Deu na Folha de S. Paulo desta sexta:
“Se precisar fechar, fecha', diz secretário de Guedes sobre a GM – Declaração de Carlos da Costa sinaliza que governo vai resistir a eventuais pedidos de incentivos.
Vamos à notícia e depois comento, já que o horror está instalado em Gravataí, onde só em 2018 entraram R$ 70 milhões, metade da arrecadação do ICMS e um pinote da montadora representaria um cataclima para futuras gerações, já que a região poderia se tornar um bolsão de desemprego, miséria e violência.
A reportagem informa que o governo de Jair Bolsonaro dá sinais de que pretende resistir a eventuais investidas da General Motors de pleitear incentivos tributários ou qualquer outro tipo de apoio federal para manter as operações no Brasil.
A jornalista Raquel Landin reporta que em um encontro reservado com o alto escalão da montadora, Carlos da Costa, secretário especial de Produtividade, Emprego e Competitividade do Ministério da Economia, foi assertivo:
– Se precisar fechar (a fábrica), fecha.
Segundo relato de pessoas do setor privado, o comentário foi feito durante reunião de pouco mais de meia hora – prestem atenção à data – em 4 de janeiro, entre o secretário e o vice-presidente de Relações Governamentais da GM no Brasil, Marcos Munhoz.
Ainda conforme a Folha, Munhoz relatou a Costa que a chefia da montadora considerava as fábricas de São Caetano do Sul (Grande São Paulo) e de São José dos Campos (interior paulista) praticamente “inviáveis” por causa dos altos custos.
O executivo enfatizou, por exemplo, que, enquanto a PLR (participação nos lucros e resultados) chega a R$ 20 mil por funcionário em São Paulo, não passa de R$ 7 mil em Gravataí.
A argumentação, contudo, não parecia sensibilizar o secretário, um dos principais auxiliares do ministro da Economia, Paulo Guedes. Munhoz, então, foi direto:
– Corremos o risco de fechar (as fábricas).
O secretário devolveu:
– Se precisar fechar, fecha.
Conforme a reportagem apurou, a declaração gerou mal-estar entre os presentes na reunião, uma vez que a GM emprega mais de 13 mil pessoas em São Caetano do Sul e São José dos Campos.
A montadora não chegou a apresentar no encontro nenhum pleito específico ao governo federal. A GM vem ameaçando deixar a América do Sul caso não rentabilize suas fábricas na região, principalmente em São Paulo.
Na semana passada, Carlos Zarlenga, presidente da montadora no Mercosul, enviou um email aos funcionários sobre o assunto. Na mensagem, ele dizia que a GM Brasil teve prejuízo de 2016 a 2018, e que 2019 seria um ano decisivo.
Ele reproduzia ainda declarações da presidente global da companhia, Mary Barra, à imprensa americana, em que admitia a possibilidade de sair da América do Sul. Poucos dias depois, a GM apresentou aos sindicatos uma extensa pauta de negociação dos direitos trabalhistas para que possa continuar operando no país.
Ouvido pela Folha, o secretário da Fazenda de São Paulo, Henrique Meirelles, também admitiu que estuda a possibilidade de socorrer a GM antecipando crédito de ICMS.
Já o presidente Jair Bolsonaro, que se elegeu com um discurso de redução de subsídios e abertura do mercado ainda não se manifestou oficialmente sobre o assunto.
Segundo apurou a reportagem, técnicos do governo federal vêem as reclamações da montadora com estranheza, pois, quando a GM enfrentou forte crise nos EUA, entre 2008 e 2012, as operações na América do Sul seguraram os resultados.
Quatro dias após o encontro com representantes da GM, Costa disse em uma reunião com diferentes representantes do setor produtivo que havia três temas proibidos no governo: subsídios, proteção e mais gasto público.
Procurado pela Folha, o secretário afirmou em nota que se reúne rotineiramente com representantes do setor privado e que vem afirmando aos empresários que “precisamos tornar o Brasil produtivo e competitivo, retirando entraves que o impedem de produzir mais e melhor”.
A GM não comentou.
Em dois artigos, em dezembro e nesta semana, já tratei do tema no Seguinte:. Em Onde a Gravataí da GM encontra a mulher do Bolsonaro e a filha de Moro, indiretamente, ao alertar sobre os riscos para a GM, e, consequentemente, para Gravataí, da nova política – ou não política – anunciada pelo governo Bolsonaro para o Mercosul.
