Em que pese as fakenews presidenciais, que a agência de checagem Aos Fatos verificou e você lê clicando aqui, o minusculo discurso de Jair Bolsonaro no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, até foi bom, por inofensivo, ao estilo daquelas redações de colégio “minhas férias”, ou versões escolares pouco talentosas da Canção do Exílio, de Gonçalves Dias e “a terra de palmeiras onde canta o sabiá”.
O ‘mito’ belicoso deu lugar quase que a um poeta calado. Recitou platitudes e percorreu lugares comuns, principalmente para quem assistia ao longe os rolinhos revelados nos primeiros 22 dias de governo, e talvez só depois do discurso tenha recebido informações sobre a bomba de minutos antes, com OGlobo levantando suspeitas de ligações de Flávio Bolsonaro com milicianos envolvidos no assassinato da vereadora Marielle Franco.
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O presidente eleito com – arredondando para cima – quatro em cada dez votos, disse que sua primeira viagem internacional para Fórum era uma demonstração da prioridade que o governo dá às pautas ali discutidas.
– Assumi o Brasil em uma profunda crise ética, moral e econômica. Temos o compromisso de mudar nossa história – discursou o patriarca do clã Bolsonaro, lembrando ter vencido a eleição “gastando menos um milhão de dólares, com segundos de TV e atacado injustamente”.
Ao estilo do megalomaníaco “nunca antes na história desse país” de Lula, acrescentou que “pela primeira vez no Brasil um presidente montou uma equipe de ministros qualificados, honrando o compromisso de campanha e não aceitando ingerências político-partidárias que, no passado, apenas geraram ineficiência do Estado e corrupção”.
Sem dedo de arminha, ode à flexibilização da compra ou anúncio de projeto para liberar o porte, foi deixa para apresentar seu troféu, o ministro da Justiça Sérgio Moro:
– O homem certo para combater a corrupção e a lavagem de dinheiro.
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Descreveu o Brasil como “um paraíso pouco conhecido”, de vasta biodiversidade e belezas naturais, mas fora dos 40 principais destinos turísticos do mundo Bolsonaro.
– Vamos investir em segurança para que vocês nos visitem, conheçam nossa Amazônia, nosso Pantanal, nossas praias e cidades.
Passando por sobre a polêmica do aquecimento global – como que ainda voando no ‘AeroLula’, antes tão criticado, mas no qual viajou a Suíça – o presidente restringiu-se apenas a dizer que o Brasil “é o país que mais preserva o meio ambiente” e tem seu território ocupado por apenas 9% de agricultura e 20% de pecuária, “que alimentam boa parte do mundo”.
Pelo menos na beleza das palavras, Bolsonaro disse ter como missão “avançar na compatibilização entre a preservação do meio ambiente e da biodiversidade com o necessário desenvolvimento econômico, lembrando que são interdependentes e indissociáveis”.
Sem entrar em pormenores, prometeu “privatizações”, sem dizer quais, e “reformas”, sem citar nominalmente a previdenciária, tributária ou trabalhista, “para restabelecer a confiança do exterior no Brasil e facilitar a vida de quem deseja produzir e gerar empregos”.
– Queremos concluir o governo com o Brasil entre os 50 melhores países para fazer negócios. É um dos maiores compromissos do governo abrir nossa economia, ainda relativamente fechada – projetou, citando seu ‘posto ipiranga’, o ministro da economia Paulo Guedes.
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– O viés ideológico deixará de existir nas relações internacionais – disse, introduzindo seu exótico chanceler Ernesto Araújo, curiosamente… ideologicamente! crítico ao ‘globalismo’ que, se existe, tem sua morada em Davos, além, dirão terraplanistas, de algum castelo de George Soros na Hungria.
O Bolsonaro de campanha só apareceu – e suíço – na citação do lema “Deus acima de todos” e na defesa do “resgate dos valores, da família, da propriedade privada, do direito à vida e dos verdadeiros direitos humanos”.
– Queremos um Brasil grande, mas também um mundo de paz, liberdade e democracia – concluiu, citando uma tríade que talvez só não aplaudam loucos que simpatizam com hitlers, stalins, mussolinis ou pinochets da vida (e morte).
Ao fim, Bolsonaro não foi Adnet: foi moderado, talvez aconselhadamente despercebido. Não foi o ‘mito’ que fanáticos tanto amam as diatribes – o que, convenhamos, nos preserva, pelo menos até este momento, de uma vergonha alheia internacional.
Exagerando, palmas. Ser natural sempre é a mais difícil das poses.
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