Até o Conselho Federal de Medicina (CFM) já abandonou a cloroquina e o ‘tratamento precoce’ com o ‘kit covid’ – ou os ‘saquinhos de ilusão’, como descreve Margareth Dalcomo, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), uma das pesquisadoras mais reconhecidas do Brasil.
Gravataí nunca assumiu o tratamento como política de governo, apesar da simpatia do vice-prefeito e médico Dr. Levi, o que já tratei em Gravataí não comprou cloroquina ou kit de tratamento precoce; Responsabilidade é de médicos e pacientes, Dr. Levi quer cloroquina no Hospital de Campanha de Gravataí; A tímida vacina, e Vereador de Gravataí luta pela vida: colega ’medicou-o’; Parem com curandeirismo, por favor! e outros artigos impopulares para tantos na Gravataí e Cachoeirinha que deram 7 a cada 10 votos para Jair Bolsonaro.
A responsabilidade sempre foi repassada aos médicos e não se comprou cloroquina nem no governo Marco Alba (MDB), nem agora no de Luiz Zaffalon (MDB), o que reputo nos afasta, apesar de não nos livrar, já que as palavras tem força, de indenizações milionárias por eventuais vidas perdidas.
Fato é que o último pilar do curandeirismo caiu durante audiência pública da Comissão Temporária da Covid-19 do Senado, reportada nesta segunda pela Agência Brasil. O vice-presidente do CFM, Donizette Giamberardino Filho, esclareceu que “o Conselho Federal de Medicina não recomenda e não aprova tratamento precoce e não aprova também nenhum tratamento do tipo protocolos populacionais (contra a covid-19)”.
Ano passado, o conselho aprovou parecer que facultou aos médicos a prescrição da cloroquina e da hidroxicloroquina para pacientes com sintomas leves, moderados e críticos de covid-19.
Segundo o médico, o que o CFM fez foi uma autorização fora da bula (off label) em situações individuais e com autonomia das duas partes, “firmando consentimento esclarecido (médico) e informado (paciente)”. Filho diz que “em nenhum momento ele (o CFM) autorizou qualquer procedimento experimental fora do sistema CRM/CFM”.
– Esse parecer não é habeas corpus para ninguém. O médico que, tendo evidências de previsibilidade, prescrever medicamentos off label e isso vier a trazer malefícios porque essa prescrição foi inadequada, seja em dose ou em tempo de uso, pode responder por isso – advertiu.
Perguntado por senadores sobre uma revisão de posicionamento do CFM diante de evidências científicas de ineficiência dessa prescrição, o médico disse que a entidade está frequentemente reavaliando condutas, mas que nesse caso, especificamente, só uma decisão de plenário poderia reverter a orientação dada em abril do ano passado.
– O Conselho Federal estuda a todo momento. Esse parecer pode ser revisto? Pode, mas é uma decisão de plenária, eu não posso fazer isso por minha opinião. O que eu repito é que a autonomia é limitada ao benefício. Quem ousa passar disso, responde por isso – garantiu.
Já a microbiologista Natália Pasternak, presidente do Instituto Questão de Ciência (ICQ), da Universidade de São Paulo (USP), ressaltou que existem vários tipos de estudos científicos que têm sido reportados para tentar validar o uso do chamado kit covid ou tratamento precoce, que causaram controvérsia no Brasil. Segundo ela, os melhores estudos nessa área mostram que vários componentes desse kit já foram desmentidos.
– Não é que não existem evidências ainda; é que já existem evidências de que esses medicamentos não funcionam. Para cloroquina e hidroxicloroquina, nós temos mais de 30 trabalhos feitos no padrão ouro que mostram que esses medicamentos não servem para covid-19. Para ivermectina, nós temos trabalhos também que demonstram que não serve e uma série de trabalhos que são muito malfeitos e muito inconclusivos. Infelizmente, muitos médicos acabam se fiando nisso – criticou.
A pesquisadora defendeu que a ciência vem para ficar de mãos dadas com a Medicina e com a saúde pública, e não para antagonizá-la.
– A ciência serve para embasar a medicina, para que médicos tenham a tranquilidade de receitar medicamentos que eles sabem que passaram por esses testes e que, por isso, por haver uma base científica, podem receitar – acrescentou.
Para a especialista o Brasil não precisa de posturas públicas que confundam orientações sanitárias:
– Nós não precisamos de que a tragédia da pandemia seja utilizada como mecanismo de busca de poder, ou seja, politizada; nós não precisamos de que empresas patrocinem a publicidade do kit covid; não precisamos de posturas públicas alarmistas. Precisamos, sim, de transparência. Precisamos de informação – defendeu.
