No #DasUrnas, siga diariamente quem ganhou, quem perdeu, quem empatou e os números e análises da eleição de 2024.
David Almansa (PT) saiu maior, não menor da eleição de 2024 em Cachoeirinha. Neste artigo apresento uma análise sobre a derrota, um 7 a 1 eleitoral, mas não político, como gostariam torcedores.
Vamos à ‘ideologia dos números’.
A chapa Almansa-Dr. Rubinho (PSDB) recebeu 18.550 votos no último 6 de outubro – 28,14% dos votos válidos. Na eleição plebiscitária de 2024, o prefeito Cristian Wasem (MDB) foi reeleito com 47.364 votos (71,86%). Antes, na eleição suplementar de 2022, Almansa, segundo, e Rubinho, terceiro, somaram 36.860: 19.430 votos (25,62%) e 17.430 votos (22,98%), respectivamente. Cristian, herdeiro envergonhado da base política do prefeito cassado Miki Breier (PSB), fez 51,4% dos votos válidos, 38.987.
Ah, então Almansa diminuiu – em relação a ele próprio e, mais ainda, observando a soma com os votos do vice!?!
Política não é matemática simples. É uma ciência de circunstâncias, de ‘verdades múltiplas’.
Almansa sai da eleição com 30% do eleitorado, percentual histórico da esquerda em cidades metropolitanas nas últimas décadas, mas que outros não conseguiram em 2024, como o prefeito e deputado por dois mandatos Daniel Bordignon, em Gravataí.
Inegavelmente, consolida-se o jovem de 33 anos como uma liderança regional do lado canhoto da ferradura ideológica – em uma eleição na qual o eleitor de Cachoeirinha aposentou políticos da velha guarda, que tinham mandato, ou tentavam voltar; vide a renovação na Câmara de Vereadores.
Resta Almansa, mesmo com o 7 a 1, e o PT, como a única oposição com tamanho para sobreviver ao governo Cristian.
O PL, que sob o comando nacional de Bolsonaro atirou no PT antes de buscar protagonismo em muitas das eleições municipais, foi decisivo em Cachoeirinha, e não se sabe ainda se terá o reconhecimento em cargosna Prefeitura pelo ‘apoio crítico’, ou ficará na oposição.
Qualquer candidatura do PL aparecia com 14% dos votos, até o partido ser obrigado a apoiar Cristian, pelo deputado Luciano Zucco, companheiro de pescaria do inelegível quando do atraque da Polícia Federal em Angra.
Fato é que o PT teve dois vereadores eleitos em Cachoeirinha: Léo da Costa, o campeão de votos do município (3.117) e Gustavo Almansa (1.491), irmão do candidato a prefeito.
Desde 2016 o partido não tinha bancada. Em 2004, quando José Stédile foi reeleito prefeito, Vicente Pires, Leonel Matias e Rosane Lipert conquistaram vagas na Câmara. Em 2008 e 2012 só Rosane foi reeleita. Em 2016, Almansa foi o 11º mais, mas não foi um dos 17 eleitos por falta de coeficiente eleitoral do partido. Só em 2020, com ele, o PT voltou à Câmara.
A federação partidária PT-PCdoB-PV somou 8,5 mil votos em 2024. Com o PSDB do vice, 10 mil. Os candidatos da coligação de Cristian chegaram a 52 mil. É gente pedindo votos nas ruas, nos grupos de zap.
Politicamente, e aí também pela matemática simples, a participação do PSDB e de Rubinho, 1.500 votos, com o vereador Deoclécio Melo não reeleito, permite avaliar a aliança como um erro. O inédito, PT e PSDB juntos, fica só folclore, por mais afinidade que tenham tido Almansa e Rubinho na campanha de rua e nas redes sociais.
A coligação ‘MarxDonalds’, chancelada com um vídeo tímido do governador Eduardo Leite (PSDB), compartilhado apenas às vésperas da eleição, não colou junto ao eleitor – nem de centro ou direita, para ampliar a votação, menos ainda de esquerda.
A política de ‘frente ampla’, tentando emular o que Lula fez na eleição presidencial, não ganhou impacto em uma eleição municipal onde o adversário nunca se apresentou como ‘bolsonarista raiz’, não é do rol de políticos extremistas, responsáveis pelo ódio que separa famílias, negacionistas cúmplices de mais de meio milhão de mortes na pandemia ou golpistas delirantes que estimulam contatos extraterrestres ou reza para pneu.
O ‘MarxDonalds’, sim, tirou o tesão de alguns da ‘esquerda raiz’, bagunçou internamente o PT, e, aí é engenharia reversa, após o prédio ruir, mas impediu mostrar a recente cicatrização do cordão umbilical que unia o governo Cristian ao ex-prefeito Miki, hoje um cadáver político; leia em 3 anos após afastamento, Miki resta um homem inocente, mas assassinado politicamente.
Como colocar Miki como um espantalho governista, se na coligação de oposição bastava cavocar para surgir Stédile e secretários afastados junto ao ex-prefeito sob suspeita de corrupção?!?
Há de se analisar também o lado vencedor, o que já fiz em #DasUrnas | O 7 a 1 de Cristian: o ‘povo pelo povo’ escolheu seu ‘prefeito pelo povo’ em Cachoeirinha – e é um texto necessariamente complementar a este.
