referiu ao estuprador da vítima de 11 anos, chamando-o de “pai do bebê”. Esses só são alguns exemplos de como a existência das mulheres está mais do que nunca sendo questionada, violada, desonrada, agredida, exposta. Que nunca foi tão fácil sofrer uma violência como agora, que nossos corpos já não nos pertencem mais, que estamos sendo esmagadas pelo patriarcado.  

Talvez você tenha sorte e não tenha sofrido nenhum tipo de violência na vida, como a que eu sofri, recentemente, e isso que não ela não foi das piores se comparado a de Klara e da menina de 11 anos, que grávida, lutava pelo direito de abortar. Talvez você tenha sorte por nunca ter sofrido nenhum trauma, ou ter tido, como eu, um vizinho que ameace te bater se você não mandasse seu filho ficar quieto, porque senão todo mundo vai apanhar, oras, quem vocês pensam que são. Se passou incólume ao aborto, ao estupro, espancamento e ameaça, sorte sua, mas não se engane: nem só de picos de horror vive o patriarcado.  

Pequenas ou grandes violências, o que importa é que o machismo anda insuportável no Brasil da Damares, da Fontenelle e você sabe mais de quantos outros seres inomináveis. No Brasil no pânico moral, do tabu, os valores estão se invertendo rapidamente, e parece mentira que estamos retrocedendo tanto. Mas estamos, sim e é péssimo gritar sem ser ouvido. 

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