Nesta segunda-feira (20), a Prefeitura de Cachoeirinha entra, de vez, em campo — ou retorna, depois de quatro anos — para negociar uma solução às 1.632 famílias que, desde abril deste ano, vivem a incerteza sobre as suas moradias no bairro Granja Esperança. Haverá duas reuniões à tarde. A primeira, entre a prefeitura e a presidência da Câmara de Vereadores e, na sequência, entre a prefeitura e o Ministério Público.
— São encontros para elaborarmos a melhor estratégia de busca por uma solução a estas famílias. Hoje, estamos trabalhando com duas hipóteses mais concretas. O certo é que o município vai agir — garante o procurador do município, Emiliano Cláudio Macedo.
É que a comunidade com mais de 30 anos de ocupação, mesmo com toda a infra-etsrutura investida pelo poder público na urbanização da área, segue sendo considerada uma ocupação irregular. E, o que é pior, objeto de uma ação de execução de penhora pela Habitasul Crédito Imobiliário contra a Cooperativa Habitacional São Luiz. O caso, que se arrastava na justiça desde 1992, chegou, em abril a um acordo: em 180 dias, que encerram no final de outubro, os moradores devem iniciar o pagamento por cada um dos imóveis da localidade, sob pena de terem de abandonar suas casas.
Foi o resultado da inadimplência lá na origem do que seria um loteamento urbano. A Habitasul financiou as construções, mas o financiamento cessou a cooperativa jamais pagou, depois que as casas construídas foram ocupadas antes da finalização das obras. O caso gerou uma ação de cobrança da dívida. Neste período, casas foram negociadas ou herdadas, terrenos foram repartidos ao gosto dos moradores.
As negociações
Agora, a avaliação dos imóveis feita pela Caixa Federal, fixou valores entre R$ 93 mil e R$ 167 mil. Na prática, o acordo prevê que os moradores devem comprar para seguirem em suas casas. Em alguns casos, pagarão pela segunda vez, já que compraram dos ocupantes anteriores. Duas imobiliárias locais foram determinadas para as transações, com uma condição de pagamento de 10% como entrada, seguida de 180 parcelas. Para boa parte das famílias, no entanto, o negócio é inviável.
No dia 9 de agosto, houve uma assembleia dos moradores, com a participação da prefeitura. Ali, começou a ser desenhada alguma solução mediada pelo município. Uma das alternativas, que pode começar a sair do papel nesta segunda, é a inclusão da Granja Esperança nos critérios da legislação federal de regularização urbana criada ano passado, a Reurb, que agiliza o acesso à escritura de imóveis em áreas historicamente ocupadas. Em 2014, quando a legislação ainda não existia, o município chegou a iniciar um processo de regularização tendo como base a lei vigente, mas o processo parou, justamente pela questão judicial da área.
A nova lei prevê duas formas para que isso aconteça quando é o município quem solicita o Reurb e se torna o mediador do processo: a desapropriação ou a compra da área pelo município.
— É uma legislação nova, então, é provável que a credora (Habitasul) questione alguma etapa do processo. Por isso, queremos discutir muito bem a situação e termos um norte bem definido sobre como agirmos de maneira concreta em nome das famílias — aponta o procurador.
O plano inicial da Secretaria de Habitação da cidade é que a Granja Esperança seja a primeira área incluída no Reurb, que teria sequência nas ocupações do Chico Mendes, Vila Márcia e Jardim Conquista.
Outra alternativa, segundo ele, é que o município atue como facilitador das negociações.
— Reduzir o valor avaliado dos imóveis, as entradas e as parcelas são alternativas possíveis — acredita Macedo.
Na justiça
No acordo firmado em abril, é previsto que o prazo de 180 dias possa ser ampliado com autorização judicial. Pelo menos um casal de moradores conseguiu isto com uma ação de usucapião. O processo, que corria em paralelo ao litígio entre a Habitasul e a Cooperativa São Luiz, teve com ganho de causa aos moradores na segunda instância, no Tribunal de Justiça, depois da decisão contrária em Cachoeirinha. A Habitasul recorreu ao STJ e o caso ainda não foi julgado, mas, pelo menos nesta casa, o processo de alienação está suspenso por medida liminar.
A decisão gerou uma enxurrada de processos com o mesmo teor. São mais de 60 ações alegando a regularidade das moradias por usucapião. O problema é que, na primeira instância, ainda não houve decisão favorável a este entendimento. E, no TJ, somente um caso. Pelo menos seis processos referentes a este imbróglio tramitam atualmente no STJ.
O entendimento do município é de que a ocupação da Granja Esperança não se enquadra nos critérios de usucapião. Uma vez que, já na época em que os terrenos foram ocupados, a proprietária — ou a credora — reivindicava a área. Vale lembrar que o caso teve início nos tribunais em 1992.
Um dos critérios principais para a implementação do Reurb, por exemplo, é justamente a possibilidade de flexibilizar a regularização de áreas em litígio. Para isso, porém, será necessário um acordo entre todas as partes. Ou seja, nesta segunda a prefeitura entra em campo. Quando sairá, ninguém sabe. Até lá, seguirá a incerteza dos moradores.