Quanto vale a água do Rio Gravataí?
Esta pergunta, que já deveria ter sido feita há pelo menos 20 anos, quando a legislação ambiental previu a instauração da cobrança pelo uso da água como forma de gerir o recurso hídrico, entrou definitivamente na pauta ambiental da região em 2018. É que, se a bacia do Gravataí já é reconhecida historicamente pela mobilização de ativistas, no ano que passou, ficou definido que o Gravataí será o ponto de partida também para este avanço na política ambiental do Rio Grande do Sul. A partir de 2019, a cobrança pelo uso da água será implementada a partir daqui.
Partindo de uma provocação do Ministério Público, o tema começou a ser discutido em duas esferas: o Comitê de Gerenciamento da Bacia do Gravataí e o Departamento de Recursos Hídricos, da Secretaria Estadual do Meio Ambiente. De um lado, a comunidade mobilizou-se para eleger onde o futuro recurso poderá ser investido, de outro, os técnicos do estado quebraram a cabeça — e fecharam o ano sem concluir — para achar uma fórmula de cálculo para a definição dos valores a serem cobrados. Uma estimativa inicial do departamento é de que, já no primeiro ano de cobrança, previa a possibilidade de até R$ 9 milhões a serem arrecadados na bacia. Depois de algumas revisões, a projeção gira em torno da metade deste valor.
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Onde será investido dinheiro da cobrança por uso da água
Não se trata de um aumento na conta de água que o consumidor já paga. Na realidade, o que é pago atualmente é pelo serviço de tratamento e distribuição feito pela companhia distribuidora de água. Isso no caso dos consumidores residenciais. Pela cobrança que vem sendo estudada, este seria um dos atores a serem cobrados. A agricultura e a indústria são os outros dois. Todo o valor arrecadado só poderá ser investido em melhorias na própria bacia hidrográfica. Então, a tendência é de que esta cobrança ajude a baratear os custos daquela sua conta tradicional da água.
E se a discussão pela cobrança aconteceu com duas décadas de atraso, mas finalmente aconteceu, o ano também fechou com outro resgate histórico na questão ambiental. Um Termo de Ajustamento de Conduta, firmado entre o MP e a prefeitura de Gravataí, propõe que, nos primeiros meses de 2019, a cidade concretize a maior reserva ambiental da região. A chamada Reserva Ecológica Banhado Grande, criada, no papel, em 3 de novembro de 1981, pelo então prefeito Ely Corrêa, terá 3,3 mil hectares — maior do que os 2,5 mil do Refúgio de Vida Silvestre Banhado dos Pachecos, por exemplo — às margens do Rio Gravataí, em um caminho que se estende do Passo dos Negros até o limite da cidade com Glorinha.
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Se depender do que já se conquistou no refúgio, em Viamão, 2018 fecha com uma grande esperança de criarmos mais uma “fábrica” da água para o Gravataí em tempos de escassez. Neste ano que termina, o refúgio firmou-se como um grande exemplo de boa gestão e recuperação da reserva de água que a região de banhados na nascente do Gravataí já representou. Um levantamento, a partir de imagens de satélite, mostra que, dentro do refúgio, que tem proteção permanente, a presença de corpos d’água triplicou em 30 anos.
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O ano poderia ter representado também o avanço institucional definitivo para o refúgio e toda a Área de Proteção Ambiental do Banhado Grande. Mas não foi desta vez. Nenhuma das duas áreas ultrapassou os entraves burocráticos, e a morosidade política, do Estado para que, finalmente, tivessem seus planos de manejo aprovados. É só a partir do plano de manejo que ficará claro o que se pode e o que não se pode construir, empreender ou criar dentro da bacia do Gravataí. E o temor dos ambientalistas, a partir da guinada política no país, é de que os planejamentos para a conservação ambiental recuem em todo o Brasil.
Ao menos esta é a promessa do presidente Jair Bolsonaro (PSL), empossado ontem. Segundo ele, não serão criadas novas áreas de proteção ou reservas indígenas, por exemplo, na região amazônica. Aqui, do outro lado do país, a preocupação é de que fiquem congeladas — se não recuarem — as conquistas de até aqui.
O que se desenha para a luta ambiental em 2019 é ainda mais necessidade de resistência e enfrentamento construtivo. Bom, quanto a isto, na bacia do Gravataí, temos especialistas no assunto. No ano que se inicia, a Associação de Preservação Natural Vale do Gravataí (APN-VG) completará 40 anos de luta. Mais vigorosa e presente do que nunca. Em 2018, o barco-escola do projeto Rio Limpo, gerido pela associação com o objetivo de usar o Rio Gravataí como uma verdadeira sala de aula, chegou às escolas públicas de toda a região. E seguirá navegando por esta causa em 2019.