A Nova Ordem de Lúcifer na Terra (N.O.L.T.) acusou nesta sexta-feira a Prefeitura de Gravataí de dificultar acesso a alvará para o santuário de Lúcifer na zona rural do município. O governo nega e explica o processo burocrático.
Vamos às novas informações sobre a polêmica que ganhou noticiário nacional e até internacional, e tratei no Seguinte: em uma série de artigos que começou em Com estátua de 5 metros, Gravataí terá o maior santuário dedicado a Lúcifer no Brasil; Os limites da polêmica.
Instalado no último mês em uma propriedade privada, sem uso de recursos públicos, o monumento de 5 metros ainda não pôde ser inaugurado oficialmente. O local que servirá de santuário ainda não recebeu liberação da Prefeitura, quase um mês depois de toda a documentação prevista em lei ter sido enviada.
A exigência legal foi confirmada em decisão liminar do Tribunal de Justiça, a partir de ação da Procuradoria-Geral do Município, que impediu a inauguração sob pena de multa diária de R$ 50 mil; leia em Justiça de Gravataí interdita templo de Lúcifer em Gravataí a pedido da Prefeitura e fundadores alegam perseguição religiosa; Leia íntegra da liminar.
De acordo com a assessora jurídica da organização religiosa, a advogada Franciele Consoni, em 14 de agosto foi protocolado processo administrativo solicitando o Alvará de Funcionamento da Casa de Religião denominada N.O.L.T Templo de Religião, sendo anexada toda documentação necessária, conforme previsto na Lei Municipal nº 4.104/2019.
– No dia 15 de agosto, a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico e Turismo solicitou novas documentações, contendo descrição detalhada das atividades exercidas no local, metragem das instalações, número de funcionários, fotos da localização, da fachada, das instalações e imagem aérea contornando o perímetro utilizado. Documentos que não constam na lei. No entanto, todos foram apresentados na mesma data de solicitação – relata.
Em 29 de agosto foi deferido o alvará pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano de Gravataí, “sendo aguardada somente a elaboração”. No entanto, conforme a advogada, os membros foram surpreendidos com um novo pedido extraoficial: um ofício do Conselho Municipal do Povo de Terreira, comprovando que o templo está de acordo com as normas.
– Acontece que, diferente de todos os mais de 500 alvarás de funcionamento de casas de religião já expedidos na cidade, nunca foi solicitado antes um ofício do Conselho Municipal do Povo de Terreira. Ainda assim, no dia 2 de agosto, o Conselho juntou o ofício, devidamente assinado por seu presidente, comprovando que o templo está dentro dos padrões – explica a advogada, acrescentando que “novamente foi realizado um trâmite diverso, sendo solicitada uma lista de assinaturas de todos os membros do Conselho”.
Para os fundadores do Templo N.O.L.T., Mestre Lukas de Bará da Rua e Tata Hélio de Astaroth, resta clara a “perseguição e intolerância religiosa” por parte da Prefeitura de Gravataí.
– Desde o começo sempre deixamos claro que nossos cultos seriam realizados em local privado, pago com recursos próprios, sendo voltado exclusivamente para convidados e adeptos da religião. O templo está localizado em área rural e distante da movimentação pública. Mesmo assim, seguimos todas as solicitações. Agora, a dificuldade para liberação e tantos trâmites diversos, não previstos em lei, deixa clara a violação dos direitos previstos na Constituição, de livre exercício da religião – diz o Mestre Lukas, que lembra o fato de, antes de acionar a justiça após a repercussão negativa, o prefeito Luiz Zaffalon (PSDB) ter divulgado um vídeo, em suas redes sociais, esclarecendo a não necessidade de licença para um ritual privado.
– Os organizadores e membros da Ordem respeitaram a decisão judicial e seguiram os trâmites para elaboração da licença solicitada. No entanto, até o momento, ainda existem solicitações adversas por parte da Prefeitura – conclui.
A Prefeitura informou ao Seguinte: que “a Lei que autoriza o funcionamento das casas vinculadas às religiões de matriz africana exige outorga do presidente do respectivo Conselho Municipal. Não há nenhum tipo de procrastinação. É apenas o cumprimento de um rito”.
Trata-se da Lei 4.104/2019, que “estabelece procedimentos para regulamentação do funcionamento dos terreiros de matriz africana e afro umbandista no âmbito do município de Gravataí”.
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Vamos à análise.
Em “Não é o Rock in Rio”: Gravataí vai ter templo para Lúcifer, goste-se ou não. É questão de dias, escrevi:
(…)
Por que antecipo que Gravataí terá santuário para Lúcifer em questão de dias, talvez antes de Vênus ficar mais visível no céu em setembro?
O próprio site da Prefeitura informa que, em processo de liberação de alvará, “quando a documentação está toda correta, o processo leva em torno de 3 a 5 dias” e “caso necessite de outras liberações, como alvará de bombeiros ou licença ambiental, por exemplo, existe, para algumas atividades, a liberação de um certificado provisório para funcionamento”.
Reputo não há vontade política, burocracia, toga ou oração que possa impedir o funcionamento do templo, caso os documentos sejam protocolados corretamente pela “Nova Ordem de Lúcifer”.
Ou restaremos frente a uma potencial perseguição, intolerância religiosa, o que pode custar revezes judiciais para a Prefeitura e agentes públicos.
Como observei no primeiro artigo sobre a polêmica, Com estátua de 5 metros, Gravataí terá o maior santuário dedicado a Lúcifer no Brasil; Os limites da polêmica, a garantia de liberdade religiosa está lá, na Constituição Federal, que diz que “(…)É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e às suas liturgias(…)”.
Uma lei sancionada em 2022, que equipara o crime de injuria racial ao crime de racismo, também protege a liberdade religiosa.
A legislação agora prevê pena de 2 a 5 anos para quem obstar, impedir ou empregar violência contra quaisquer manifestações ou práticas religiosas.
A pena será aumentada a metade se o crime for cometido por duas ou mais pessoas, além de pagamento de multa. Antes, a lei previa pena de 1 a 3 anos de reclusão.
O Supremo Tribunal Federal (STF) garante ainda, além da liberdade de culto, a sacralização, o que como ativista da causa animal abomino, mas tolero obedecendo a lei dos homens, a partir de decisão de 2019 que negou recurso interposto pelo Ministério Público gaúcho e validou lei estadual que entende que o sacrifício ritual de animais não se enquadra como maus tratos.
É hora de um pouco de razão em meio a esse perigoso delírio coletivo, essa potencial guerra político-religiosa, sobre a qual alertei em Vídeo de Zaffa sobre polêmica da estátua de Lúcifer vale para intolerantes e aloprados da política, os dos outros e os seus.
(…)
Ao fim, a análise segue valendo.
E a resposta da Prefeitura retira as suspeitas de que o prefeito Zaffa poderia restar segurando a liberação do alvará para depois de 6 de outubro, para não sofrer danos eleitorais com uma inauguração antes da eleição.
Ou estaríamos diante daquele conto, “O Moleiro de Sans-Souci”.
Em versos, François Andrieux conta que em 1745, na Prússia, um moleiro tinha o seu moinho nas cercanias do palácio do rei Frederico 2º. Um dos puxa-saco do soberano tentou removê-lo dali, porque julgava que aquilo maculava a paisagem. Ele se negava a sair. Frederico o chamou para saber a que se devia a sua resistência. Ouviu a célebre frase: “Ainda há juízes em Berlim”. Para o moleiro, a Justiça, aquela com a qual contava, não haveria de distingui-lo do rei.
Assim deve ser em Gravataí. Até para os luciferianos.