Natália Pasternak apontou a municipalização das condutas para evitar a disseminação do vírus como um erro. Para a especialista, o ideal seria que as medidas de distanciamento social atingissem micro e macrorregiões onde haja a circulação das pessoas. Ainda segundo ela, não há sentido, numa região metropolitana, determinado prefeito não fazer o distanciamento, pois essa conduta pode atrapalhar muito a eficácia da medida.
– Então, nós temos que ter ações mais conjuntas. A municipalização é um direito, mas a descentralização tem limites para sua eficiência – ponderou.
Os senadores ouviram ainda as considerações da doutora Margareth Dalcomo, pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). A especialista condenou a utilização de alguns fármacos, que considerou estarem sendo usados de forma “arbitrária” no tratamento do novo coronavírus. Segundo ela, essas drogas não passam de “saquinhos da ilusão”.
– São antibióticos que não têm a menor indicação para uma doença que é viral, antibiótico é remédio usado em doença causada por bactéria, misturando com vitaminas, com zinco, com corticosteroides, que é um medicamento que só tem indicação em casos específicos de covid-19, com critério médico abalizado naturalmente, e isso mais com anticoagulante, o que piora mais ainda a situação. Anticoagulante também tem indicação na covid-19, porém deve ser usado criteriosamente a partir da avaliação de determinados marcadores clínicos da covid, com os quais nós estamos muito acostumados a lidar – avaliou.
Ao fim, associo-me em parte ao artigo “A cura do Bálsamo Alemão”, escrito pelo prefeito de Cachoeirinha Miki Breier e publicado nesta segunda no Correio do Povo.
Siga na íntegra e, abaixo, concluo.
“…
Em uma conversa com minha mãe, ela me contou sobre a epidemia de meningite vivida no ano 1971. Eu tinha apenas cinco anos à época e tenho uma vaga lembrança de alguns vizinhos que precisavam ir ao hospital de ambulância.
Alguns historiadores afirmam que o governo militar tentou esconder a doença, o que acarretou num grande número de óbitos. Mas o que me causou surpresa foi a convicção da Dona Ives ao afirmar que usava Bálsamo Alemão para evitar que fôssemos infectados pela doença. Misturava algumas gotas em uma colher com açúcar e fazia os filhos ingerirem. Além disso, espalhava algodões embebidos no líquido pelos cômodos da casa, acreditando que o odor ajudava a espantar a moléstia.
Muitos, ainda hoje, são usuários contumazes do bálsamo. Feito à base de vitamina E, afirma fortalecer a imunidade e defender o organismo. Este texto, contudo, não é sobre o suplemento e sua eficácia. Nem tenho condições de avaliar isso. Por isso, escrevo sobre a crença de minha mãe. E a fé que ela depositava em algo que protegesse nossa família.
Diante do inesperado e das incertezas, é natural que busquemos alívio, conforto e, principalmente, esperança. De algum modo, guardada as proporções, é o que ocorre hoje quando muitos defendem os mais variados tratamentos para a Covid-19, sejam profiláticos ou não.
Enquanto essa questão divide opiniões e favorece debates ideológicos, há uma esperança real e comprovada: a vacina. Se a automedicação gera imensos riscos, a imunização oferece a possibilidade de retomada das nossas vidas, de nossos empregos e da economia do país.
Não é momento de focar no que nos divide. É tempo de focar no que nos une. De ter fé, de acreditar que algo maior olha por nós mesmo em meio a tantas dores. É hora da vacina e, mais do que nunca, de oração. E, antes que você pergunte, a Dona Ives concorda com isso.
…”.
Sigo eu.
É isso: “Enquanto essa questão divide opiniões e favorece debates ideológicos, há uma esperança real e comprovada: a vacina. Se a automedicação gera imensos riscos, a imunização oferece a possibilidade de retomada das nossas vidas, de nossos empregos e da economia do país”.
O adendo que faço ao artigo de Miki – que por óbvio foi escrito com todo cuidado político que exige o cargo de prefeito “de todos” – é que não reputo cloroquina, mesmo receitada por médicos, como parâmetro para o maternal ‘Bálsamo Alemão’, cuja aplicação não encontro registro de vidas perdidas pelo uso.
Como em ’Kit covid’: O risco da incompreensão do ’tratamento precoce’ em Gravataí, que publiquei em março, concluo que "só um psicopata não gostaria que existisse algum tratamento precoce. Assim como só um criminoso torceria contra as vacinas".
Infelizmente, na guerra pela vacina, quando podia fazer, o Brasil quase nada fez; e o quase nada ainda fez lentamente.
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