Escrevi:
"(…)
Nesse Show de Truman – sim, parece cada vez mais real o filme que chegou aos cinemas há 20 anos como uma ficção científica quase distópica (e a personagem de Jim Carrey somos nós) – pouco se sabe sobre as primeiras medidas que o futuro presidente vai tomar. Para Gravataí, algumas diatribes da transição, tuitadas ou ditas em improvisadas lives e entrevistas coletivas, ou em convescotes a embasbacados empresários, não parecem nada boas.
Mas tem outra coisa que preocupa, para além da “facada” que o superministro Paulo Guedes projeta no Sistema S, que pode fechar vagas de ensino técnico e profissionalizante na Gravataí da Escola do Sesi, e Silvestre Silva Santos tratou no Seguinte:, em artigo na semana passada. É que o ‘posto ipiranga’ da economia já disse que o Mercosul não é uma prioridade para o futuro governo. Isso pode representar outra facada – desta vez na GM, a grande paixão de Gravataí, responsável por quase metade da receita.
(…)"
E concluí:
"(…)
Certamente declarações dessas, se chegarem à prática, agradarão mais às montadoras chinesas, de olho no Mercosul, do que à GM da Gravataí onde sete em cada dez eleitores votaram no chefe do ‘posto ipiranga’.
(…)"
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Onde a Gravataí da GM encontra a mulher do Bolsonaro e a filha de Moro
Nesta segunda de temores apocalípticos para Gravataí, escrevi em O blefe da GM; quem paga esse almoço?:
“(…)
Não seria o caso de debitar esse e-mail-bomba de Zarlenga num 'Posto Ipiranga'? Paulo Guedes, a quem Bolsonaro terceirizou a condução da economia (pelo menos na conversa para agradar o mercado), tem falado não só em rever protecionismos como os do Mercosul, mas em acabar com incentivos setoriais em todo Brasil – como são os concedidos pelo Regime Automotivo inaugurado em 95 por FHC, estendido por Lula, Dilma e Temer. Em outras palavras, o Regime dá autorização, e dinheiro do BNDES, do BRDE e de bancos estaduais, como o Banrisul, para guerra fiscal que, desde os anos 90 turbinou a instalação da GM no RS, a Renault no Paraná e a Ford na Bahia e concentra na indústria automobilística a maior parte dos recursos internacionais que chegam ao Brasil – rentismo à parte!
Importante observar que o comunicado de Zarlenga acontece três dias depois de Bolsonaro receber Maurício Macri, presidente da Argentina, onde as GMs irmanadas tem capacidade para produzir até 5 milhões de carros por ano, mas para consumo quase que restrito ao Mercosul.
– Lá fora a GM tinha um market share pequeno, número 6 ou 7 no mercado. E esse é um mercado no qual se você não é número 1, ou número 2, é difícil criar escala e ganhar. A América do Sul é uma área de absoluta importância, estratégica, quase fundamental para a GM – dizia Zarlenga, em declaração que reproduzi no artigo de dezembro.
Para quem não sabe, o mercado automotivo é altamente subsidiado e os empregos custam caro. Na cadeia produtiva gaúcha e, principalmente em Gravataí, apesar de todo impacto, em população (do tamanho de uma Alegrete), nas consequentes demandas por serviços públicos e no orçamento municipal, que passou de R$ 37 milhões em 96, quando a fábrica foi anunciada, para R$ 700 milhões neste ano, os empregos diretos e indiretos não chegaram à metade dos 100 mil projetados nas manchetes do fim dos anos 90 – menos de 8 mil, aqui. É outra história se foi bom ou ruim, uma análise que confronta leituras de que se atraiu um dinheiro que não existia. Ou que se dividiu um recurso que não apareceu. Para Gravataí foi o paraíso, como aprofundo a seguir.
Mas, por óbvio, o recado de Zarlenga também mira os funcionários das – cada vez mais robotizadas – fábricas brasileiras, em São Caetano do Sul, São José dos Campos e Gravataí, para que não tencionem por aumentos de salários e mais participações nos lucros e resultados.
