Os 13,8 mil alunos do primeiro ao quinto ano da rede municipal de Gravataí podem ficar sem livros didáticos neste ano.
A secretária da Educação, Aurelise Braun, explica que, ao aderir ao programa de distribuição de livros gratuitos do Ministério da Educação, recebeu em Brasília a garantia de entrega de obras entre o sexto e nono ano, além da “promessa” de inclusão do primeiro ao quinto ano.
– Ainda não chegaram e possivelmente não vão chegar – confirmou ao Seguinte:, nesta quinta-feira.
Conforme a secretária, a falta do material didático “não impede que as aulas sejam seguidas”.
– Aderimos ao Alfabetiza Tchê, programa do governo estadual para primeiro e segundo ano. Para os 8 mil alunos do terceiro, quarto e quinto ano formamos um grupo de trabalho para construir um plano de execução, onde professores usam seus planejamentos, conforme a realidade escola, sem prejuízo às aulas – argumenta.
Para entender a polêmica, é preciso contextualizar.
Após mais de R$ 100 milhões em investimentos na contratação de sistemas de ensino privados para fornecimento de livros e tecnologia, do Positivo e da Moderna, em seu governo e nos de Marco Alba (MDB), o prefeito Luiz Zaffalon (PSDB) decidiu aderir ao programa de livros gratuitos do Ministério da Educação.
Nota divulgada pela Prefeitura em dezembro de 2023 informava que, a partir de 2024, cerca de 140 mil obras seriam distribuídas para todos 27,5 mil alunos, permitindo uma economia de R$ 14 milhões ao ano.
Conforme a informação oficial, o Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD) distribuiria em média três livros por aluno entre o 1º e o 5º ano, e oito entre o 6º e o 9º, todos escolhidos pelas escolas e aprovados em avaliações pedagógicas coordenadas pelo MEC.
Fato é que, à época, não se falou em “promessa”.
Reproduzo o que escrevi, em dezembro do ano passado, em Após mais de 100 milhões em investimentos, Gravataí não vai mais comprar livros didáticos; A escolha pragmática de Zaffa pelo gratuito.
Abaixo, concluo.
“(…)
Os sistemas de ensino da Positivo e Moderna sempre foram apresentados pelos governos como o mesmo usado pelas mais conceituadas escolas particulares, de Gravataí inclusive.
Apesar da aprovação pela maioria das escolas após consulta governamental, a crítica à busca por uma padronização do ensino era uma constante por professores e seu sindicato, por diminuir a autonomia inspirada em Paulo Freire para elaborar planos pedagógicos conforme realidades locais – além do alto custo, pago com verbas da Educação.
A própria secretária municipal de Educação, Aurelise Braun, que na nota oficial distribuída pelo governo recebe o crédito pela articulação em Brasília para o recebimento dos livros gratuitos do MEC já para 2024, confirma.
– As obras contemplam todos os componentes curriculares, conforme a Base Nacional Comum Curricular. Estamos atendendo a um pedido frequente da nossa rede de professores para que a escolha seja mais democrática, e não impositiva. Assim, os educadores terão maior autonomia para desenvolver suas práticas pedagógicas e isso vai interferir positivamente no processo de ensino e aprendizagem – explica a também professora e ex-diretora de escola, que, entrando na análise ideológica, não leciona no ‘lado canhoto’ da ferradura ideológica.
Sigamos na política, então.
A medida de Zaffa tem relação com a III Guerra Política de Gravataí que trava com Marco Alba? Reputo sim e não.
Sim porque é mais uma decisão que descola o atual governo do anterior. E em uma das maiores polêmicas políticas das últimas três eleições. A oposição sempre criticou o investimento. Na campanha de 2020, com Alba como seu ‘Grande Eleitor’, Zaffa defendeu o modelo.
Não porque entendo que a medida de Zaffa tem mais a ver com questões pragmáticas, não políticas.
É fato que, além de investigações e apontamentos do Tribunal de Contas do Estado (TCE) sobre os gastos supostamente desnecessários, não resta comprovação, nos índices que medem a qualidade da educação, de que a contratação dos sistemas de ensino tenha se justificado.
Salvo melhor juízo, Zaffa simplesmente se convenceu de que é um investimento de risco. O Ideb não cresceu na mesma proporção que os gastos multimilionários.
(…)”
Sigo hoje.
Quando assumiu a Educação, a secretária Aurelise Braun foi questionada pelo prefeito Zaffa sobre os materiais didáticos da Positivo e Moderna.
A professora respondeu que achava “ótimo”, mas “para o Dom Feliciano, o Gensa, o Sinodal e escolas particulares”, e não para uma rede de ensino pública diversificada, com 75 escolas, 3,2 mil professores e quase 28 mil alunos de diferentes realidades.
Disse que, quando professores “não querem” ou “não entendem” a necessidade do uso, a aplicação de um sistema uniforme de ensino “é uma fantasia”.
Com aval de Zaffa, a secretária foi a Brasília inscrever Gravataí no programa de livros gratuitos do Ministério da Educação, o que economizaria R$ 14 milhões que seriam investidos em materiais da Moderna.
Voltou com uma garantia e – aí resta o erro – uma “promessa”.
Ao fim, certamente será cobrada, independentemente de estar certa ou errada sobre acabar com a ‘privatização’ do sistema de ensino.