Primeiro, Cristian é um ‘político teflon’. Escrevi:
“(…) A imagem do prefeito passou incólume pelo que em municípios do porte de Cachoeirinha teria potencial de escândalo: a Polícia Federal fez operações na Prefeitura e em sua casa, em investigações sobre suspeitas de corrupção. Mais: mesmo não tenha corrido do repórter como a gente já viu suspeitos fazerem no Fantástico, Cristian foi alvo de reportagem-denúncia de Giovani Grizzoti, anunciada na voz de Elói Zorzetto no RBS Notícias, por suposto superfaturamento de cestas básicas durante o período mais sensível da população gaúcha. Nada colou. Cristian provou ser ‘político teflon’ (…)”.
O eleitor também simpatizou com Cristian na enchente, mesmo Almansa também tenha calçado suas botas e, com o projeto Volta pra Casa, ajudado a limpar residências, com sua equipe – gente do governo até copiou a boa idéia, em sequência.
Também escrevi:
“(…) Antipetistas, Sebastião Melo (MDB) e Cristian não foram afogados politicamente pela enchente, mesmo tenham cuidado insuficientemente das casas de bombas – que, tanto aqui, quanto em Porto Alegre, ainda não funcionam plenamente, cinco meses depois da maior enchente da história do Rio Grande do Sul (…)”.
O que ganha complemento em outro artigo, no qual analiso a derrota de Bordignon em Gravataí, cujos atenuantes também cabem para Almansa; leia em #DasUrnas | Nem ‘Lula de Gravataí’, nem ‘Grande Eleitor’: a derrota de Bordignon tem diferentes culpas.
Anotei, ainda.
“(…) Incrível mas, mesmo com o maior socorro já liberado pelo governo federal para catástrofe em um estado da federação, até hoje tiozões e tiazonas do zap, e a sobrinhada toda, reclamam mais de Lula do que de Leite, de Sebastião Melo ou de seus deputados negacionistas do clima (…)”.
É a conta que chegou da campanha nacional de destruição ideológica da qual é alvo – da micro à macro mídia – o Partido dos Trabalhadores. Que, apavorado pelo golpeachment contra Dilma, resta seqüestrado pelo sistema. É descrito como o radical, mesmo que governe envergonhadamente moderado, frente a uma direita tão extremada quanto nunca antes visto na história deste país.
Fatos, aqueles chatos que atrapalham argumentos: quem tem hoje 25 anos, e começou a se ligar na política com 15, já assistiu ao vivo as manifestações contra Dilma naquilo que os beneficiários da antipolítica hoje chamam “GloboLixo”.
Também observo no artigo:
“A aposta de fazer campanha ‘no fundo da vila’ também já encontra a barreira do ‘Evangelistão’ e da ‘marçalização’, o fenômeno do ‘pobre de direita’. O ‘antissistema’ que identifica no PT o sistema, já que o partido venceu cinco das últimas seis eleições para o Palácio do Planalto, e com uma política econômica liberal, que comemora déficit zero, alta do PIB e classificação positiva de agências internacionais, resta domesticado nas ruas”.
E sigo:
Pudessem alguns, editariam para ‘petistas’, ‘esquerdistas’ ou ‘comunistas’ decreto nazista de 1° de setembro de 1941, criado para, conforme Goebbels, “tornar o inimigo visível”:
“(…) A estrela pintada de preto sobre um fundo de tecido amarelo, do tamanho de um pires de mão, com o dizer ‘Jude‘ […], deverá ser portada de forma visível, costurada sobre o peito esquerdo da vestimenta de todo judeu a partir dos 6 anos de idade (…)”.
Como também tratei no artigo sobre o vitorioso em Cachoeirinha, no estouro nacional do dique do ‘anticomunismo’, Cristian sempre foi mais palatável ao ‘Evangelistão’, o país do cada vez mais poderoso voto evangélico, mesmo professe da mesma fé que o adversário; este politicamente atingido de morte por um vídeo divulgado às vésperas da eleição no qual aparecia fumando um cigarro que pela confecção permitia a dúvida sobre ser um baseado de maconha.
Para divulgar seus feitos e atacar os adversários, sempre teve também uma milícia digital, de páginas e páginas nas redes antissociais, muitas administradas por comunicadores que ocuparam CCs na Prefeitura.
Já Almansa não teve nem a possibilidade de usar sua verve de bom tribuno no enfrentamento com Cristian, que fugiu dos debates e selecionou sabatinas na mídia simpática.
Ao fim, reputo Almansa sai maior do que entrou na eleição, mesmo com uma votação mais baixa. Estrela cadente, ao menos não é.
O futuro?
Com o partido assentado com bons quadros para fazer oposição na Câmara, talvez seja momento de ir a Brasília, trabalhar com o ministro Paulo Pimenta, seu padrinho político, e branquear os cabelos antes mesmo de descolorirem naturalmente, quem sabe articulando recursos federais para Cachoeirinha; sem ranços ideológicos.
O eleitor também gosta de ver currículo.
Até porque a próxima eleição para a Prefeituran (caso o grupo político ganhador em 2024 não rache na escolha do sucessor) será tão difícil quanto – ou mais.
Nesta eleição havia uma máquina eleitoral favorecendo Cristian, mas o governo era ruim. Impossível ser pior até 2028.