(…)
E concluí:
“(…)
Muitos fanáticos trataram por alarmismo o artigo que publiquei em dezembro, principalmente pela mídia nacional pouco repercutir os reflexos em Gravataí – nos veículos da imprensa estadual, então, não lembro de jornalistas alertando para a relação direta entre a lucratividade da GM e o mercado do Mercosul. Enfim, não deu na Globo ou na RBS, não existe! Mas até um googleada rápida mostra que esse negócio do século 20, que são as montadoras, sobrevive de incentivos fiscais e socorros públicos, tanto aqui quanto nos Estados Unidos. Qualquer sinal contrário, eles passam por cima.
De graça o comunicado de Zarlenga não foi. Se funcionários, ou contribuintes, alguém ainda vai pagar esse almoço.
There is no free lunch.
“(…)
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O blefe da GM; quem paga esse almoço?
O ‘pacote de maldades’, que é como sindicalistas estão chamando a lista de pautas apresentadas pela GM, confirma. O temor já tinha sido apresentado um dia antes, terça, pelo presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Gravataí, Valcir Ascari, o 'Quebra-Molas', em entrevista ao Seguinte:.
Relembre techos:
“(…)
– Antes de tudo quero ouvir os caras – diz Valcir, que assim que a bomba explodiu no pátio da fábrica com a afixação do e-mail de Zarlenga, já fez contato com o diretor de relações sindicais e do trabalho da GM, Artur Bernardo Neto, que vai receber os sindicalistas na próxima terça-feira, com a presença do prefeito Marco Alba.
Valcir lembra que a planta de Gravataí “é a mais enxuta” da América do Sul “e a que mais produz”.
– O mercado automobilístico é de altos e baixos. Aqui em Gravataí o terceiro turno vai e vem. Mas acredito que escapemos dessa.
O que preocupa Valcir nas negociações futuras é a troca de experiência com sindicalistas norte-americanos, que atestam que o fechamento de cinco fábricas da GM na América do Norte se deu também para reduzir custos com funcionários. Se nos EUA e Canadá se pagava um inicial próximo a 30 dólares a hora, no México se paga 10 dólares por dia – muito próximo do que acontece, por exemplo, em Gravataí.
– Infelizmente é assim, o capital vai onde ganha mais. E a vida do brasileiros está cada vez mais difícil depois da reforma trabalhista. É só notícia ruim. Só falta revogar a Lei Áurea – diz, citando o senador Paulo Paim, de quem, curiosamente, é quase um sósia.
(…)”
Concluí assim:
“(…)
A manchete do artigo que publiquei no Seguinte: nesta segunda, “O blefe da GM; quem paga esse almoço?”, parece estar com uma resposta cada vez mais próxima.
There is no free lunch.
'Free marmita', menos ainda.
(…)”
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O efeito Detroit na Gravataí pós-GM
Ao fim, seguremos o pânico em Gravataí, onde a GM sempre foi um bom negócio, apesar de inegável que a aldeia é vilã dos demais municípios, já que pelo menos os tributos diretos da GM só entrarão no orçamento gaúcho em 2033 – descontadas antecipações que os governos tem feito para pagar salários e fazer sumir no caixa único do RS – e o retorno cada vez maior que a cidade tem é bancado pelo rateio entre os impostos arrecadados pelos outros 496 municípios.
O fôlego de pelo menos uns cinco anos se dá porque já está sendo feito o investimento de R$ 4,5 bilhões projetado pela GM no Mercosul como parte do ‘show do bilhão’ anunciado para a fábrica da aldeia. Desde 2014, já são R$ 13 bi na América do Sul. Entre os planos da montadora está liderar no bloco econômico o mercado de carros elétricos, com o lançamento de 20 produtos nos próximos cinco anos. Não há confirmação da montadora, mas o Seguinte: apurou que fevereiro deve ser o mês de um lay off, uma parada na produção, para adequar a fábrica à produção do novo carro, em cuja plataforma já teriam sido investidos pelo menos meio bilhão de reais. Assim, é lógico interpretar que, mesmo que o fechamento de fábricas não seja um blefe que mira pra fora (nos políticos) e para dentro (nos sindicatos) da fábrica, Gravataí será a última da lista a desligar os motores.
Aqui não vai flauta ou nenhum prazer mórbido de alguém que em poucas coisas concorda com o novo governo, até porque não sou secador de trabalhador e pobre, nem de empresário ou de quem quer que seja: mas, certou ou errado, que facada seria perder a GM por ação, ou inação, de um presidente que é um ‘mito’ na Gravataí onde fez sete em cada dez votos!
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