Março promete ser um mês agitado entre o gabinete da Secretaria da Saúde de Gravataí e a administração da Santa Casa. É que está iniciando o último mês em vigor do atual contrato do município com o Hospital Dom João Becker, nas linhas estabelecidas ainda com a gestão anterior do hospital. Após 31 de março, um novo contrato terá de ser assinado com a Santa Casa, por isso, o mês será de intensas negociações.
— Em resumo, queremos garantir mais serviços com os mesmos recursos. É uma matemática complexa, que exige cortar alguns serviços em benefício de outros mais necessários. Por exemplo, a pediatria é o nosso calcanhar de aquiles. Talvez, para ampliar este atendimento, tenhamos que cortar algo. Nosso desejo era de que a renovação do contrato envolvesse algumas reestruturações no hospital, o que aumentaria a capacidade de atendimento, mas talvez não seja possível. Ainda não chegamos a um denominador sobre as linhas do futuro contrato — disse, na manhã desta quarta, o secretário da Saúde, Jean Torman.
Ampliar cirurgias eletivas e de emergência, exames laboratoriais e maior capacidade de atendimento em especialidades estão entre os principais tópicos da discussão com os gestores do hospital.
Torman participou da reunião do Conselho do Desenvolvimento Econômico e Social (Codes) para explicar a sinuca de bico que representam as contas da saúde de Gravataí, empenhada com atrasos de repasses do Estado e ausência de outros repasses da União. Na relação com a Santa Casa, há apenas uma certeza: os repasses estão em dia.
O novo contrato, provavelmente, inclua R$ 10 milhões anuais a mais para o Dom João Becker em relação aos atuais R$ 30 milhões, como o prefeito havia se comprometido ao anunciar a Santa Casa como nova gestora do hospital.
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Foi justamente a nova gestãodo hospital que permitiu, entre outubro e dezembro do ano passado, um mutirão de cirurgias de catarata. Foram mais de 400 procedimentos e uma conta a mais no "caderninho" do Ministério da Saúde. É que, segundo a avaliação de Brasília, os resultados do mutirão não se adequaram aos critérios federais que merecessem o pagamento pelos procedimentos.
— Apresentamos os resultados e a justificativa foi de que, em 2015, tivemos mais procedimentos feitos por outro mutirão, mas o ministério desconsiderou que, desde então, reduziu a capacidade do hospital. E como consideraram um desempenho inferior, não repassaram os valores para essas cirurgias — relata o secretário.
A maior fila por cirurgias
Em fevereiro, ele esteve em Brasília e levou para lá um pleito para que a longa fila de 11 mil cirurgias eletivas represadas em Gravataí — 25% de todas as cirurgias eletivas na fila de espera no Rio Grande do Sul — tenha solução. Voltou sem respostas, pelo menos por enquanto.
— O que nós queremos é que o Ministério da Saúde mude alguns critérios no repasse de recursos para cirurgias eletivas. Hoje, se o nosso hospital em Gravataí não tem capacidade para executar uma certa cirurgia, não podemos encaminhar o paciente para um hospital de Porto Alegre, por exemplo, porque a verba federal é específica para ser aplicada em procedimentos dentro da cidade. Ou seja, se não temos como fazer a cirurgia aqui, o governo federal não repassa o pagamento — explica.
O número dos sonhos do secretário seria de incluir no novo contrato com a Santa Casa uma meta de 500 cirurgias eletivas por mês, o que acabaria com a maior fila do Estado em dois anos. Mas este número é inatingível no Dom João Becker. Então, trabalha-se, segundo o secretário, para chegar a 200 eletivas/mês. No contrato atual com o hospital, são priorizadas cirurgias de urgência/emergência, com o pagamento correspondente à produção.
Dívida milionária do RS com Gravataí
Mas a bola de neve dos devedores à saúde de Gravataí não começa em Brasília. A capacidade do Hospital Dom João Becker em fazer mais cirurgias de catarata ou qualquer outra eletiva reduziu drasticamente nos últimos quatro anos como resultado da decisão do então governador José Ivo Sartori (MDB), que cortou o incentivo hospitalar para estabelecimentos que atendiam ao SUS. Sem esse repasse a mais, a dívida do Piratini com Gravataí chega a R$ 24 milhões — e é o fator preponderante para que 2018 não tenham fechado no azul as contas do município —, e, seja quem for o gestor do hospital, não está disposto a prestar os serviços sob risco de não receber.
Quando o governador Eduardo Leite (PSDB) honrará a dívida, ninguém sabe. Recentemente, sinalizou algo, com o repasse de cerca de R$ 1 milhão a Gravataí, de um total de R$ 60 milhões em todo o Estado.
— O problema é que, se entre governos e gestores de hospitais nós discutimos valores, números, a saúde real tem outra lógica. São pessoas que dependem de um atendimento, de uma cirurgia e, quando a Justiça manda fazer um procedimento por liminar, não adianta irmos cobrar do governo estadual. É o município quem arca — aponta Jean Torman.
Em meio a uma cobrança em Porto Alegre, outra em Brasília, uma boa notícia para Gravataí. Já está aprovada pelo Ministério da Saúde a ampliação da UPA da parada 74. Passara de uma unidade classe 2 para classe 6. Em resumo, aumentarão os repasses federais para a unidade, que ampliará o número de equipes de atendimento.