RAFAEL MARTINELLI

Ao cassar vereador de Cachoeirinha por suposto envolvimento com facção, TRE desarma ‘pauta-bomba’ da Câmara; A presunção da inocência, ainda

Juca, na sessão em que, por videoconferência prisão, decidiu eleição para Presidência da Câmara

O Tribunal Regional Eleitora (TRE) livrou os vereadores de Cachoeirinha de uma ‘pauta-bomba’, um dilema: cassar, ou não, o colega Juca Soares (PSD). Por unanimidade, a corte cassou o diploma do vereador sob a acusação de ter a campanha eleitoral financiada por facção criminosa.

Como reportei ontem em Preso por um ano, vereador Juca renova licença hoje na Câmara de Cachoeirinha; A sagrada presunção da inocência, o político, que está preso na Cadeia Pública desde 3 de agosto do ano passado, tentava renovar sua licença do cargo, hoje ocupado pela suplente Priscila Barra.

Com a cassação, a composição da Câmara vai mudar. O TRE ainda não apresentou o recálculo dos votos.

Como o processo corre em segredo de Justiça, a transmissão saiu do ar no momento do julgamento do líder comunitário.

O desembargador relator Gerson Fischmann publicou apenas a conclusão do acórdão.

“… Por unanimidade, afastada a preliminar de nulidade, negaram provimento ao recurso, mantendo a sentença e a condenação à cassação do diploma de vereador. Prequestionada toda a matéria invocada nos autos, e declararados nulos, para todos os fins, os votos atribuídos ao recorrente, devendo ser realizado o recálculo dos quocientes eleitoral e partidário. Após a assinatura do acórdão, comunique-se esta decisão à respectiva Zona Eleitoral, apara cumprimento e registro das sanções nos sistemas pertinentes…”

Juca ainda pode recorrer da decisão.

Nesta quarta-feira se completam dois anos desde que Juca está recolhido à na Cadeia Pública, após ser um dos alvos da Operação Cidade de Deus, sob suspeita de ter a campanha financiada pelo irmão que supostamente chefia facção envolvida com o tráfico de drogas, como o Seguinte: reportou em Por que vereador de Cachoeirinha foi preso na operação Cidade de Deus.

Não é ser do contra, mas, como não é possível ter acesso aos autos do processo, mantenho o que escrevi ontem, sobre a questão criminal que envolve o, agora, ex-vereador. Goste-se ou não, e mesmo que o Grande Tribunal das Redes Sociais não permita aos políticos nada além da presunção de culpa, é preciso garantir a Juca a sagrada presunção de inocência.

Não se trata de ser contra ou a favor do crime. O Estado, a pretexto de punir criminosos, não pode se tornar um deles, ao violar garantias constitucionais. A punição precisa respeitar o devido processo legal – o que, registre-se, aconteceu na justiça eleitoral.

A presunção de inocência é um conceito lá da Revolução Francesa, de 1789, expresso na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Diz o artigo 9º que todo acusado deve ser presumido inocente, até que seja declarado culpado.

Em 1948, após os horrores do nazismo e do fascismo, foi consagrado na Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU. Diz o artigo 11 que “toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não se prova sua culpabilidade, de acordo com a lei e em processo público no qual se assegurem todas as garantias necessárias para sua defesa”.

Na Constituição brasileira está no artigo 5º, inciso LVII: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

Fatos, aqueles chatos que atrapalham argumentos é que, perante a Justiça criminal, Juca Soares ainda é investigado. Nem réu é. E na Câmara não foi processado pela Comissão de Ética. Inclusive, por manter os direitos políticos, foi autorizado pelo Tribunal de Justiça a, na última sessão de dezembro de 2021, em videoconferência transmitida da Cadeia Pública, ter sido o voto decisivo na eleição que escolheu Cristian Wasem (MDB) presidente da Câmara. Com a cassação do prefeito Miki Breier (PSB) e do vice Maurício Medeiros (MDB), o vereador é hoje o prefeito interino.

Ao fim, o TRE, por motivos que correm em segredo de justiça, livrou os vereadores de uma bomba. E Juca resta, hoje, não mais como vereador, mas ainda um dos 679,6 mil presos sem condenação no Brasil, conforme dados de abril deste ano. Pode até vir a ser condenado criminalmente, assim como aconteceu, dentro da legalidade, na justiça eleitoral. Ainda não o foi.

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